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Breves análises de política e sociedade

Por que quem é contra o impeachment não está sendo fiel ao PT

A dicotomia bons e maus, justos e injustos, corruptos e não-corruptos, PT e PSDB, não tem hoje mais plausibilidade. A única função que esse tipo de divisão excludente cumpre é a de afastar as verdades dos fatos e de promover o ódio generalizado, dando margem para que, quem realmente se beneficia com a queda do governo Dilma, possa agir impunemente.

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Por Silvia Feola
Atualização:

Quem defende a permanência de Dilma - pelo menos até o atual momento, em que não há de fato provas relevantes para o uso desse tipo de mecanismo político - não está aliado ao PT.

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Pelo contrário, são pessoas que um dia acreditaram - ou não - que o PT colaboraria para um país melhor, mas se desiludiram com o partido quando entenderam que a chamada "governabilidade" não era nada além de alianças antiéticas e perigosas.

Mas essa prerrogativa de alianças parece ser uma necessidade de qualquer partido - o que de modo nenhum exime o PT de suas culpas - mas faz entender que o poder corrupto está instaurado em Brasília no mais alto escalão e que derrubar um peão como bode-expiatório não vai levar a um país "mais justo e livre de corruptos", principalmente se os meios usados para tanto não forem tão legítimos assim.

Quem tenta ludibriar o coletivo, promovendo o "nós x eles" não pode estar bem intencionado: isso, aliado ao frágil momento econômico, permitiu que áudios pessoais de um ex-presidente fossem divulgados.

Não, áudios pessoais não podem ser classificados como em "interesse da república".

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Não, a nomeação de Lula como Ministro da Casa Civil é antiética, mas não pode ser caracterizada como golpe de Estado. Golpe de Estado é quando um governo democraticamente eleito é derrubado por forças internas e externas atuando geralmente em conjunto.

Como bem lembrou Jânio de Freitas essa semana, FHC nomeou Gilmar Mendes nos mesmos moldes em que Lula foi nomeado, a fim de protegê-lo de acusações de atos ilícitos. De novo, isso não exime o PT, mas mostra que os mesmos mecanismos estão sendo usados há décadas.

Só que a Lava-Jato trouxe a esperança de que a queda do PT possa ser o início da queda da corrupção generalizada. Porém, pelos sinais enviados até agora, isso não parece verdade. Se fosse esse o caso, então por que os rumores (bastante plausíveis) de que Temer e o PMDB já estariam articulando a saída do governo? A única razão possível é a de que veem indícios de que quem quer que dê continuidade, estará necessariamente atrelado a eles.

Posto nesses termos, mais parece que os que berram "Fora Dilma!" são aliados os do PMDB do que apenas pessoas cansadas da corrupção. O que também não é verdade.

Assim como não é verdade que os que gritam "Não vai ter Golpe" são aliados do PT. É que o rancor explícito contra o PT trouxe a necessidade de a esquerda tentar reafirmar as qualidades de um governo democraticamente eleito, em nome da soberania das leis.

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A maior parte da esquerda não é um grande vilão, assim como também não o é a maior parte da direita. A esquerda não existe a partir de um complô dos meios universitários, que buscam assim angariar mais dinheiro para seus projetos de pesquisa, como chegou a sugerir um colunista da grande mídia essa semana.

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O que o meio universitário - de humanas, principalmente, mas não só - promove é a leitura exaustiva de textos sobre política e história, a partir dos quais o bom- senso de cada um trabalha sobre o que lhe é válido ou não.

Agora, quem defende a permanência de Dilma, não defende a tese maquiaveliânica de que os "fins justificam os meios". Maquiavel não era de esquerda.

Quem defende o governo eleito, apenas interpreta a incitação à divisão entre "nós x eles" como um meio eficaz de ludibriar o coletivo; um modo nada bem intencionado de promover o PT como o grande inimigo da nação, fazendo crer que o fim do PT será o fim da corrupção.

A crença geral de que se Sergio Moro não for capaz de destituir a todos os corruptos, no mínimo ele deixará bem avisado que os que estão soltos correm perigo não condiz com os fatos reais.

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Como ele seria capaz de qualquer uma dessas coisas? Se a corrupção é tão altamente estruturada, qualquer um que chegue para governar estará imerso em relações já construídas que asseguram o privilégio de roubar às escuras.

É preciso nomear os responsáveis, mas não a qualquer preço. Antes de tudo, é preciso repensar as estruturas institucionais.

Talvez para o Brasil como um todo a saída não possa ser pela esquerda. Mas certamente tem de ser institucional, pelas vias democráticas.

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