Correspondência vinda da França descrevia o crescente interesse do país pelos esportes.
O autor, Henri Lorin, chega a surpreender-se com o fato: "Os meus camaradas e eu nunca pensamos, há vinte e cinco annos, quando terminamos os estudos clássicos, que a França viria a ser, sob os nossos olhos, um paiz apaixonado de todos os "sports".
Sua surpresa, tal como a de outros de sua geração, residia na crença que a tradição filosófico-intelectual cultural da França não produziria um povo entusiasta de atividades físicas, "os exercícios do corpo eram considerados como de ordem inferior ou, se o preferem, de uma ordem estranha à mentalidade francesa", disse.
Então, Lorin e seus colegas viram como estavam errados. Presenciaram a rapidez com que a "bicyclette" chegou e tomou conta dos corações dos franceses. Do seu surgimento à sua ampla disseminação, a bicicleta não encontrou barreiras nem mesmo de classe social, "(...) todas as crianças, actualmente, pertençam a que classe social pertencerem, usam "bicyclette"(...)".
Testemunharam não só o despertar da grande paixão francesa, o ciclismo, mas também o crescente interesse da população por outros esportes como, o "foot-ball", o "golf", o "tennis", remo, tiro e outras atividades.
E viram jornais e revistas forçados a reformular suas seções para dar mais espaço às coberturas esportivas.
O fascínio pelos esportes comprovava-se através de um simples experimento.
Sociólogo, geógrafo e autor de obras que tratam da ação colonialista francesa no Norte da África, Henri não escreve como mero curioso que depara- se com uma nova moda ou tendência. Pensa no impacto social deste comportamento sobre a França, potência política e militar que, em 1911, estava há poucos anos de entrar no primeiro grande conflito global - a Primeira Guerra Mundial estoura em julho de 1914.
Ele termina o texto perguntando como seria "(...) quando os fedelhos que sonham ser aviadores forem homens e forem chamados a exercer o direito de voto, ou olharão a vida política como uma forma de actividade secundaria e não votarão ou, então, exigirão dos candidatos que falem menos e ajam mais (...)."
Nos últimos 40 anos estudos publicados demonstram as relações existentes entre política e esporte. Hoje estamos mais perto de entender o uso político das competições esportivas e seu impacto sobre as massas. Em 1911, a pergunta e suposição de Lorin buscavam compreender outro ângulo dessa relação. Sem dúvida o desejo de ação e um perfil competitivo podem ser encontrados no inconsciente coletivo de uma nação apaixonada por esportes. Transferindo essas características à esfera política, a pergunta é: quando esses mesmos elementos, somados a condições sociais específicas, podem indicar uma vontade de guerra?
Pesquisa e texto: Lizbeth Batista
Siga o Arquivo Estadão: Twitter@arquivo_estadao e Facebook/arquivoestadao
Veja também:
# Em 1911, partida de futebol levava torcedores paulistanos ao delírio
# Cenas de um jogo de futebol em 1911