Lavagem do Bonfim em Salvador vira palco de campanha

Cortejo homenageia Bonfim ou Oxalá e a cada 4 anos se transforma em palco de candidatos

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Por Redação
Atualização:

Tradição iniciada há 256 anos, a lavagem das escadarias da Igreja de Senhor do Bonfim, em Salvador, é a mais emblemática celebração do chamado sincretismo religioso na Bahia. Toda segunda quinta-feira de janeiro, centenas de milhares de pessoas acompanham a festa, na qual são louvados o santo e o orixá correspondente nas religiões de ascendência africana, Oxalá. As comemorações são abertas por um culto inter-religioso. Segue-se o cortejo de oito quilômetros pelas vias da Cidade Baixa e a lavagem, propriamente dita, comandada por estimadas 500 baianas tipicamente trajadas.

 

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A cada quatro anos, quando há eleições para diversas instâncias do poder público, porém, a festa se transforma em ato político para candidatos. Em especial quando as correntes partidárias começam a duelar por votos muito antes de as campanhas estrearem oficialmente - como acontece neste ano.

 

As autoridades tentam negar que a presença na festa tenha cunho eleitoreiro e chegam a criticar quem faz uso de manifestações populares para angariar votos. O que se vê, porém, nega os discursos: são políticos desfilando em blocos organizados e devidamente identificados - com camisetas, faixas, cartazes e balões -, como em uma passeata de campanha.

O uso político da festa popular não poupa nem o culto inter-religioso. Às 8h30, o prefeito João Henrique (PMDB) e o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima - pré-candidato do PMDB ao governo baiano -, acompanhados por secretários municipais e deputados, já estavam ao lado dos representantes religiosos reunidos para a cerimônia, realizada do lado de fora da Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia. Dali, distribuíam acenos à massa popular.

 

Acaba o culto e só então surge o governador e candidato à reeleição Jaques Wagner (PT), acompanhado pela mulher, por secretários estaduais e deputados de seu partido. Seguindo a tradição criada pelo senador Antonio Carlos Magalhães, quando administrava o Estado, é a comitiva do governador que puxa o cortejo, logo atrás do bloco das baianas.

 

Pouco depois, o grupo peemedebista inicia o trajeto. Como o prefeito recebe algumas vaias ao iniciar a caminhada - a procissão do Bonfim é também conhecida por ser palco de protesto popular -, o ministro Geddel se afasta um pouco.

 

João Henrique, então, passa a integrar um bloco da prefeitura chamado Salvador Cidade da Paz. Diz que os apupos são resultado de "partidos que usam a festa para agredir outros políticos". Contrariado, anda um pouco, mas diz sentir uma cãimbra e abandona o percurso, negando o lema da festa, "quem tem fé vai a pé". Enquanto isso, o ministro, camiseta pólo branca colada ao corpo pelo suor, distribui abraços, apertos de mão e, pacientemente, se deixa fotografar pelos curiosos.

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O bloco do PR aparece na sequência, seguido de perto pelo grupo que une, pela primeira vez no evento, representantes do DEM e do PSDB. Depois de décadas de brigas entre os dois partidos na Bahia, eles mostram estar juntos na corrida eleitoral deste ano.

 

Os presidentes dos partidos no Estado, os ex-governadores Antonio Imbassahy (PSDB) e Paulo Souto (DEM), caminham juntos e apostam no corpo-a-corpo. Param bastante, conversam com populares, distribuem afagos. E o PR, aliado do governo federal, capitaneado na Bahia pelo senador (e também ex-governador) César Borges, mostra estar mais próximo no bloco de oposição na disputa estadual.

 

O cortejo chega ao fim. Nas escadarias, as baianas aguardam a chegada dos políticos para iniciar a lavagem. De uma janela do primeiro andar da igreja, o padre Edson Menezes prepara a bênção aos fiéis. Enquanto isso, batedores de carteira ficam atentos à movimentação, esperando o melhor momento para atacar. Perder dinheiro, documentos ou o celular é relativamente comum no fim do cortejo, momento de maior aglomeração de pessoas. Este ano, a vítima famosa foi Imbassahy, que nem notou quando seu celular foi retirado do bolso da calça.

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