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Diversidade e Inclusão

"A cadeira de rodas é a minha liberdade"

Em entrevista ao blog Vencer Limites, o surfista Andrezinho Carioca fala sobre a evolução da acessibilidade e da inclusão no Brasil. E ressalta a importância da pessoa com deficiência lutar para fazer parte da sociedade, com todos o acessos e direitos previstos na lei.

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Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura
Por Luiz Alexandre Souza Ventura
Atualização:

Andrezinho Carioca foi consultor para a construção da Estação Sadia. Foto: Bruna Prado/EP/Divulgação

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O surfista Andrezinho Carioca tem 37 anos. Pode ser encontrado nas praias do Rio de Janeiro. Desce as ondas em uma prancha adaptada. Foi o primeiro cadeirante a surfar a pororoca (onda que surge com o encontro da água doce com a salgada), em 8 de fevereiro de 2012, no Rio Mearim, na cidade do Arari, no Maranhão. Já foi atleta do remo adaptado, fez parte da seleção brasileira e dos principais times do Rio de Janeiro. E diz, convicto. "Eu jamais vou deixar de surfar".

Andrezinho é um dos atletas que atuaram como consultores para a construção de dez estações de ginástica e alongamento, criadas para cadeirantes (podem ser usadas por qualquer pessoa), instaladas no Rio de Janeiro, em um projeto idealizado e patrocinado pela Sadia. A primeira estação já está aberta, ao lado da ciclovia que contorna o Estádio Maracanã, na esquina da Rua Professor Eurico Rabello com a Avenida Professor Manuel de Abreu.

"O esporte é uma das atividades mais inclusivas. Talvez a maior de todas. É fundamental para a reabilitação da pessoa com deficiência. O que buscamos com essas estações é a prática da atividade física com segurança", diz o atleta em entrevista ao blog Vencer Limites após demostrar como os equipamentos funcionam.

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Andrezinho afirma que a pessoa com deficiência tem de ir para a rua e enfrentar a cidade, porque a sociedade precisa saber que acessibilidade e inclusão são necessidades fundamentais.

Vencer Limites - Há quanto tempo você usa a cadeira de rodas Andrezinho Carioca - Quase 16 anos. Comecei a usar após um acidente em agosto do ano 2.000.

Vencer Limites - O que você sabia sobre o universo da pessoa com deficiência antes de usar a cadeira? Andrezinho Carioca - Nada. Na época, quando eu ainda estava no hospital, na cama, vi na TV chamadas para as paralimpíadas. Aquele foi meu primeiro contato com esse universo. Antes, eu não tinha nenhum contato, não havia nenhuma pessoa com deficiência na minha família ou entre meus amigos.

Vencer Limites - A partir do uso da cadeira de rodas, quando você começou a conhecer o universo da pessoa com deficiência, você observa diferenças positivas daquele tempo até hoje? Andrezinho Carioca - Com certeza. Tenho colegas que usam a cadeira de rodas há 50 anos, que acompanham a luta da pessoa com deficiência. Houve muito avanço na legislação e também de execução. Porque quando se fala em acessibilidade, é comum pensar somente em estruturas físicas e arquitetônicas, mas o universo da pessoa com deficiência é muito maior. Hoje, apesar de ter um carro, eu uso o transporte público, tanto o trem quanto o ônibus e o metrô. É comum que o condutor do ônibus acessível não saiba operar o elevador, mas na maior parte da vezes em que eu utilizei o transporte público acessível, nos últimos tempos, eu tive a satisfação de ser tratado com educação e respeito, e o equipamento funcionar.

Vencer Limites - Você passou por um processo de aceitação após começar a usar a cadeira de rodas? Andrezinho Carioca - Cada um reage de uma forma. Não posso dizer que foi normal, isso é impossível, porque foi um impacto muito grande para mim, para a minha família e amigos. Mas quando eu sofri o acidente, meu pai havia passado por uma cirurgia delicada cerca de quatro meses antes. Eu me preocupava com a reação dos meus pais, porque eu não tenho como medir o que eles sentiam. E tive que mostrar a eles que nós passaríamos bem por aquilo. Eu não posso passar minha vida pensando no acidente. Preciso pensar no dia de hoje. E hoje eu uso a cadeira de rodas. Há muitas pesquisas e tratamentos, mas eu quero a minha felicidade hoje. Se um dia a cura aparecer, vamos batalhar para ter acesso a essa cura. Porque, se ela vier, será que todas as pessoas, de níveis sociais diferentes, terão acesso? Será que eu terei acesso? Será um custo muito alto? Hoje eu não quero pensar nisso. Hoje, eu quero ser feliz, fazer parte da sociedade da melhor forma possível, indo ao teatro, ao trabalho, à escola, com todos os acessos e direitos previstos na lei.

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Vencer Limites - O que você diz quando escuta a frase 'preso na cadeira de rodas '? Andrezinho Carioca - Certa vez, no Sarah (Centro Internacional SARAH de Neuroreabilitação e Neurociências), um colega me perguntou sobre o que esperava da cura. Respondi que, em algum momento, ela pode surgir, mas eu não vivo em função disso. A cadeira é a minha liberdade. Sem ela, eu estaria no sofá ou na cama. Sem a cadeira eu não estaria aqui, não teria ido ao Amapá, não teria passado seis dias dentro de uma embarcação no Amazonas para surfar a pororoca. Sem a cadeira eu não saio de casa e a sociedade não poderá observar que eu existo e que eu preciso e quero participar. Quando vou a um local que não é acessível, eu não deixo de entrar, prefiro ser carregado porque aquela situação pode fazer o responsável pelo lugar refletir sobre a acessibilidade e aquela escada pode dar lugar a uma rampa, um elevador ou uma plataforma.

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