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O dia a dia dos alunos Curso Estado de Jornalismo

Um tempo para leitura

O curso está no fim, mas, para nós, é apenas o começo. Há muita coisa para fazer. Especialmente, há muito para ler. Uma certeza que fica deste período é a importância da leitura na vida do jornalista. Por isso, já pensando no pequeno tempo que teremos durante as festas de fim de ano, fui conversar com o editor do suplemento Sabático, Rinaldo Gama, sobre literatura e dicas de livros para jornalistas.

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Por Redação
Atualização:

O papo, que durou mais de uma hora, foi entrecortado por citações. "Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo", recitou Gama. "Muito lindo", disse, com os olhos brilhando. "É um dos melhores lides da literatura", concluiu, sobre a frase de abertura do livro Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Márquez.

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Para o editor, o jornalista precisa ler sobre temas relacionados à sua cobertura diária e sobre assuntos fora da sua área. "Se você lê sempre as mesmas coisas, acaba se alimentando do seu próprio universo. Isso é muito danoso, especialmente para um jornalista, que deve saber lidar com a realidade como um todo", diz.

Além disso, Gama explica que é a leitura que permite sofisticar a escrita. "Para além das 12 linhas, temos que levar o leitor pela mão. Só quem nos ensina esse manejo é a literatura", argumenta. Neste momento, Gama recita outro lide clássico, o de Franz Kafka, em A Metamorfose, e continua: "Ler é uma forma de escrita. Mesmo que você não analise o texto tecnicamente, você absorve estilos e estruturas que pode usar depois, sem nunca saber de onde veio."

E como se eu já não estivesse convencida, disse ainda que acredita na valorização do jornalismo literário. Segundo ele, haveria duas propostas diferentes e necessárias de trabalho jornalístico. Uma estaria baseada na informação instantânea, 24 horas. A outra, no conteúdo aprofundado, contado com estilo, mais reflexivo e de maior investigação. "Na contramão deste jornalismo de pílula, pode ser que o literário ganhe mais espaço. Porque eu não acredito que o ser humano seja capaz de lidar sempre com a realidade só enquanto ela acontece. Precisamos do distanciamento."

Durante a conversa, Gama recomendou:

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- Os Sertões, de Euclides da Cunha. "Porque partiu de uma reportagem e é o retrato do Brasil, com suas dicotomias."

- Do jornalismo literário, A Sangue Frio, de Truman Capote, e Operação Massacre, do argentino Rodolfo Walsh, considerado modelo do new journalism. Este último, "um primor de bem escrito", comentou Gama. Ele também indicou outros títulos da Coleção Jornalismo Literário, da Companhia das Letras, como Vultos da República - Os melhores perfis políticos da revista piauí. Para entender o fenômeno literário, apontou o livro A turma que não escrevia direito, de Marc Weingarten.

- Crônica de uma Morte Anunciada, de Gabriel García Márquez. "Você sabe desde o início que o homem vai morrer. É o estilo que te faz ler o livro."

- Ensaio sobre a Cegueira e O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago. Sobre o último, disse: "É a história mais famosa do mundo, mas é a forma como ela é contada que faz diferença".

- João Ubaldo Ribeiro e Lygia Fagundes Teles. De Clarice Lispector, Laços de Família e A Hora da Estrela. E Machado de Assis? "Leia tudo. Gosto muito de Missa do Galo e A Cartomante."

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- Fernando Pessoa, especialmente O Guardador de Rebanhos, do heterônimo Alberto Caeiro. "Pessoa é o poeta mais extraordinário e surpreendente da língua portuguesa. Talvez da literatura ocidental."

- O Engenheiro e A Educação pela Pedra, de João Cabral de Melo Neto. "Para aprender a escrever sobre temas dramáticos sem ser meloso."

Suspiro. "Nossa, tanta coisa boa para ler e tão pouco tempo." Não conto para ele, mas a minha visão do paraíso é uma biblioteca infinita e a eternidade para ler. Quase adivinhando meus pensamentos, Gama me orienta: "a vida é curta para ler livros ruins". É verdade. Os bons merecem todo o tempo do mundo.

Marina Estarque, de 23 anos, é formada em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Foto: Estadão
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