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'Pagamos caro em cirurgia tentando chegar à perfeição de uma mulher', diz trans

Articuladora da base móvel da Cidadania LGBT, Aline Marques, de 38 anos, exalta a perfeição da figura feminina

Por Isabela Palhares e Juliana Diógenes
Atualização:
Aline Marques, transexual que participa do Programa de Reinsercao Social e Transcidadania para a populacao LGBTT da cidade de São Paulo. Foto: Gabriela Bilo

"Aos 10 anos, eu não podia frequentar mais a escola. Parei na 4ª série incompleta. A molecada ficava na porta da escola já me esperando para me bater. Meus irmãos tinham que estar lá me esperando para me levar de volta para casa. A minha mãe tinha que ir na porta de mãe de aluno para se pegar, se rolar no meio da rua para tentar me defender. 

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Ao mesmo tempo, ela me batia porque meus irmãos falavam para ela que eu era muito afeminado. Naquele tempo, falar de gay, de uma pessoa afeminada, era demais. 

Então, eu sofri muito, muito, muito mesmo: de apanhar em casa, de apanhar na rua, de ser xingada, de ser humilhada. Por eu querer ser simplesmente Aline Marques, uma travesti, que nunca fez mal a ninguém, que gosta de passar um batom, gosta de se vestir como uma mulher bonita, bem produzida. Isso não faz mal a ninguém. 

Tinha que me prostituir pelo fato de eu ter que sobreviver. Pegava um currículozinho, que eu já tinha trabalhado numa locadora como atendente, e as pessoas sempre falavam que entravam em contato, que iam dar uma olhadinha, que qualquer coisa entravam em contato… Jamais! Nunca. Nunca recebi um telefonema. Tinha o cabelo já grande, loiro, aquele hormônio pequeno nos seios. Acho que viam que eu era muito feminina e não se encaixava no perfil. Então, eu fiquei desempregada, não conseguia nenhum tipo de trabalho, nenhum tipo de atividade.

Sempre olhava a minha mãe e me imaginava ela. Minha mãe era linda, uma morena tão linda. Aquele cabelo liso de índia. Ela passava aquele batom vermelho na boca, eu olhava e falava assim, na minha mente: eu quero ser igual a ela.

Estamos homenageando essas mulheres lindas que temos no Brasil. É um sofrimento passar por tudo isso para chegar perto da semelhança de uma mulher. Pagamos caro em cirurgia tentando chegar à perfeição de uma mulher porque, para mim, a mulher é perfeita.

Somos mulheres. Eu não estou com uma cueca debaixo do vestido. Estou com uma calcinha. Eu sou uma mulher. Um homem não passa um batom vermelho. Como me veem como um homem? Me veja como uma mulher. Travesti, mas uma mulher.

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Todos os dias são dias da mulher. O ano inteiro é o dia delas, o século é o dia delas. Elas são incríveis, são maravilhosas, são guerreiras, são mães, são tias, são irmãs, são companheiras. Um dia é muito pouco. Para mim, todo dia é dia da mulher. Ela é uma flor."

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