1 ano depois de Mariana, ONU diz que ações são 'insuficientes'
Peritos pedem medidas urgentes ao governo e às empresas, às vésperas do primeiro aniversário do maior desastre socioambiental da história do País
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Por Jamil Chade
Atualização:
GENEBRA - Peritos da Organização das Nações Unidas (ONU) lançaram um apelo para que as autoridades brasileiras tomem "medidas imediatas para solucionar os impactos ainda persistentes do colapso letal de uma barragem de rejeitos de mineração no Brasil, ocorrido no dia 5 de novembro de 2015". A tragédia deixou 18 mortos e um desaparecido.
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Segundo a entidade, diversos danos ainda não foram tratados e nem solucionados, entre eles o "acesso seguro à água para consumo humano, a poluição dos rios, a incerteza sobre o destino das comunidades forçadas a deixar suas casas". Na avaliação do grupo, a resposta do governo e das empresas implicadas tem sido "insuficiente".
"Na véspera do primeiro aniversário do colapso catastrófico da barragem, de propriedade da Samarco, instamos o governo brasileiro e as empresas envolvidas a dar resposta imediata aos numerosos impactos que persistem, em decorrência desse desastre", afirma o grupo formado pelos peritos Dainius Püras, Michel Forst, Victoria Tauli-Corpuz, o brasileiro Léo Heller e outros.
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
1 / 9Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Obras do dique S4, em construção pela Samarco; à frente, o Rio Gualaxo e, ao fundo, o distrito de Bento Rodrigues Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Destroços da Escola de Bento Rodrigues Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Vista aérea das ruínas de casas destruídas pela lama em Mariana (MG) Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Prédio que abrigava o posto de saúde de Bento Rodrigues Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Esqueletos de construções da Rua Dona Olinda, em Bento Rodrigues, hoje abandonada Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Obras do dique S3, já construído pela Samarco em Bento Rodrigues para segurar a lama Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Igreja de Paracatu de Baixo, em Mariana; as paredes brancas seguem tingidas de lama Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
Vista aérea do vilarejo de Paracatu de Baixo, onde viviam cerca de 130 famílias Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Bento Rodrigues (MG), um ano após o 'mar de lama'
A igreja de Paracatu de Baixo, em Mariana, vem sendo escavada por arqueólogos Foto: Márcio Fernandes/Estadão
Segundo eles, "as medidas que esses atores vêm desenvolvendo são simplesmente insuficientes para lidar com as massivas dimensões dos custos humanos e ambientais decorrentes desse colapso, que tem sido caracterizado como o pior desastre socioambiental da história do país".
"Após um ano, muitas das 6 milhões de pessoas afetadas continuam sofrendo", alertam. "Acreditamos que seus direitos humanos não estejam sendo protegidos em vários sentidos, incluindo os impactos nas comunidades indígenas e tradicionais, problemas de saúde nas comunidades ribeirinhas, o risco de subsequentes contaminações dos cursos de água ainda não recuperados, o avanço lento dos reassentamentos e da remediação legal para toda a população deslocada, e relatos de que defensores dos direitos humanos estejam sendo perseguidos por ação penal."
Histórias de Mariana
1 / 6Histórias de Mariana
Histórias de Mariana
A menina Lucineia Cristina da Silva, desabrigada, na van que a levaria para um dia recreativo em um clube. Vítimas do rompimento da Barragem do Fundão... Foto: Tiago Queiroz/EstadãoMais
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Sra. Rosa Maurilia Gomes, de 77 anos, que perdeu sua casa em Bento Rodrigues. O Estadpentrevistou desabrigados das comunidades de Bento Rodrigues e Pa... Foto: Tiago Queiroz/EstadãoMais
História de Mariana
No primeiro plano, imagem da casa de Sandra, antes de ser destruída. Sandra Domertides de Quintão, de 43 anos, muito conhecida pelas deliciosas coxinh... Foto: Tago Queiroz/EstadãoMais
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Desabrigados se divertemem dia recreativo em um clube. Estouro da barragem espalhou 62 milhões de metros cúbicos de água e lama, matou pelo menos 11 p... Foto: Tiago Queiroz/EstadãoMais
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Na foto, José do Nascimento de Jesus, conhecido como Seu Zezinho, e sua esposa Maria Irene de Deus, de 76 anos. Os dois perderam tudo em Bento Rodrigu... Foto: Tiago Queiroz/EstadãoMais
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Da esquerda para a direita:Terezinha Custódio Quintão (irmã de Sandra), Rosileia Martins, Sandra com a filha Ana Amélia, de 2 anos e 2 meses, e Kerlia... Foto: Tiago Queiroz/EstadãoMais
Entre as medidas, os peritos querem que o Estado brasileiro forneça "evidências conclusivas sobre a segurança da qualidade da água dos rios e de todas as fontes utilizadas para consumo humano e que estas atendam aos padrões legais aplicáveis".
