Advogado quer reabrir investigação da morte da mãe de Bernardo

Em vídeo obtido pela polícia e divulgado nesta quinta-feira, madrasta afirma ao menino: 'teu fim vai ser igual ao da tua mãe'

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Por Elder Ogliari
Atualização:

PORTO ALEGRE - O advogado Marlon Adriano Balbon Taborda, representante da avó do menino Bernardo Boldrini, Jussara Uglione, vai pedir pela segunda vez a reabertura do inquérito que investigou a morte da mãe do garoto, Odilaine Uglione. Depois de ver a primeira solicitação rechaçada pela Justiça de Três Passos em julho deste ano, a família entende que um fato novo, a gravação de uma briga entre o garoto, o pai dele, o médico Leandro Boldrini, e a madrasta Graciele Ugulini, pode convencer o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a rever o caso.

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"Há uma espécie de confissão subliminar na frase 'teu fim vai ser igual ao da tua mãe'", acredita o advogado, referindo-se a palavras ditas pela madrasta a Bernardo durante a discussão. Em 2010, Odilaine morreu dentro do consultório de Leandro Boldrini. O inquérito policial concluiu que ela se suicidou. Pouco tempo depois Boldrini se casou com Graciele.

O primeiro pedido de reabertura da investigação da morte de Odilaine foi rejeitado pelo juiz Marcos Luís Agostini, em 28 de julho deste ano. O advogado relatou que o corpo tinha lesões no antebraço direito e lábio inferior e vestígios de pólvora na mão esquerda, lembrando que a vítima era destra. O juiz entendeu que não havia fato novo que justificasse a retomada do caso. Para isso, citou a conclusão de que a mão direita segurava o revólver auxiliada pela esquerda e que as lesões no antebraço foram decorrentes de punções venosas feitas no hospital na tentativa de salvar a vida de Odilaine.

Avó Jussara Uglione e Bernardo Boldrini, morto em abril Foto: Reprodução

O vídeo gravado pelo casal durante a briga, em agosto do ano passado, resgatado pela perícia do celular de Leandro Boldrini e encaminhado ao processo na semana passada revela detalhes da falta de harmonia na casa do médico e faz referências que podem ajudar a Justiça a chegar a uma conclusão sobre a morte do garoto. O vídeo tem poucas imagens porque o celular ficou sob um cobertor a maior parte do tempo. Mas o áudio mostra o garoto gritando desesperadamente, soluçando, sendo repreendido pelo pai, que não ergue a voz em nenhum momento, ehumilhado pela madrasta. Um dos temas do bate-boca foi a mãe do menino, Odilaine Uglione.

Nos três minutos iniciais, Bernardo grita por "socorro" pelo menos 20 vezes e pede o telefone emprestado para denunciar as agressões que dizia sofrer do pai e da madrasta. "Ah, tu quer o telefone para denunciar? Não empresto. Te vira", desdenha a madrasta. Na sequência, em outro momento da discussão, Graciele diz que não tem nada a perder e depois de ouvir o menino dizer que queria que ela morresse, complementa com a frase "vamos ver quem vai para baixo da terra primeiro".

O pai, sempre com a voz em tom baixo, diz ter pena do filho e passa a fazer acusações à mãe dele. "Fico com pena de ti, tua mãe te botou no mato, rapaz, te abandonou". Diante da resposta "e tu trai ela", o médico pergunta, possivelmente se dirigindo a Graciele: "Como é que ele tem isso na cabeça?". A madrasta passa às ofensas contra Odilaine. "Ela que era vagabunda, Bernardo", afirma. "Minha mãe não era vagabunda", grita o garoto. "Eu sei que tua mãe é o máximo para ti, mas simplesmente ela te abandonou", comenta o médico, possivelmente referindo-se ao suicídio. "Ela não me abandonou", sustenta o garoto, soluçando.

Na mesma discussão, Graciele afirma: "ela (Odilaine) é que pensou em matar teu pai". O bate-boca continua e, depois de mais algumas frases dos participantes, Bernardo diz "tinha que ter matado mesmo". O médico responde "mas o que eu tenho de ver, cara, tenho de pagar com minha vida por causa de gente à toa, de gente que não presta?". O garoto mantém o tom e grita: "tomara que tu morra. E que essa coisa (Graciele) morra junto". A madrasta volta à discussão e diz "tu vai antes, doente que tu está desse jeito" e, depois de breve intervenção de Leandro Boldrini, completa: "teu fim vai ser igual ao da tua mãe".

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O restante do confronto verbal tem algumas passagens em que o garoto é humilhado. "É froinha, não é capaz de falar, se fosse macho falava", provoca o médico depois de tentar fazer o filho repetir uma palavra que não entendeu e que está inaudível na gravação. Logo depois, a discussão faz referências à chegada da polícia e as palavras de Graciele dão a entender que o garoto ficou com medo e buscou algum tipo de proteção do pai. 

Depois da chegada da polícia há um longo trecho de silêncio e então, com voz mais serena, todos tratam de um remédio para Bernardo. "Esse remédio aqui", diz o médico. "Tu vai me matar", reclama o garoto. "Dá sessenta gotas", sugere a madrasta. Bernardo fala então em se matar e Graciele diz "dá uma faca, Leandro".

Pelos sons da gravação, é possível deduzir que o médico e o garoto saem do quarto enquanto Graciele fica murmurando carinhos para a filha, então com menos de um ano. Ao voltar, Bernardo, aparentemente com dificuldades para falar, dirige-se à madrasta. "Meu pai me mandou pedir desculpas", diz. Boldrini intervém: "Não mandei, você sabe o que está fazendo". O garoto pede desculpas de novo e a madrasta responde "que seja a última vez".

Em abril deste ano, Bernardo foi encontrado morto em Frederico Westphalen, a 80 quilômetros da residência da família, que fica em Três Passos. O garoto tinha 11 anos. Acusados de planejamento e execução e participação no crime, Leandro, Graciele e mais os irmãos Edelvânia e Evandro Wirganovicz estão presos preventivamente e são réus do processo, que não tem data para ser julgado.

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