A Igreja da França discute há dois meses escândalos de pedofilia. São casos graves, pois envolvem de um lado muitos padres culpados de atos de pedofilia anos atrás e de outro o cardeal-arcebispo de Lyon, “primaz dos gauleses”, monsenhor Philippe Barbarin. O erro de monsenhor Barbarin teria sido ignorar as faltas. Preferiu o silêncio.
Barbarin é um prelado de grande prestígio. Exprime-se com força. Em sua diocese é cortejado por muitos fiéis, mas outros suspeitam que ele flerte com teses integristas. No ano passado, monsenhor tomou posição ostensiva contra a lei que autorizou o casamento entre homossexuais. Sobre ele, ninguém fica indiferente.
Os bispos entraram na questão durante sua assembleia anual em Lourdes. Houve um debate de alto nível durante dias, com algumas guinadas bruscas. Uma delas foi protagonizada por monsenhor Lalanne, bispo de Pontoise, muito competente, encarregado do centro de pesquisas da Igreja sobre pedofilia.
Interrogado sobre se os padres que cometem atos de pedofilia são pecadores, Lalanne respondeu: “A pedofilia é um mal. Se tem a gravidade do pecado, não saberia dizer”.
Num primeiro momento, a resposta impressionou. Parecia iluminada. Mas, após algumas horas de reflexão, tornou-se obscura. Os fiéis fizeram perguntas, que monsenhor Lallane se empenhou em responder. O problema é que as respostas mais mexeram com as cabeças dos fiéis que esclareceram as dúvidas. Lallane explicou: “Depende de estarmos conscientes de que ferimos o outro, e em consequência, ferimos Deus”. Pelo que se entendeu, pecar é muito complicado, pois “o verdadeiro pecador é aquele que faz livremente o mal, consciente de que o está fazendo”.
Frente a essas complicações, a ministra da Educação recorreu ao bom senso: “A pedofilia”, disse ela, “é inaceitável legalmente e moralmente. Deixar que paire ambiguidade sobre isso é intolerável”.
Após alguns dias de exaustiva reflexão, monsenhor Lallane voltou à carga. Afirmou que a pedofilia “é um crime atroz que ofende Deus e agride a dignidade da pessoa humana”, mas “tudo depende do grau de consciência de quem comete o ato”.
O episcopado francês continua a refletir sobre o assunto. A Conferência dos Bispos da França (CEF) reuniu-se a partir de segunda-feira e deverá divulgar um conjunto de medidas destinadas a impedir a pedofilia na Igreja e melhorar o atendimento às vítimas, bem como a estabelecer a conduta a ser adotada ante as denúncias de antigos casos recentemente denunciados.
O presidente da CEF, monsenhor Georges Pontier, arcebispo de Marselha, e o corpo executivo da Conferência reuniram-se com o papa Francisco em 7 de março. No jornal Le Monde, monsenhor Pontier admitiu a possibilidade de “nem todas as situações terem sido administradas da melhor maneira”. E encerrou com a frase: “Sobre os fatos antigos recentemente denunciados, é nosso dever ouvir respeitosamente as vítimas e fazer justiça”. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