‘O País corre risco de dar um passo atrás’, diz pesquisador

Para especialista, debate está sendo feito de modo superficial e açodado e vai contra a experiência internacional

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Por Felipe Werneck
Atualização:

RIO - O debate sobre criminalidade e redução da maioridade penal é feito de modo superficial e açodado, na direção errada, avalia o advogado e pesquisador Pedro Strozenberg, diretor do Instituto de Estudos da Religião (Iser). “Há uma lógica de transformar as prisões em depositários de pessoas excluídas da sociedade.”

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O que move a discussão sobre redução da maioridade penal?

O debate está sendo feito de modo superficial e açodado, envolto em um sentimento de temor, mas sem nenhum senso prático, servindo mais como uma forma de aplacar a sensação imediata de insegurança. Uma infinidade de dados estatísticos mostra que esse debate precisa ser recheado de respostas mais complexas do que o desejo da punição. Levantar muros e prisões é uma resposta notadamente ineficaz, de curto alcance, e fortemente preconceituosa, repetindo erros já conhecidos. 

Quem vai para a cadeia se a redução foi aprovada?

O Brasil é um país de muitas contradições e desigualdades. Uma forte expressão dessa disparidade são as cadeias e os espaços socioeducativos, que atualmente são compostos basicamente de pessoas pobres e negras, cujas trajetórias são marcadas pela insuficiência das políticas estatais de proteção. Um investimento real nessas áreas possivelmente seria muito mais eficiente e mais econômico. É melhor investir em prevenção do que na remediação. Na lógica que vivemos, a redução da idade penal alcançaria os mesmos jovens que hoje vão para o socioeducativo, mas determinaria de forma mais contundente sua chance de reincidência e de exclusão social. A opinião de que leis mais severas são elementos desestimuladores da criminalidade é pouco realista, em especial em países como o Brasil.

De que forma a experiência internacional pode contribuir?

No Brasil, há responsabilidade penal desde os 12 anos, por medidas socioeducativas. Em muitos países, como Holanda, França ou Alemanha, a imputabilidade penal é aos 18 anos também. Assim, hoje o Brasil tem uma legislação equiparada a importantes países do mundo. A experiência internacional mostra que a penalização dos mais jovens não assegura redução da violência. O Brasil corre o risco de dar um passo atrás.

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Pressionado pelo ímpeto do presidente da Câmara para reduzir a maioridade penal, o governo federal chegou a costurar um acordo com o PSDB para alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com penas mais elevadas para alguns crimes. Como vê essa possibilidade?

Pessoalmente, acho inócuo e tenho posicionamento contrário, mas reconheço que por aí há uma chance de entendimento. Chamo apenas a atenção de que não pode parar aí. É preciso debater sobre as condições de cumprimento de medidas, investimento no sistema socioeducativo, mediação de conflitos, ampliação de políticas para juventudes, senão será um debate limitado e insuficiente. Não devemos nos furtar de debater de maneira pública e transparente nem de deixar de fora pontos de fortalecimento do sistema de proteção social. 

PEDRO STROZENBERG É DIRETOR DO INSTITUTO DE ESTUDOS DA RELIGIÃO (ISER)

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