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Rachado, STF suspende julgamento sobre legalidade das vaquejadas

Quatro ministros votaram pela constitucionalidade da prática pela sua "tradição", mas outros quatro a consideram cruel

Por Gustavo Aguiar e Isadora Peron
Atualização:

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu nesta quinta-feira, 2, pela segunda vez, o julgamento sobre a constitucionalidade de uma lei que regulamentou a vaquejada no Estado do Ceará. A polêmica rachou a Corte, cujo placar atual está empatado em quatro votos a quatro. Um pedido de vista do ministro Dias Toffoli adiou a análise do caso.

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 A ação foi proposta pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele sustenta que a vaquejada, inicialmente ligada à produção agrícola, passou a ser explorada no Ceará como esporte, e que laudos técnicos comprovariam danos aos animais. Se considerar a norma cearense inconstitucional, o STF criará uma jurisprudência que poderá proibir a prática em todo o País. 

O julgamento começou em 2015 e voltou à pauta nesta quinta após a devolução do voto-vista do ministro Roberto Barroso. Ele acompanhou o relator, Marco Aurélio Mello para declarar a norma inconstitucional. Para Barroso, qualquer regulamentação da vaquejada de acordo com a Constituição a descaracterizaria, já que a crueldade é inerente à sua prática. 

Se considerar a norma cearense inconstitucional, o STF criará uma jurisprudência que poderá proibir a prática em todo o País Foto: Divulgação

“Nenhuma regulamentação seria capaz de evitar a prática cruel à qual esses animais são submetidos. Primeiro, por que a vaquejada é caracterizada pela 'puxada do boi' pela cauda. Sendo assim, qualquer regulamentação que impeça os vaqueiros de tracionarem e torcerem a cauda do boi descaracterizaria a própria vaquejada, fazendo com que ela deixasse de existir”, defendeu Barroso. 

A ministra Rosa Weber também aderiu à mesma tese. Já os ministros Teori Zavascki e Luiz Fux seguiram a divergência aberta pelo ministro Edson Fachin, que também tem a adesão do ministro Gilmar Mendes. De acordo com Fachin, o próprio Ministério Público reconhece a vaquejada como manifestação cultural e, por isso, tem proteção expressa pela Constituição. 

O decano da Corte, ministro Celso de Mello, decidiu, atipicamente, antecipar o voto para concordar com Barroso e acompanhar o relator. “A Constituição Federal diz que estão vedadas as práticas que submetem os animais a atos de crueldade”, alertou. Ele chamou de “patética” a tentativa de chamar as vaquejadas de manifestações culturais para mascarar seu caráter criminoso. 

Impacto. Gilmar alertou para o impacto econômico de proibir a vaquejada. “Temos uma lei que considera os vaqueiros um profissional. Estamos falando de 200 mil empregos. O que a lei cearense busca é que esses folguedos ocorram observando as normas civilizatórias”, disse. Ele também disse que a decisão pode ser inútil, já que a prática se trata de uma tradição no País.

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Barroso rebateu. “Já houve tradições culturais de todo o tipo. De que negros devem ser escravos, de que mulheres não podem trabalhar e de que gays devem ser mortos. Acontecem homicídios e estupros, e as proibições do Judiciário não conseguem imunizar a todos os crimes. Mas não podemos nos omitir só porque um crime é considerado uma tradição”, defendeu. 

O ministro destacou para diversas práticas de que teve notícia antes de elaborar sua opinião sobre o caso. Segundo ele, os bois nas vaquejadas são atormentados e açoitados, recebem choques elétricos e têm pimenta e mostarda introduzidas via anal para se manterem inquietos. O ministro também mencionou o uso de luvas com pregos para não deixar escapar a cauda do animal.

 Toffoli não tem prazo para devolver o caso ao plenário. Além dele, ainda faltam votar a ministra Cármen Lúcia e o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski.