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'Rouba a dignidade', diz vítima que inspirou projeto de lei dos 'nudes'

Proposta foi aprovada na Câmara; a jornalista Rose Leonel disse estar 'comovida' com a decisão

Foto do author José Maria Tomazela
Por José Maria Tomazela
Atualização:
Rose Leonel compara a exposição da intimidade a um estupro Foto: DIRCEU PORTUGAL

A Câmara dos Deputados aprovou na terça-feira, 21, um projeto de lei que torna crime a vingança virtual, com a divulgação e a exposição pública da intimidade sexual - mais conhecido como “envio de nudes”. A jornalista Rose Leonel, de Maringá, que serviu de inspiração para a proposta que segue agora para o Senado disse estar “comovida” com a decisão. “Estou comovida com a aprovação e esperançosa de que agora a Justiça seja feita e de forma rápida”, disse ao Estado.

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Em 2005, após o fim de um relacionamento, a jornalista teve imagens íntimas divulgadas pelo ex-namorado, que não aceitou a separação, com a insinuação de que ela seria garota de programa. As imagens tiveram grande repercussão na cidade, afetaram a vida da jornalista e foram parar até na escola onde estudavam os dois filhos de Rose.

Na Justiça, ela conseguiu que o autor da divulgação fosse processado e condenado na esfera civil e criminal, mas ainda lamenta o resultado. “No Brasil não tinha uma lei específica para a exposição da intimidade de uma pessoa na internet, então ele foi condenado a 1 ano, 11 meses e 22 dias de prisão, mas não ficou preso nenhum dia. Mesmo com a sentença confirmada pelo tribunal, ele continuou solto. É uma piada.” Na esfera civil, o ex-namorado foi condenado a pagar R$ 30 mil de indenização.

O projeto aprovado prevê pena de reclusão de 3 meses a 1 ano, que pode ser aumentada de um terço à metade se por motivo torpe ou contra pessoa incapaz. “Estou entendendo que a pessoa que fizer isso, agora, vai presa. Não tem essa de pagar cesta básica. Isso era necessário, vai fazer com que ela pense duas vezes antes de cometer o crime.” 

Segundo ela, a vingança virtual com a exposição pública da intimidade sexual deve ser comparada ao estupro. “Destrói a vida da pessoa, rouba a sua dignidade, atinge a família, os pais, os filhos. Vou ter uma neta e fico pensando que um dia ela vai ter acesso àquelas imagens na internet. Isso fica para sempre, como um estigma, um dano irreparável. E, como no estupro, embora a mulher seja a vítima, a sociedade condena a mulher e poupa o infrator. Senti isso na pele.” 

A relatora, deputada Laura Carneiro (PMDB-RJ), lembrou que a proposta também beneficia homens. “É a redenção de mulheres e homens na internet”, comemorou.

ONG. Rose criou a ONG Marias da Internet para dar apoio a mulheres do Brasil e do exterior que foram vítimas desse crime. “Vamos continuar lutando para que a legislação seja cada vez mais rigorosa. É o único jeito de evitar que mulheres sejam massacradas, como eu fui."

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NA MESMA LINHA A Constituição, no artigo 226, parágrafo 8º, determina ao Estado a obrigação de criar mecanismos para coibir a violência nas relações interpessoais/familiares. Em relação sobretudo à violência doméstica, que atinge na maioria das vezes as mulheres, há duas leis de destaque nos últimos anos, também com inspiração em casos reais: Maria da Penha e Carolina Dieckmann.

Maria da Penha Sancionada em agosto de 2006, a Lei Maria da Penha pune crimes de violência doméstica. Ela alterou o Código Penal para garantir que agressores pudessem ser presos em flagrante ou tivessem a prisão preventiva decretada por consequência desse tipo de crime. A legislação foi batizada em referência à farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, hoje com 72 anos, que passou 23 anos sofrendo maus-tratos e sendo agredida pelo marido, que tentou matá-la com uma arma de fogo, choque e afogamento, e terminou por deixá-la paraplégica. Julgado apenas 19 anos após as tentativas de homicídio, o marido dela passou só dois anos em regime fechado. O Brasil foi condenado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos pelo caso.

Carolina Dieckmann A lei trouxe alteração no Código Penal para tornar crime a quebra de mecanismos de segurança para ter acesso a bancos de dados e outras informações eletrônicas. A regra foi sancionada em dezembro de 2012. Embora o projeto de lei tipificando crimes eletrônicos já estivesse em tramitação no Congresso, em maio daquele ano a atriz carioca Carolina Dieckmann, de 38 anos, teve fotos em que aparecia nua e em outros momentos de intimidade expostas por um hacker, que divulgou as imagens na internet. Além das regras que punem o acesso a banco de dados por meio da quebra dos dispositivos de segurança, a legislação também pune quem interrompe serviços de telecomunicações e quem falsifica documentos particulares, como cartões bancários. 

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