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Crônica, política e derivações

Nenhuma tinta reescreverá a história

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Por Paulo Rosenbaum
Atualização:

Yom Hashoá - Nenhuma tinta reescreverá a história

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Max Planck costumava dizer que uma tese estaria condenada quando não houvessem mais pessoas dispostas a defende-la. Neste sentido é possível afirmar que mesmo se todasas teses estivessem proscritas, o dia de lembrança das vítimas do holocausto nazista sobreviveria.

Por decurso de prazo ou déficit de defensores a história do holocausto que os nazistas infligiram a pelo menos 6 milhões de judeus, permanecerá, mesmo contra todas as forças revisionistas que lutam para borrifa-la. Precisamente aí reside a força do "nunca mais".

Este é o dia ideal para lembrar outros massacres e genocídios tão hediondos quanto aqueles que os judeus sofreram-- como o genocídio circassiano em 1864 que eliminou 1,5 milhão de seres humanos, o milhão de armênios dizimados pelos turcos entre 1915-1923, o extermínio em Ruanda de 800 mil pessoas da etnia tutsi em 1991 perpetrado pelos hutuse, recentemente, minorias cristãs praticamente exterminadas pelos militantes terroristas do Estado islâmico, ou as ditaduras Maduro e Assad que hoje esmagam respectivamente o povo venezuelano e sírio -- não parecem mobilizar suficientemente a comunidade internacional.

Agora que a Síria assume -- num episódio digno de integrar o teatro do absurdo de Alfred Jarry -- a presidência do Comitê de desarmamento da ONU e o clérigo chefe do Quds, obraço armado da Guarda Revolucionária do regime teocrático iraniano, acaba de ameaçar destruir as cidades israelenses de Haifa e Tel Aviv -- é difícil imaginar um mundo com inversões tão bizarras.

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Neste dia em que se rendem homenagens à memória dos seis milhões de judeus mortos é preciso ir além do slogan "nunca mais". É preciso, por exemplo, que as mídias jornalística e televisiva parem de produzir manchetes enganosas, como recentemente fez o site Uol.Pois este portal produziu uma autêntica fake news quando ilustroua manchete dos conflitos de Gaza colocando fotos ilustrativas da matéria crianças vitimas dos ataques de armas químicas lançadas contra a população civil pela associação entre Irã-Siria com a colaboração russa.

A retroalimentação contemporânea do velho-novo antissemitismo obedece duas vertentes : 1- a máxima cunhada pelo filósofo francês Bernard-Henry Levy de que as duas grandes religiõescontemporâneas são o antissionismo e o antiamericanismo 2- a construção de uma aberrante imagem negativa a partir de uma política xenofóbica seletiva: fica interditada qualquer menção acerca dos problemas e desafios causados pela maciça imigração para a Europa, porém passou a ser aceitávelque discursos da extrema direita e da extrema esquerda, evoquem, de forma quase uníssona, toda sua verve antissemita sob o escudo de uma crítica ao Estado de Israel.

Não que o Estado Hebreu não cometa equívocos que estejam acima das cobranças da comunidade internacional, mas chama a atenção o alarmante número de ações que o condenam diplomaticamente. Justo um País quelonge de ser perfeito aceita a igualdade de gêneros, não discrimina minorias, árabes israelenses tem os mesmos direitos e deveres, protege a liberdade religiosa, e acolhe a diversidade humana. A lógica pode ser invertida. É exatamente porque os líderes entendem o que significaria a paz e a criação de dois Estado que apostam na tática do terror. Ao contrário da população lideranças como a do Hamas tem interesses pecuniários evidentes para não desejar a paz. Acusa-se com enorme facilidade o único país com democracia estável no qual nunca houve apartheid, ao contrario do que os detratores argumentam.

Torna-se fundamental analisar a verdadeira desproporção. Quase 70 % das ações de reuniões do Conselho de Segurança foram para discutir sanções contra Israel. Em estudos recentes 66% dos norte americanos não acreditam que o holocausto realmente tenha ocorrido. A Europa registrou a maior onda de ataques contra instituições judaicas. A mais intensa desde o período pré segunda guerra mundial.

Entre nós mais recentemente um suplente do Psol produziu um libelo antissemita clássico, descobriu-se que "militantes de esquerda" da Faculdade de Direito da Usp foram capazes de elaborar um "fichamento" com perfil dos estudantes e ali escancarou-se todataxonomia racista e beligerante desse grupo de patrulhadores da vida alheia. Alguém foi ali "fichado"pelos nobres futuros advogados como: "ideologia desconhecida, judia" sic (ver ilustração). Em outro evento, no ano retrasado, também em pleno campus da Usp em um evento no qual se discutia a matriz ideológica "nacional- desenvolvimentista", a plateia pediu em coro "o fim de Israel" .

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O que isso significa? É literalmente o fim de uma era? O que vêm sendo ensinado nas Universidades? Qual é a versão predominantemente? O sonho de liberdade foi substituído por uma série de equívocos, pregados por uma subsidiada distorção persistente.E não há uma matriz ideológica única.Frequentemente a judeofobia emerge de uma esquerda retrógrada que parece estar se unido ao que há de pior da direita, para que ambas vociferem fórmulas históricas malignas, cuja repetição costuma evoluir para a catástrofe.

Já é tempo de uma profunda reavaliação de valores e colocar limites, dando um basta definitivo na insensatez.

Ou não, desceremos coletivamente ao todos contra todos, e colheremos os magníficos frutos do eterno retorno à barbárie.

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