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O difícil equilíbrio entre cortar gastos e atrair investimentos

Júlio Bueno trocou a Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado do Rio pela Fazenda, com o desafio de fazer ajuste fiscal

Por Vinicius Neder
Atualização:

Homem forte da equipe econômica do governo do Estado do Rio, Júlio Bueno trabalha para, ao mesmo tempo, aumentar a atividade produtiva local e reduzir o custeio da máquina pública, na tentativa de equilibrar as contas sem paralisar a economia fluminense, no cenário de estagnação da economia nacional e ajuste fiscal. Engenheiro e funcionário de carreira da Petrobrás, onde chegou à presidência da BR Distribuidora, Bueno recebeu no último dia 5 a missão de assumir a Secretaria de Fazenda.

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No comando da Secretaria de Desenvolvimento Econômico desde o início do governo Sérgio Cabral (PMDB), em 2007, o secretário começou o mandato de Luiz Fernando Pezão (PMDB), em janeiro, colocando em prática um planejamento estratégico para tempos de crise. Seu principal desafio no novo cargo será o reequilíbrio das contas, cujas receitas serão diretamente afetadas pela queda na arrecadação com royalties de petróleo.

O quadro de ajuste fiscal no governo do Estado terá impacto indireto sobre o dia a dia do trabalho da secretaria de Desenvolvimento Econômico, focado na promoção e na atração de investimentos. Um dos problemas do novo secretário da pasta, Marco Antônio Vaz Capute, será uma redução no poder de barganha na hora de dar incentivos para atrair empresas. "Para dar terreno neste momento, vai ser quase impossível", disse Bueno, em entrevista antes de ser convidado para a Fazenda.

Júlio Bueno: "despesa está determinada; receita é uma possibilidade" Foto: Divulgação

A principal aposta para garantir investimentos é um programa de parcerias público-privadas (PPPs). A previsão é mobilizar de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões em cinco projetos prioritários: saneamento básico na Baixada Fluminense e na área de Itaboraí, São Gonçalo e Magé, ambas localizadas na região metropolitana; duas obras do Metrô do Rio, a expansão da Linha 2 até a até Praça XV e Linha 3 (São Gonçalo-Itaboraí); e o projeto Rio Digital, que vai conectar com fibra ótica órgãos públicos estaduais, incluindo delegacias e escolas.

Procurado dias depois, já confirmado no cargo à frente da Fazenda, Bueno comentou, por meio de sua assessoria, que a saída para reequilibrar as contas públicas é combinar promoção de investimentos com redução de gastos de custeio: "A gente vai tentar aumentar a atividade produtiva e reduzir o custeio. Não se consegue avançar na área pública se a gente não estiver com as finanças em dia. Eu rezo essa cartilha".

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A seguir, os principais trechos da entrevista que concedeu ao Blog Estadão Rio:

Como promover o desenvolvimento num cenário econômico adverso?

Fizemos (na Secretaria de Desenvolvimento Econômico) algumas sessões de reflexão estratégica sobre esse tema. Tem três coisas para fazer. A primeira coisa é o programa de PPP (parceria público-privada). O segundo ponto é a teoria de "chupar o ossinho". O que é isso? Eu tenho cinco ou seis empreendimentos no Rio de Janeiro que estão maturando agora, que estão começando agora. Por exemplo, o Arco Metropolitano (estrada que liga as principais rodovias de acesso à região metropolitana). Qualquer empresa que queira se instalar no Brasil tem que levar em conta o Arco Metropolitano. Você tem porto disponível, tem o maior mercado brasileiro no entorno, tem uma estrada disponível, tem área disponível. Vamos fazer um monte de "road shows", no Brasil e no mundo.

Algum outro exemplo de empreendimento?

Tem o Porto do Açu. Por exemplo, se tiver alguma montadora chinesa querendo vir para o Brasil, vamos mostrar o Porto do Açu. É um lugar espetacular para montar empresa. Vamos sair por aí com a Prumo (novo nome da LLX, depois de ter o controle vendido, pelo empresário Eike Batista, para o fundo norte-americano EIG) e mostrar o Porto do Açu. Outro empreendimento é o Comperj.

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O Terminal 1 do Porto do Açu já embarca minério de ferro. Foto: Marcos de Paula/Estadão

 

O Comperj não está com atrasos?

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O Comperj está com uma crise impressionante. Sou engenheiro da Petrobrás, tenho 37 anos de Petrobrás. A minha geração toda fazia refinaria. Todas as refinarias que foram implantadas pela Petrobrás geraram um enorme desenvolvimento no entorno delas. Há a possibilidade trazer empresas para o entorno dela, como empresas de inspeção de equipamentos, de manutenção, de alimentação. Vamos fazer um esforço concentrado para atrair empresas para o entorno do Comperj. Outro empreendimento é Farmanguinhos (Instituto de Tecnologia em Fármacos), que está fazendo uma instalação de R$ 1 bilhão, que a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz, do Ministério da Saúde) está tocando. No entorno disso, tem uma área que a gente doou para atrair empresas de biotecnologia.

Como vender esses projetos no cenário de estagnação da economia?

Tem que vender. Você vende água e mate no verão e no inverno, não tem jeito. Vai vender no inverno.

A terceira questão é fomentar alguns setores nos quais a gente acha que o Rio de Janeiro tem um grande potencial e que estão subdesenvolvidos

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Qual a terceira coisa a fazer no quadro de crise?

A terceira questão é fomentar alguns setores nos quais a gente acha que o Rio de Janeiro tem um grande potencial e que estão subdesenvolvidos. Por exemplo, desenvolvimento florestal. Se você olhar o mapa do Brasil, todo mundo tem plantação de eucalipto, menos o Rio. E o desenvolvimento florestal ajuda a indústria siderúrgica, há possibilidade de indústria de celulose, há possibilidade de indústria de móveis.

