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Senado aprova projeto com pena de até 30 anos por estupro coletivo

Casos de violência sexual recentes impulsionaram votação; texto criminaliza divulgação pela internet e passará pela Câmara

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Por Julia Lindner
Atualização:

BRASÍLIA - Casos recentes de estupro coletivo no Rio de Janeiro e no Piauí, que ganharam repercussão nacional nos últimos dias, deram fôlego para a bancada feminina da Câmara e do Senado aprovar projetos de combate à violência contra as mulheres. Nesta terça-feira, 31, os senadores aprovaram matéria de autoria da senadora Vanessa Graziottin (PCdoB-AM) que tipifica o estupro coletivo e aumenta a pena para esse tipo de crime de um a dois terços. 

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Atualmente, o crime de estupro praticado por uma pessoa tem pena prevista de 6 a 10 anos de prisão. Nos casos de estupro de vulnerável, quando o crime é praticado contra uma criança, por exemplo, a pena prevista é de até 15 anos. Pela proposta aprovada, caso o crime seja cometido por duas ou mais pessoas, a pena poderia chegar a 25 anos. Há ainda a possibilidade de a pena ser aumentada caso a vítima do estupro morra - para 30 anos.

Uma emenda da relatora Simone Tebet (PMDB-MS) também criminaliza a publicação, a divulgação ou a distribuição de cena de estupro por qualquer meio através da internet, com pena de dois a cinco anos de reclusão. O dispositivo não consta no Código Penal, apenas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O projeto do Senado segue para apreciação na Câmara. Depois, terá que ser aprovado por sanção presidencial.

Integrantes da bancada feminina fizeram um ato no plenário pedindo o fim da cultura do estupro Foto: Jefferson Rudy / Agência Senado

A matéria estava parada no Senado há oito meses, e só entrou na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) após o caso da jovem de 16 anos atacada no Rio de Janeiro vir a público. Em setembro do ano passado, Vanessa criou o projeto que endurece a pena do estupro coletivo após quatro adolescentes do Piauí terem sido estupradas por cinco homens - uma das vítimas faleceu dez dias após o crime.

Nesta terça, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu acelerar a tramitação da matéria e propôs a apresentação de um requerimento assinado pelos líderes para que a votação fosse levada diretamente ao plenário. Segundo ele, a proposta "é uma resposta do Senado à sociedade" após o crime no Rio. 

"Temos que a reprovabilidade da conduta nos estupros perpetrados por diversas pessoas, na mesma ocasião, é mais elevada que nos demais crimes contra a dignidade sexual, pois a pluralidade de agentes importa, além da covardia explícita e da compaixão inexistente, em ainda mais sofrimento físico e moral, medo e humilhação para a vítima", declarou Simone Tebet. 

Mais cedo, foi aprovada na Câmara a criação de uma comissão especial para acompanhar as investigações do caso carioca. A comissão foi proposta por meio de requerimento apresentado pela deputada Soraya Santos (PMDB-RJ) e contou com apoio da bancada feminina. 

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"A Casa tem de estar junto, acompanhando cada passo das investigações para tomar providências sobre esse crime que chocou o País", afirmou Soraya. Segundo ela, a comissão também deve acompanhar outros casos semelhantes, como o do estupro coletivo que ocorreu no último final de semana na cidade de Bom Jesus, no Piauí, contra uma jovem de 17 anos.

Senadoras e deputadas da Comissão Mista de Combate à Violência Contra a Mulher também aprovaram hoje requerimentos para acompanhar os dois casos de estupro que, de acordo com elas, devem servir de exemplo. As parlamentares vão criar uma subcomissão permanente apenas para os casos de estupro e violência sexual. Elas também aprovaram diligências para visitar as vítimas nas próximas semanas.

Manifestação. Antes da votação, com megafone em punho, segurando cartazes e gritando palavras de ordem, deputadas e senadoras também fizeram uma manifestação no Congresso para denunciar a violência contra a mulher. Elas planejam agora unir forças para barrar projetos que consideram prejudiciais à causa.

Um deles é de autoria do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e do líder do governo na Casa, André Moura (PSC-SE), que criminaliza quem induzir uma gestante a praticar o aborto. A matéria prevê ainda que uma vítima de abuso sexual terá que realizar um boletim de ocorrência para, só então, ser atendida em uma unidade de saúde. 

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"O projeto do deputado Eduardo Cunha obriga a vítima, antes ser atendida num sistema de saúde, a ser atendida em uma delegacia. Isso é motivo de grande dor, porque nós estamos preocupadas, sim, com o fim da impunidade, mas, dentro de um hospital, a comprovação da existência do estupro é feita de forma muito mais adequada do que em um registro frio de uma delegacia. E uso como exemplo, para falar sobre isso, o atendimento péssimo que foi conferido pelo delegado à vítima no Rio de Janeiro. Ainda bem, ele foi substituído por uma delegada que parece estar à altura da tarefa", afirmou a deputada Maria do Rosário (PT-RS).

A senadora Fátima Bezerra (PT-RN), disse que o Congresso Nacional muitas vezes é "cúmplice" da violência contra a mulher. "Desculpem-me a palavra forte. Deixamos o Congresso Nacional, pela ação, infelizmente, de uma bancada de perfil fundamentalista, conservador, acabar sendo conivente com essa situação à medida que deixa florescer e deixa prosperar iniciativas legislativas aqui dentro que fomentam essa cultura da violência. Que é isso? Que projeto de lei é esse que criminaliza as mulheres vítimas do estupro, quando está lá inclusive na própria legislação que elas têm direito", questionou Fátima.

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