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Anistia destaca crise de segurança no Brasil e pede reforma da polícia

Informações integram relatório anual; entidade destaca a repressão violenta de protestos durante a Copa do Mundo

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Por Marco Antônio Carvalho
Atualização:

SÃO PAULO - A Anistia Internacional destacou em seu mais recente relatório o agravamento da crise da segurança pública no Brasil, com uma curva ascendente na quantidade de homicídios, e listou recomendações a serem tomadas para começar a reverter a situação. Dentre as sugestões, estão a elaboração de um plano nacional para redução imediata dos assassinatos, com uma articulação entre os governos federal e estaduais, e a desmilitarização e reforma das polícias no País.

As informações integram o relatório anual da Anistia, que será divulgado mundialmente nesta quarta-feira, 25, e que conta com análise do cenário de segurança e direitos humanos em outros 159 países. Na seção brasileira, que tem 10 páginas, a entidade faz uma retrospectiva de fatos preocupantes de violação de direitos, dando destaque à repressão violenta de protestos durante a Copa do Mundo de futebol realizada entre junho e julho do ano passado em 12 capitais brasileiras.

Relatório da Anistia cita repressão violenta a protestos durante a Copa do Mundo Foto: ROBSON FERNANDJES/ESTADÃO

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A quantidade crescente de homicídios, que já ultrapassam a marca de 56 mil casos por ano, a letalidade das operações policiais, em especial as realizadas em favelas e em regiões periféricas, o uso excessivo da força nas manifestações durante a Copa e a situação dos presídios brasileiros foram outros temas que concentraram as preocupações da Anistia, que pediu atenção especial por parte das autoridades brasileiras para o assunto.

"A falta de priorização do tema da segurança pública no País tem vitimado tanto agentes de segurança quanto a população - destacando-se uma parcela jovem, negra, pobre e radicada nas periferias", destacaram os analistas. 

O diretor-executivo da Anistia no Brasil, Atila Roque, classificou como "inadmissível" o nível de homicídios registrado no País. "Cultivamos a ideia de um país pacífico, mas convivemos com números de homicídios que superam situações onde existem conflitos armados e guerras. É inadmissível que haja cerca de 56 mil vítimas de homicídios por ano, a maior parte composta de jovens, e este não seja o principal tema de debate na agenda pública nacional", disse.

Roque reagiu contra a prática de "justiça pela próprias mãos", que encontrou vários exemplos no Brasil durante o ano passado, e pediu inteligência no combate ao crime. "Enquanto prevalecer o discurso de violência e uma espécie de Estado de exceção, que corrobore a percepção de que a vida de uns vale mais do que a de outros, viveremos a barbárie. 'Bandido bom é bandido morto' é uma filosofia em que todos saem perdendo. Perde o Estado que coloca a vida de seus agentes de segurança em risco e abre mão de enfrentar o crime com inteligência; e perde a sociedade, brutalizada e acuada pelo medo da violência", analisou Atila Roque.

Após relatar casos de repercussão como o desaparecimento do pedreiro Amarildo, no Rio de Janeiro, dados de letalidade das polícias militares, rebeliões com mortes em presídios, em especial em Pedrinhas, no Maranhão, a entidade fez três recomendações. A primeira delas diz respeito à elaboração de um "plano nacional de metas para a redução imediata de homicídios". 

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A organização pede também a desmilitarização e a reforma da polícia, "estabelecendo mecanismos efetivos de controle externo da atividade policial, promovendo a valorização dos agentes, aprimorando sua formação e condições de trabalho". Por fim, recomendou a implementação plena de um programa de defensores de direitos humanos, "que proteja lideranças nos campos e nas cidades promova ampla discussão sobre a origem das violações que os afetam". 

Verdade. O relatório traz ainda informações sobre o trabalho da Comissão Nacional da Verdade e a investigação de violações no período da ditadura, mas faz a ressalva de que o Poder Judiciário tem rejeitado os argumentos que levariam autores de crimes a julgamento em razão da vigência da Lei da Anistia. 

O fato de o Brasil ser signatário do Tratado sobre o Comércio de Armas desde junho de 2013, mas não ter ratificado seu teor no Congresso Nacional até o momento é outro fator de preocupação da Anistia. Esse comportamento faz com que o governo não divulgue dados relativos às exportações de armas e informações que seriam capazes de rastrear o caminho desses produtos e checar se eles abastecem países onde estão ocorrendo violações de direitos humanos em grande escala.

Sem comentários. A reportagem do Estado procurou o Ministério da Justiça para comentários e esclarecimentos quanto a alguns dos casos levantados pelo relatório. O Ministério, no entanto, informou por meio da sua assessoria que não teve acesso ao documento. 

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A Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro também foi procurada, já que é citada em cinco oportunidades no relatório, com descrição de casos envolvendo letalidade policial, supostos abusos em repressões a manifestações e prática de homicídios. Em nota, a pasta não comentou especificamente os casos em questão e focou a declaração nas recomendações feitas pela Anistia.

A Secretaria informou já adotar um sistema de metas e acompanhamento de resultados desde 2009 e já teria pago R$ 282 milhões e premiação a policiais civis e militares pela diminuição de índices de criminalidade. Acrescentou também informações sobre o programa Novo Tempo, que promoveu duas revisões curriculares e a renovação do corpo docente das academias de polícia. "Desta forma, os direitos humanos estão presentes em todas as disciplinas e conteúdos desde a formação básica dos agentes.A Seseg não compactua com desvios ou abusos. Mais de 1600 policiais foram expulsos desde o início da atual gestão", informou em nota.

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