Não faltam áreas?

Temos enormes áreas degradadas no norte e no nordeste (do Estado), que são usadas, em sua maioria, para pecuária de corte. Por que não aconteceu no Rio? Porque as nossas normas ambientais eram muito rigorosas. Mexemos em 2007, mas, mesmo assim, continuamos mais rigorosos (do que outros Estados). Vamos fazer um trabalho junto às secretarias de Meio Ambiente e de Agricultura para conseguirmos nos tornar iguais a Espiríto Santo, Minas e São Paulo.

Qual o ponto específico que deve ser alterado?

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O tamanho (mínimo) da área que precisa ter EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental). A nossa área é a metade da área de São Paulo, Minas e Espírito Santo.

Algum outro setor em vista?

Um segundo setor é mármore e granito, rochas ornamentais. Temos de 15 mil a 20 mil pessoas trabalhando (nesse setor, na região de Santo Antônio de Pádua, noroeste do Estado) e dá para colocar 50 mil postos de trabalho lá. A gente tem uma estrutura rochosa muito parecida com a do Espírito Santo. Fizemos todo o trabalho para ficarmos simétricos a Espírito Santo e Minas com relação à questão tributária, a financiamento (público) etc., mas, outra vez, não tivemos agilidade ambiental. Só no fim do governo a gente conseguiu licenciar novas pedreiras. Levamos 15 anos sem licenciar uma pedreira no Rio de Janeiro. Outro setor que a gente vem fazendo um esforço enorme e acho que tem possibilidade de dar um caldo e crescer é o setor "subsea" (na cadeia de petróleo e gás). É um setor fundamental para atrair empresas, porque, no pré-sal, a grande questão tecnológica é "subsea".

O trabalho da Secretaria de Desenvolvimento Econômico fica ameaçado por cortes no orçamento?

Não, não tem um impacto muito grande. Nosso trabalho é muito de promoção. É claro que a gente perde o nível de atratividade. Ele se reduz, na medida em que se reduz o poder do Tesouro. Por exemplo, o terreno da (fábrica de automóveis da montadora japonesa) Nissan, a gente deu; o terreno da (fábrica da montadora) Land Rover, a gente deu. Para eu dar terreno neste momento, vai ser quase impossível.

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Para dar incentivos fiscais também ficará mais difícil?

Acho que não. O incentivo fiscal, principalmente para a empresa nova, leva em conta a tese de que não existe estatística sobre fatos que não aconteceram. Da mesma maneira, não tem renúncia fiscal para coisa que não existe.

A falta de investimentos públicos, com cortes no orçamento, não pode afastar investimentos privados?

Não acredito, não.

São projetos de grande atratividade. Fazer água e esgoto em regiões adensadas como nós temos, e vamos fazer, tem retorno econômico

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As PPPs são uma forma de minimizar isso?

Temos algumas questões no Rio de Janeiro que precisamos resolver, como por exemplo o saneamento básico da Baixada (Fluminense, cidades na região metropolitana). São 2,5 milhões de pessoas que precisam estar supridas de água e esgoto. Ou o saneamento de São Gonçalo, Itaborái e Magé (também na região metropolitana). Essas obras de saneamento têm que ser feitas.

A atração desses investimentos fica protegida do cenário ruim na economia?

Eu acho. São projetos de grande atratividade. Fazer água e esgoto em regiões adensadas como nós temos, e vamos fazer, tem retorno econômico.

Como vê a queda nas cotações do petróleo, que impacta a receita com royalties?

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Estamos olhando com grande preocupação. O Estado tem que se ajustar a isso. As PPPs são uma forma de a gente tentar, de alguma maneira, mitigar essa questão. Com as PPPs, com alguma garantia, com o fundo garantidor do Estado, você alavanca o investimento.

Quanto da receita deve ser frustrada?

A conta que a Fazenda fez é de R$ 2,2 bilhões para o Estado e mais um valor parecido nos municípios, então, deixam de entrar no Estado, como um todo, R$ 4,5 bilhões. É dinheiro para qualquer lugar do mundo, principalmente num lugar pobre como o Brasil.

É claro que não vou nunca compensar o volume de royalties que Campos e Macaé vão perder, mas, em municípios menores, posso ajudar muito emprestando

Existem planos do Estado para ajudar os municípios?

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Essa é uma discussão que estamos fazendo. Uma maneira de conseguir fazer é muito parecida com o que o governo federal fez com os Estados. Como foram feitos os estádios e os metrôs (para a Copa do Mundo de 2014)? Não foi com o Orçamento Geral da União. Foi dando empréstimos para os Estados. A gente está discutindo usar a AgeRio (agência estadual de fomento) para ajudar os municípios emprestando recursos. É claro que não vou nunca compensar o volume de royalties que Campos e Macaé (cidades no litoral norte do Estado, principais polos de apoio à exploração de petróleo no mar) vão perder, mas, em municípios menores, posso ajudar muito emprestando.

A AgeRio teria poder de fogo?

Teria. A AgeRio tem R$ 300 milhões em capital e daria para chegar a R$ 500 milhões. Isso dá para alavancar R$ 5 bilhões. A gente consegue dinheiro do BNDES, do Banco Mundial, das agências internacionais.

E a crise na Petrobrás? O quanto atrapalha a economia e afeta a atração de investimentos?

Claro que atrapalha. Você reduzir o nível de atividade econômica atrapalha a atração de investimentos. É uma situação muito difícil e muito complexa, que ninguém se atreve a dizer onde vai dar. Ainda falta um pedaço importantíssimo das investigações (da Operação Lava Jato), que pode implicar numa paralisação (da Petrobrás). Eu espero que não.

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