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Crônica, política e derivações

O que não merece ser salvo?

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Por Paulo Rosenbaum
Atualização:
 Foto: Estadão

Eles querem conversar? À vontade. Quem ainda é líder? Ouço que estamos a deriva, mas é mais. Bem mais. Embarcações extraviadas ainda costumam contar com timoneiro, um marujo senior, algum almirante aposentado. Nós não temos nada, nem contamos com ninguém. Somos passageiros encurralados em meio a uma epidemia de negação. Quem não sabe que o País sempre se desloca de crise em crise, de popa à proa, do melhor para o pior e vice versa? As instituições estão suportando. Até quando? E desde quando um Estado policial pode conviver com a democracia?

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A aversão aos líderes que nos guindaram a essa anomia sem precedentes emerge de um outro ponto, não mapeado, mascarado, que nos assombra por outros motivos. Os defensores do indefensável se reuniram no clube Brasília. É que, de certa forma, suas vidas só fazem sentido na negação. A aversão aos que hora governam, com menção honrosa para o lulopetismo pela década de descuidos e desperdício de oportunidades, não é emocional, é científica. E a repulsa não vem de outro lugar a não ser do gênero de poder que emanaram. No exercício de uma tirania especulativa, que monitora até onde todos nós somos capazes de engolir.

Portanto, a inviabilidade deste governo não vem do DNA das elites. Não vêm da perda de privilégios. Não têm origem na ancestralidade oligárquica. Não brotou do preconceito de classe. Não se proliferou por geração espontânea nas redes sociais. Não é oriundo do labirinto de versões. Não se sustentou por perseguição moral. Não perdura pela luta entre patrões e empregados. E nem se espelhou em nada a não ser uma predisposição inata, programática e perseverante, uma quase aptidão, para a incapacidade ético-político-administrativa.

Mesmo sem um pingo de teoria conspiratória não é preciso muito para identificar a tentação de abandonar as pessoas à própria sorte torcendo para o pior, a saber, uma resposta dos oprimidos. Se preciso for sempre há o recurso de se convocar minorias violentas. Desorganiza-se o Estado. Para eles, o opressor que está atrapalhando e que pode colocar tudo a perder tem um nome: os valores da burguesia. O detalhe é que nem a mais eficiente técnica para provocar amnésia é capaz de apagar o superavit de bobagens de uma administração, que não pode, por uma questão de pele, nem pedir para sair, nem ficar onde está.

Tudo isso para agora, como resultado de todas as decisões equivocadas acumuladas, ver seus efeitos descerem à realidade e encontrarem o País às vésperas de um embotamento sem precedentes. Só que ninguém, nem os mais pessimistas, poderia prever que o mais repulsivo estava por vir.

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Em meio a toda sórdida campanha mitômana a fim de evitar uma queda já consolidada, acaba de chegar, pela voz do líder decadente, uma comparação entre perseguição aos judeus pelos assassinos nazistas com crimes de natureza pecuniária e anti republicana liderados por consórcios que detém o poder há mais de 13 anos. Passou do ponto de não retorno!

FHC tem toda razão, existem coisas que não merecem ser salvas. Como meros súditos, ainda temos o direito de perguntar se há um lugarzinho qualquer no bote salva-vidas? Também serve rolha, isopor e boia.

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