PUBLICIDADE

Favas contadas

Por Dora Kramer
Atualização:

Não é bem uma rebelião, mas um queixume que se propaga pela base parlamentar governista e mais dia menos dia pode se expressar em contrariedade aos interesses do Palácio do Planalto no Congresso, notadamente no Senado.O descontentamento em questão inclui os petistas e, pelo menos nesse caso, exclui a sempre complicada distribuição de cargos. O problema guarda relação mesmo é com o medo de suas excelências de perderem importância. Sentem-se negligenciadas pelo governo, em particular pela presidente Dilma Rousseff.O estilo objetivo de Dilma, festejado exatamente por privilegiar o mundo do trabalho em detrimento do emocionalismo tão ao gosto do antecessor, não tem feito o mesmo sucesso entre seus aliados no Parlamento.O "exagero de formalidade", alegam governistas e petistas, mantém a presidente longe dos senadores que, depois de quase três meses de bons serviços prestados ao Planalto, ainda não receberam dela a deferência que consideram merecida pelo empenho que a maioria no Senado tem apresentado na defesa do governo. O ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, não exibe credenciais nem atributos para fazer a interlocução, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, está assoberbado em suas funções e "Dilma não fala com ninguém".Esse, o resumo da reclamação da maioria ampla que se sente tratada como se no Senado estivesse tudo resolvido e nada pudesse alterar a situação de conforto.Em relação à bancada do PT isso pode até ser verdade, mas não é no tocante a aliados menos comprometidos com o projeto de poder nem exclui a hipótese de os petistas, amanhã ou depois, surfarem na onda da insatisfação só para mostrar que maioria é condição, mas não são favas contadas.Vida pública. De dirigir com a carteira de habilitação vencida ninguém está livre, por descuido, displicência ou acaso.Até aí, nada de muito especial no episódio envolvendo o senador Aécio Neves em uma blitz da Operação Lei Seca, no Rio.O ponto torto é a recusa do senador ao teste do bafômetro. Com isso, deu margem à presunção de que infringiu a lei. Assim como se presume a paternidade de quem se recusa a fazer exame de DNA.Um fato menor diante dos descalabros correntes? Não para quem se pretende líder da oposição, encarnando a representação dos 44 milhões de brasileiros que não votaram em Dilma e a partir desse patrimônio se candidatar à Presidência da República.Aécio Neves sempre diz que não abre mão de seu estilo de vida e que, se for para mudar, prefere deixar a política. Até agora tratada como algo hipotético, a situação poderá se impor como realidade ao senador conforme indica a repercussão desse caso.A menos que reformule seu conceito sobre a possibilidade de conciliação entre vida pública e "dolce vita", sem o ônus inerente ao escrutínio constante da imprensa nacional.Note-se, não é julgamento moral - inclusive porque a questão não se presta a isso -, mas uma ponderação sobre as escolhas, seus respectivos riscos, o exemplo que vem de cima e a autoridade da oposição para criticar adversários, cujas condutas são marcadas pela tolerância com infrações.Coisa esquisita. Reportagem da revista Veja conta que o ministro do Superior Tribunal de Justiça Cesar Asfor Rocha aponta o ex-presidente Lula como responsável pelo boato de que ele, Asfor, teria recebido propina para dar um voto no STJ.Conforme o ministro, Lula recebeu a informação de seu compadre, o advogado Roberto Teixeira, que, segundo a revista, fora o intermediário da proposta de propina.Não se exibem provas materiais de que tenha havido mesmo a oferta. De concreto, só a desistência do então presidente de indicar Asfor Rocha para o Supremo. Se, como alega o ministro, o recuo se deveu mesmo à suspeita sobre a moral do magistrado, fica a dúvida: e por que o então presidente não se indignou com a conduta do compadre?

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.