"Estamos preocupados com relatos sugerindo que alguns dos cursos de água nos 700 quilômetros afetados, sobretudo do vital Rio Doce, ainda estejam contaminados pelo desastre inicial. Especialmente, de que níveis de alguns metais pesados e de turbidez ainda estariam violando os limites permissíveis", indicam. "Receamos que o impacto sobre as comunidades ribeirinhas seja resultado não apenas da contaminação da água, mas também da poeira resultante do ressecamento da lama."
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A ONU também exige uma resposta das empresas envolvidas. "Destacamos ainda as conclusões do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), indicando que os esforços das empresas envolvidas - Samarco, Vale e BHP Billiton - para deter os contínuos vazamentos de lama da barragem de Fundão, no Estado de Minas Gerais, estejam sendo insuficientes", dizem.
"Receamos que mais rejeitos possam atingir as regiões de jusante quando a temporada chuvosa iniciar, daqui a algumas semanas", alertam.
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
1 / 5Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
Lama
Nos últimos três dias a onda de lama passou por Colatina e Linhares, causando mortandade de peixes e comprometendo o abastecimento de água Foto: Gabriela Biló/Estadão
Lama
A previsão do Ministério do Meio Ambiente, com base em projeções feitas por pesquisadores da Coppe-UFRJ, é que os sedimentos se dispersarão por uma ár... Foto: Gabriela Biló/EstadãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
O rio Doce deságua no mar em Linhares, cidade que fica no norte do Espírito Santo. Foi montada uma barreira para tentar conter os rejeitos de minério,... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
A onda de lama tem levado destruição à biodiversidade do Rio Doce, desde o município homônimo em Minas, onde nasce. Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação
Lama muda a cor do mar na foz do Rio Doce
A dispersão da lama pode ser de 3 km em direção ao norte e de 6 km em direção ao sul quando elas atingirem o mar pela foz do Rio Doce, informou a mini... Foto: Fred Loureiro/Secom-ES/DivulgaçãoMais
Comunidades. Para os peritos, outra solução urgente deve ser o do destino das comunidades afetadas."Estamos preocupados também com o destino das comunidades que foram forçadas a abandonar suas casas devido ao desastre", dizem. "Após um ano, o processo de reassentamento está longe de concluído. Devem ser tomadas medidas de restituição e reassentamento que incluam a reinstalação de povos indígenas e comunidades locais deslocados para terras, territórios e recursos de igual qualidade, tamanho e estatuto jurídico às terras de onde foram forçados em decorrência do desastre."
Mais uma vez, a responsabilidade é tanto do governo como das empresas. "Elas precisam acelerar o processo de reassentamento e assegurar que esteja em consonância com o marco internacional dos direitos humanos", apontam.
A ONU também se diz preocupada com o impacto de um acórdão entre o governo e as empresas. "Reiteramos a nossa grave preocupação com os efeitos adversos que alguns dos termos do acórdão podem provocar no direito das populações de acesso à justiça", dizem.
Abrigo de animais resgatados em Mariana
1 / 12Abrigo de animais resgatados em Mariana
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Em espaço bancado pela mineradora Samarco, há cães, gatos, cavalos, porcos, galinhas, patos e vaca Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Alguns animais estão em jaulas; outros estão acorrentados Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Os cachorros, especialmente os filhotes, passam o dia cavando o chão para tentar escapar Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Os cães passam o dia nas gaiolas, mas voluntários e os próprios donos dos bichos frequentam o espaço para levá-los para passear Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Os animais que ainda não tiveram os donos localizados serão colocados para adoção Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Os cães e gatos estão em um galpão, que abriga também uma clínica veterinária e onde foram feitas pequenas cirurgias Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Já chega a 605 o número de animais resgatados na região de Mariana após o rompimento das barragens de rejeito de minério de ferro da Samarco Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
A data de adoção dos animais sem dono ainda não foi definida Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
O espaço que abriga os bichos foi mantido com serviços de voluntários que se encarregaram de limpar as gaiolas e dar alimento aos bichos Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Como em um hospital, as gaiolas dos cães são numeradas e, na porta delas, há papéis com as recomendações para cada bicho Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Voluntários passeiam com os animais, que ficam o dia todo no galpão Foto: Bruno Ribeiro/Estadão
Bichos estão em uma área de 1.700 m²
Segundo o veterinário responsável pelos animais de grande porte, cavalos e vacas que chegaram ali, na maior parte dos casos, apresentava quadro de des... Foto: Bruno Ribeiro/EstadãoMais
"Ainda que sejam positivas as iniciativas para a conciliação e o acesso rápido a medidas reparatórias, o acórdão não deve desproteger as comunidades afetadas quanto a um acesso pleno a soluções efetivas a longo prazo", alertam.
Em uma declaração lançada em Genebra, na Suíça, o grupo também indica que as empresas não devem ameaçar membros da comunidade afetado que estejam lutando por melhorias. "Instamos as empresas a se abster de tomar qualquer ação que traga intimidação do trabalho dos defensores dos direitos humanos e a assegurar que qualquer medida para a proteção de suas propriedades seja proporcional aos fatos e não conflitem com o direito da população à liberdade de expressão e acesso à justiça", completam os peritos.