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Rio, principal destino turístico do País há mais de 200 anos

Atrativos são os mesmos desde o século 19; após a chegada da família real, abertura dos portos atraiu visitantes estrangeiros

Por Roberta Pennafort
Atualização:
 Foto: Estadão

 

 

Corcovado é visitado desde os anos 1850, bem antes da estátua do Cristo ( Foto: Arquivo)

 

Aos 450 anos, o Rio já conta mais de dois séculos como o principal destino turístico do País. E desde o século 19 os chamarizes são os mesmos: a beleza natural incomum, com acesso fácil a praias, montanhas e floresta, as comodidades que vieram com a urbanização, como hospedagem e serviços, e o espírito dito afável do carioca. Estudiosa de guias turísticos, a designer Isabella Perrotta conta que essas características já eram ressaltadas nas primeiras publicações do gênero, à época voltadas a atrair estrangeiros para fixar residência na cidade, e se perenizaram.

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"Desde a abertura dos portos, em 1808, os estrangeiros passaram a vir para o Rio: visitantes, artistas, cientistas. Começaram a ser produzidos muito livros sobre a cidade, que são os ancestrais dos guias turísticos. Essa iconografia, que junta o Pão de Açúcar, a bananeira, os Arcos da Lapa e a imagem idílica do negro, e que marcou a pintura do século 19 feita aqui, foi a primeira forma de propaganda turística que tivemos", aponta Isabella, que prepara o lançamento do livro Promenades do Rio - a turistificação da cidade pelos guias de viagem a partir de 1873, nascido de sua tese de doutorado.

Os primeiros guias listavam pontos como as igrejas do centro, os conventos, o Passeio Público e monumentos. Mirante privilegiado a 710 metros de altura, o Morro do Corcovado desde a década de 1850 já atraía excursões e aparecia nas descrições de viajantes, que subiam com a ajuda de mulas. A estátua do Cristo Redentor só seria construída em 1931, e o trenzinho, que trafega em meio à Floresta da Tijuca, se tornou uma atração à parte.

"Foi a primeira estrada de ferro turística do Brasil, em 1884, o que mostra que o Rio sempre foi turístico. Todo visitante queria circular pela Floresta da Tijuca. É isso que caracteriza o Rio até hoje: a possibilidade de chegar rapidamente à floresta, à montanha, ao mar, a rios, a cachoeiras", lembra o historiador Nireu Cavalcante, que escreveu vários livros sobre a cidade.

 

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Principais atrações, Pão de Açúcar e Corcovado alinhados ( Foto: Wilton Junior/Estadão)

 

Com a ampla reforma urbanística do prefeito-engenheiro Pereira Passos na década de 1900, durante a qual foram abertas avenidas como a Central (Rio Branco) e a Beira-Mar (que leva à zona sul), e planejados prédios icônicos do centro, como o Teatro Municipal (1909), a Escola Nacional de Belas Artes (1909) e a Biblioteca Nacional (1910), passou-se a exaltar a imagem de cidade "civilizada", europeizada, pós-colonial, para além do paraíso natural. Higienizadoras, as obras botaram cortiços abaixo, prepararam as ruas para os automóveis e melhoraram a fama internacional do Rio.  Essa "nova cara" passou a ser exaltada nos guias.

Já a valorização das praias só viria na década de 1920, e foi alavancada pela visita dos então reis da Bélgica, Alberto I e Elizabeth, em 1920. Além de conhecer o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Vista Chinesa, a Baía de Guanabara e o Teatro Municipal, eles se deliciaram com banhos de mar em Copacabana. Alberto I ia diariamente, bem cedinho, e gostava de nadar. O exercício logo foi "descoberto" e a população o saudava da areia.

Os reis vieram antes mesmo da inauguração do Copacabana Palace, esse um marco para o turismo da cidade. Um dos mais tradicionais hotéis do País, foi um investimento arriscado: um empreendimento de luxo numa praia ainda pouco frequentada (a do Flamengo era bem mais movimentada) e ainda não atraente aos olhares turísticos. Com o tempo, o cassino, o restaurante e as festas passaram a ser cobiçados não só pelos visitantes, mas também pela elitecarioca.

 

O Hotel Copacabana Palace, na orla: 92 anos de luxo ( Foto: Fábio Motta/Estadão)

 

Até então, a propaganda turística se limitava ao centro, lembra a antropóloga Julia O'Donnell, autora do livro A invenção de Copacabana. A maior divulgação da zona sul coincidiu com a "balnearização" do Rio. "A Copacabana turística começa aí, muito impulsionada pelo Copacabana Palace, que foi uma aposta, não uma demanda. E continua até hoje, ainda que os turistas mais ricos, se não ficam em hotéis de luxo do bairro, prefiram Ipanema ou Leblon, que cresceram de maneira mais organizada", avalia.

Nos anos seguintes, Hollywood seria um veículo importante para a construção da fama do Rio: Voando para o Rio, musical de 1933 com Ginger Rogers e Fred Astaire, foi o primeiro deles a fazer sucesso. Rodado em parte no Copacabana Palace, o filme passeia por vários cartões postais, naturais (Pão de Açúcar, Jardim Botânico) e arquitetônicos (Jockey Club, Confeitaria Colombo). "Foi o primeiro que mostrou com equilíbrio o centro e Copacabana", diz a socióloga Bianca Freire-Medeiros, autora do livro O Rio de Janeiro que Hollywood Inventou.

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Depois viriam os filmes com Carmen Miranda, nos anos 1940, e a imagem que se fixou no imaginário estrangeiro foi a da cidade musical, exuberante e cosmopolita, e com uma gente acolhedora, que celebra o carnaval para além do mês de fevereiro. A imagem de um balneário sem lei, um lugar bom para se esconder depois de se cometer um crime, foi forjada a partir de filmes como O mistério da torre, uma comédia britânica de 1951 em que um ladrão de banco vem curtir sua riqueza no Rio.

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As más notícias dos anos 1980 e 1990, quando do recrudescimento da violência, não chegariam a apagar o cartaz da "cidade maravilhosa", mas o mancharam. "As imagens têm impacto direto no turismo, para o bem e para o mal. As imagens midiáticas, além dos filmes que mostram o Rio como refúgio de criminosos, foram construindo um imaginário. Durante muito tempo, só houve esse tipo de imagem. Por outro lado, filmes brasileiros de sucesso internacional nos anos 2000, como Cidade de Deus e Tropa de Elite, de certa forma incentivam o turismo em favelas, que são vistas como o lugar da autenticidade, onde existe uma solidariedade que se perde no resto da cidade", afirma Bianca.

"As notícias do tráfico de drogas e o descontrole da polícia chegam ao exterior, mas essa má fama vem sendo melhorada dos anos 2000 para cá", opina Julia O'Donnell. "O Rio continua atraente pelos mesmos motivos do século 19: a natureza, a possibilidade de se desfrutar de bons hotéis e restaurantes. Desde que deixou de ser proibido haver estrangeiros aqui, eles vieram e vêm", define Nireu Cavalcante.

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