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Opinião|O que os números do Ideb realmente revelam

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 Foto: Estadão

No dia 14 de agosto, o MEC (Ministério da Educação) divulgou os resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2011. Apesar de os índices terem apresentado uma ligeira melhora global desde 2009, especialmente nos primeiros anos -no Ensino Fundamental I, passou de 4,6 para 5,0; no Fundamental II, de 4,0 para 4,1; no Ensino Médio, 3,6 para 3,7- não é momento de comemorar, como está fazendo o governo.

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É verdade que as metas foram atingidas e até superadas: no EF I, a meta era 4.6; no EF II, 3,9; no EM, os mesmos 3,7 atingidos. As notas do Ideb, criado em 2005 para medir a qualidade do sistema educacional brasileiro, variam de 1 a 10.

Apesar da evolução, precisamos atentar a alguns pontos. Primeiramente, é mais fácil melhorar o desempenho quando se parte de um valor mais baixo. Em segundo lugar, as notas ainda são medíocres. Elas mascaram grandes desigualdades no ensino, seja entre escolas públicas e privadas, seja entre os Estados. Por fim, vão caindo à medida que o aluno progride.

Isso deixa patente como municípios e Estados, responsáveis justamente pelos Ensinos Fundamental e Médio, tratam da educação de maneira desequilibrada. Considerando que os parâmetros curriculares são nacionais, poderíamos ingenuamente esperar que alunos de todo o país tivessem um desempenho pelo menos homogêneo, dentro de uma margem de erro.

Claro que não funciona assim. A educação de qualidade depende de inúmeros fatores, começando pelo professor. Ele precisa ter uma boa formação e trabalhar estimulado e com condições adequadas. Desnecessário "chover no molhado" sobre as deficiências na nossa formação, que começam justamente no Ensino Fundamental e perduram até as universidades. Além disso, cada vez menos os professores optam pela carreira por vocação: muitos ingressam no magistério como um "bico fácil" e acabam se perpetuando na carreira, sem o preparo necessário, inclusive para disciplinas específicas que ministram.

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Não é de espantar, já que a sociedade desvaloriza o nobre trabalho desses profissionais. Isso começa pelos baixos salários -que os obrigam a ter jornadas acumuladas em várias escolas- e termina com condições de trabalho muitas vezes péssimas, com flagrantes desrespeitos ao profissional e à pessoa. E, por desrespeitos, me refiro à completa perda de autoridade na sala de aula diante de alunos e de pais, e até mesmo violentas agressões físicas sofridas pelos educadores.

Como resultado, as mentes mais brilhantes de nossa sociedade passam longe do magistério. Situação completamente diferente de países como a Coreia do Sul, onde apenas os melhores podem se candidatar à função de professor, cultuada naquela sociedade. Vale lembrar que a Coreia do Sul, há 50 anos, era um país pobre e eminentemente agrário. Sua transformação em uma das economias mais pujantes do mundo se deve basicamente à valorização do magistério e de todo o sistema educacional do país.

O que as notas do Ideb realmente mostram, apesar de o Governo Federal não querer ver, é o resultado desse caldo de descaso, despreparo e desmotivação: alunos que sabem muito pouco e vão sabendo cada vez menos à medida que crescem. Justamente quando o jovem se prepara para ingressar no mercado de trabalho, ele atinge o auge da sua defasagem. Avaliações internacionais, como o Pisa, colocam nossa Educação atrás da de nossos vizinhos mais pobres, países com condições sociais muito mais graves que as nossas. E isso também aparece em indicadores econômicos, com um Brasil que perde competitividade internacional devido a mão de obra ruim ou simplesmente insuficiente.

Sempre abordo neste blog o uso da tecnologia como um poderoso instrumento para melhorar a educação. E ela vem produzindo frutos bastante interessantes em algumas escolas do nosso país. Mas esses estabelecimentos, antes de ter tecnologia, têm professores que fogem do descrito acima: preparados, motivados e que realmente gostam do que fazem.

Não adianta dar um Ferrari a quem dirige mal: essa pessoa continuará sendo um mau motorista, e ainda corre o risco de provocar acidentes mais graves. Precisamos do óbvio ululante: promover reformas dramáticas em nossa educação, e não as perfumarias que se tem visto.

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Opinião por Paulo Silvestre

É jornalista, consultor e palestrante de customer experience, mídia, cultura e transformação digital. É professor da Universidade Mackenzie e da PUC–SP, e articulista do Estadão. Foi executivo na AOL, Editora Abril, Estadão, Saraiva e Samsung. Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital pela PUC-SP, é LinkedIn Top Voice desde 2016.

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