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Crônica, política e derivações

Sharon: conquistador sem paz

Por Paulo Rosenbaum
Atualização:

Antes de enterro, Israel homenageia Ariel Sharon em funeral de Estado

 Foto: Estadão

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 Salvo raras exceções, a vida e a morte de Ariel Sharon foi estampada na mídia mundial sob a velha discussão simplória e maniqueísta. O julgamento póstumo de uma liderança polêmica sempre tenta matematizar a índole do sujeito para apresentar a fatura estanque junto ao veredito. Seria ele gênio militar ou vilão? Estadista patriota ou traidor de colonos, quando devolveu a faixa de Gaza aos palestinos? Muito provavelmente Sharon era uma mistura destes vários elementos contraditórios que caracterizariam sua vida e história pessoal. Exímio estrategista e de lendária bravura, era sobretudo um pragmático. Provocador, enfrentou fúrias de fanáticos, atravessou o inferno astral por seu envolvimento passivo nos massacres de Sabra e Chatila, além dos desafios externos (como as  ameaças de processos em Cortes Internacionais que pairavam sobre ele) com a mesma determinação com que se defendeu no plano interno quando formalmente acusado de omissão pela Suprema Corte de Israel.

Mas então cabe perguntar por que a tendência para apresenta-lo exclusivamente sob a legenda de carrasco? A vilania nunca é elementar, neste caso e em nenhum outro. Na verdade, condenar alguém à execração pública é uma forma de despistar o foco analítico e perder de vista o que está por trás do vício de informação.

O que explica o respeito que Ariel adquiriu dentro e fora de seu País, é que, diferentemente de maioria esmagadora das nações contemporâneas Israel ainda precisa  continuar a luta por seu direito de existir, e e é imperioso que isso seja incluído na balança dos julgamentos políticos.

Com ou sem ele, o barril de pólvora continua perigosamente ativo. Com Hamas, Hezbollah, salafistas, jihadistas, além dos braços varejistas do Irã na região, ninguém são pode prever uma bonança prolongada. O princípio terrorista destas organizações - tratados com condescendência especialmente pela mídia européia  -- não é especulativo: em suas constituições vigora a cláusula pétrea que vota pelo fim do estado judaico.

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Não é difícil prever que as ondas de antissemitismo -- que mais uma vez se espalham pelo velho continente -  guardem uma relação direta com a demonização sistemática do Estado de Israel.  Uma vez que se tornou impossível continuar sendo racionalizada como preconceito de raça ou etnia a hostilidade contra judeus - como afirmou Jonathan Sacks em recente entrevista à revista Veja  - agora apresenta-se em sua novíssima face:  judeofóbicos tentam se legitimar ao identificar seu ódio à terra de Israel.

São contextos específicos que dificultam qualquer análise externa da situação real do país hebreu.  Sempre prefiro a paz e os humanistas às estratégias militares. Uma negociação radical com os realistas do Fatah pouparia vidas e sofrimento para todas as partes. Mas isso não autoriza ninguém a botar fé na autodestruição. Enaltecer o pacifismo ingênuo, numa região minada, pré radioativa e instável, funcionaria ao modo de imolação voluntária.

Na linha do que Amós Oz recentemente enunciou quando recebeu o prêmio Kafka de literatura, vamos, de uma vez por todas, abandonar a ingenuidade e assumir que o casamento acabou. E já que não deu certo que seja um Estado binacional "não mais um casamento, mas um divórcio justo".

Impossível precisar se o misterioso coma prolongado do militar teve a ver com os rumos atuais de Israel, mas é certo que Sharon tenha ficado inquieto com um porvir, especialmente a aquisição máxima de um Estadista para um povo e que nunca esteve ao seu alcance: a conquista da paz!

Ele e outros ícones militares pregressos e atuais da terra santa permanecerão cultuados. Não porque foram santos ou líderes imaculados, mas porque as pessoas podem sentir o cenário:  não parece estar disponível uma saída pacifica à vista e a sobrevivência precede outras necessidades. Pelo menos não há vislumbre de trégua com adversários com demandas exóticas como aquelas que exigem que você morra antes de assinar acordos.

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