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ONG para internação de dependentes de crack é suspeita de irregularidades

Relatório da Assembleia do Rio questiona capacidade da ONG Casa Espírita Tesloo em cumprir contrato com a prefeitura

Por Marcelo Gomes e do O Estado de S. Paulo
Atualização:

RIO - Enquanto o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), pretende incluir os adultos dependentes de crack na estratégia de internação compulsória para tratamento, os abrigos municipais destinados a menores viciados apresentam uma série de problemas, segundo relatório da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) publicado em junho deste ano. As quatro unidades vistoriadas pela comissão são administradas pela ONG Casa Espírita Tesloo, por meio de convênio - feito sem licitação - com a Prefeitura. Além disso, a capacidade da instituição para executar os contratos é questionada pela Câmara de Vereadores. A Secretaria Municipal de Assistência Social informou que a entidade foi selecionada por meio de processo seletivo público, e que está estudando formas de melhorar o atendimento aos internados.

 

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Desde 2005, a ONG, presidida pelo major reformado da Polícia Militar Sérgio Pereira de Magalhães Júnior, de 42 anos, já recebeu R$ 79,8 milhões em 23 contratos com a Prefeitura, segundo levantamento no Sistema de Contratos Municipal (Fincon). O oficial é investigado desde 2008 num inquérito da 33ª Delegacia de Polícia (Realengo) como suposto integrante de uma milícia que agiria nas favelas Vila Brasil e Sobral, em Magalhães Bastos, conforme noticiou ontem o jornal "O Dia".

 

De acordo com o relatório da Alerj, os abrigos são de difícil acesso, o que dificulta o convívio familiar; há falta de informações consolidadas sobre o efeito do tratamento dos menores; há uso de medicamentos sem a individualização dos remédios necessários ao tratamento de cada internado; são comuns as contenções físicas dos menores, com pés e mãos amarrados.

 

Devido aos problemas apontados, a Comissão de Direitos Humanos da Alerj, os Conselhos Regionais de Psicologia e Serviço Social, o Núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio e o Grupo Tortura Nunca Mais pedem o fim da internação compulsória de crianças e adolescentes.

 

Uma pesquisa no banco de dados informatizado da Polícia Civil, que contém registros a partir de 2000, revelou que o Major Sérgio, presidente da ONG que administra quatro abrigos, aparece envolvido em pelo menos 14 ocorrências de autos de resistência (morte de suspeitos em confronto com a polícia), sendo que em quatro ele consta como autor. Nos demais, como envolvido. No último caso, em 2011, Sérgio usou uma moto para perseguir um ladrão que havia roubado o carro de um amigo na zona oeste. O rapaz acabou morto, supostamente ao trocar tiros com o oficial. Entretanto, em 2008 Sérgio obteve na Justiça o direito de ser reformado por ter ferido duas vértebras durante uma operação da PM cinco anos antes. O policial também já foi autuado por furto de energia elétrica, em 2004.

 

A vereadora Andrea Gouvêa Vieira (PSDB) questionou a escolha da Casa Espírita Tesloo para administrar os abrigos e criticou a intenção da Prefeitura de estender a internação compulsória para os adultos viciados em crack. "A ONG não tem qualquer expertise nem estrutura para realizar esse trabalho. É uma casa espírita que fazia ações locais de assistência social. Por que de repente concentrou-se nessa entidade essa magnitude de recursos para tratamento de dependentes químicos? Será que o prefeito (Eduardo Paes) quer internar os adultos compulsoriamente nos abrigos dessa ONG?".

 

Em nota, a Secretaria Municipal de Assistência Social informou que a Lei 8.666/93 permite a contratação de entidades sem fins lucrativos sem licitação, mas que um decreto municipal de 2001 obriga que esses convênios sejam feitos através de processo seletivo público - o que foi feito.

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A reportagem do Estado procurou o major Sérgio Pereira de Magalhães Júnior, presidente da ONG, mas não obteve resposta.

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