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ONU pede investigação 'imediata' sobre presídio de Manaus

Para entidade, responsabilidade pela situação dos presos é sempre das autoridades; 56 morreram no Complexo Prisional Anísio Jobim

Por Jamil Chade
Atualização:

GENEBRA - A Organização das Nações Unidas (ONU) alerta que é da responsabilidade das autoridades brasileiras garantir a vida dos detentos e aponta que a morte de 56 prisioneiros em Manaus é um "reflexo" do "caos" nas prisões nacionais. 

A entidade, em um comunicado emitido nesta terça-feira, 3, pediu que as autoridades do Amazonas investiguem de forma "imparcial e imediata" a morte dos detentos no Complexo Prisional Anísio Jobim. "Pessoas que estão detidas estão sob a custódia do Estado e, portanto, as autoridades relevantes carregam a responsabilidade sobre o que ocorre com elas", indicou a ONU em um comunicado. 

Parentes de detentos do Complexo Prisional Anísio Jobim, em Manaus, aguardam informações sobre as vítimas do massacre que deixou 54 mortos na unidade Foto: Michael Dantas/Reuters

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A entidade considera positivo o anúncio do governo do Amazonas de criar uma força-tarefa para "investigar a rebelião e mortes no complexo prisional Anísio Jobim". Mas também "apela para que isso leve a uma investigação imediata, imparcial e efetiva dos fatos". Para a ONU, essa investigação deve levar "os responsáveis à Justiça". 

Mas apenas punir aqueles que cometeram os atos não seria suficiente. "Estados precisam garantir que as condições de detenção sejam compatíveis com a proibição da tortura e um tratamento degradante, cruel e desumano", disse a entidade. "Essas condições precisam também ser compatíveis com o direito de todas as pessoas presas de ser tratadas com humanidade e com respeito à sua dignidade inerente", alertou. 

Segundo a ONU, o que ocorreu em Manaus "não é um caso isolado no Brasil e reflete uma situação crônica dos centros de detenção no país". "Pedimos, portanto, às autoridades brasileiras que tomem medidas para prevenir que tal violência seja repetida e que proteja aqueles sob sua custódia", indicou. A ONU chegou a visitar prisões em Manaus em 2015, alertando já para a crise.

A entidade ainda lembra que, em uma decisão ainda de 1992, o Comitê de Direitos Humanos declarou que esse tratamento humano deve ser a base de aplicação em todos os países e em todas as condições. Alegar falta de recursos materiais em um determinado local não pode ser usado como argumento e o padrão deve ser adotado "sem discriminação". 

Não é a primeira vez que a ONU critica o sistema prisional brasileiro. Visitas realizadas por relatores da entidade concluíram em 2016 que o número de mortes dentro das prisões era "muito elevado". 

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Usando dados do Infopen, o ex-relator Juan Mendez apontou que 545 mortes foram registradas na primeira metade de 2014, com cerca de metade sendo intencional. A taxa é de 167,5 para cada 100 mil pessoas por ano.

Outro aspecto denunciado é o das prisões. "Condições de detenção são equivalentes a um tratamento cruel, desumano e degradante", apontou Mendez. "Superlotação severa leva a uma condição caótica dentro das instalações", apontou. 

Mendez visitou a prisão de Pedrinhas, no Maranhão, e constatou uma situação "explosiva". "As unidades estão superlotadas e prisioneiros ficam de 22 a 23 horas por dia fechados em suas celas. Visitas ocorrem em condições humilhantes, e alimentos e remédios são inadequados. A presença de guardas fortemente armados dentro do local também poderia "levar à uma nova rodada de mortes". 

Para a ONU, não será construindo novas prisões que o Brasil vai resolver seu problema. Segundo a entidade, o País tem a quarta maior população carcerária do mundo, com 711 mil pessoas. Há 30 anos, a população era de 60 mil. Entre 2005 e 2012, a alta foi de 74% e 60,8% dos prisioneiros eram de descendência africana. 

"Apesar de investimentos do governo de R$ 1,2 bilhão para criar uma capacidade adicional de prisões, o aumento contínuo de detentos criou um sistema penitenciário marcado por uma superlotação endêmica", escreveu Mendez.

Mendez pede que o governo foque suas atenções em reduzir a população carcerária, e não aumentar prisões. Para isso, sugere medidas alternativas. 

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