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Opinião|Black Friday 2020 deu o tom para o varejo de 2021

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Atualização:

A Black Friday desse ano confirmou a expectativa de ser a mais digital da história. Mas também foi a que mais nos ensinou, e pode ter dado importantes pistas sobre como será o varejo no ano que vem.

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Vários fatores explicam isso, todos eles, de certa forma, ligados à pandemia de Covid-19. A começar porque o varejo físico continua um tanto vazio, pois parte da população ainda prefere evitar compras presenciais. Além disso, muita gente que ainda resistia ou usava pouco o e-commerce abraçou de vez essa modalidade de compras no período de distanciamento social.

Boa parte dessas pessoas descobriu suas vantagens e não voltará atrás. E não tem mesmo como voltar! Mesmo porque o retorno a algo mais parecido com uma "vida normal", que depende das vacinas contra a Covid-19, pode demorar ainda mais que o esperado: na semana passada, o Ministério da Saúde disse que não haverá vacina para todos os brasileiros em 2021, devemos ficar bem longe disso!

Portanto, essa Black Friday nos mostrou caminhos interessantes, com muitos aprendizados, tanto do lado dos consumidores, quanto dos varejistas. Precisamos estar atentos às mudanças, pois elas podem salvar nosso negócio de agora em diante.


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Veja esse artigo em vídeo:


Na sexta da Black Friday, as vendas no varejo recuaram 14,5%, em relação ao ano anterior. Os dados são do Índice Cielo de Varejo Ampliado, que monitora 1,5 milhão de varejistas. A causa principal foi o declínio de 25,5% nas vendas no varejo físico. Já o e-commerce cresceu 21,2%.

Os números estão em linha com o apurado pelo Ebit|Nielsen. Segundo a consultoria, somando a quinta e a sexta, o e-commerce brasileiro vendeu na Black Friday R$ 4,02 bilhões, um crescimento de 25,1% em relação a 2019. Foram mais de 6 milhões de pedidos gerados, 15,5% superior ao ano passado.

Mas, mesmo no e-commerce, as vendas decepcionaram. Outra consultoria, a Neotrust, projetava um faturamento de R$ 6,6 bilhões.

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Parte disso se deve ao fato de que o brasileiro ficou mais pobre em 2020. A economia e o emprego já tinham começado o ano bem ruins, e sofreram ainda mais por causa da pandemia. Para muita gente, o auxílio emergencial era o único dinheiro que entrava. Em muitos casos, ainda é.

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Observou-se também uma diluição das compras em vários dias, antes da sexta. Segundo a Neotrust, de segunda quarta, o comércio digital faturou R$ 1,8 bilhão, um aumento de 109% ante o mesmo período de 2019.

As ações de antecipação existem há muitos anos, mas não costumavam dar tão certo. Agora, com muita gente ainda trabalhando em casa, as pessoas tiveram mais tempo de acompanhar a evolução dos preços e identificar essas ofertas mais cedo. Ou seja, aquela fissura de ficar esperando dar a meia-noite no site ou a loja abrir na manhã de sexta está cada vez mais no passado.

Isso também se explica pelo amadurecimento do consumidor digital. Como eu disse antes, muita gente que resistia ao e-commerce agora compra um monte de coisa online.

Por isso, o comércio digital já vinha de uma sequência de bons resultados desde abril. Ele registrou a sua maior alta histórica em 2020, com picos de crescimento nas datas sazonais, como o Dia das Mães e o Dia dos Namorados.

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No trimestre que terminou em setembro, fortemente impactado pelas lojas fechadas, o e-commerce cresceu 43,5% em relação a 2019. Já as lojas físicas, mesmo com a reabertura no começo do segundo semestre, nunca mais recuperaram o movimento de antes da pandemia, mesmo agora na Black Friday. Não houve aglomerações nem filas.

 

Poder na palma da mão

Outra coisa interessante que se viu foi que, mesmo quem estava na loja, estava comparando preços pelo smartphone. Esse comportamento também não surgiu agora, mas se acentuou nessa Black Friday em que até o varejo físico tinha algo de digital.

O consumidor tem muito mais poder de escolha e mais informação, o que exige que as vendas de agora em diante sejam muito mais consultivas e focadas nas reais necessidades do cliente. Aquela história de empurrar o produto encalhado ou que dava mais margem de lucro ficou para trás. Agora a venda só acontece se o consumidor realmente entender que está levando o melhor produto para ele e com as melhores condições.

Segundo uma pesquisa feita pela Samsung sobre tendências desta Black Friday, as ferramentas mais usadas pelos consumidores para isso são plataformas de comparação de preços (usadas por 61% dos clientes), alertas de preços (adotadas por 50%) e redes sociais (com 48% de uso). Mesmo quem tem a intenção em fazer uma compra em uma loja física, porque quer levar o produto na hora, por exemplo, faz pesquisas online. Ou seja, chega na loja sabendo tudo sobre o produto e quais são as melhores ofertas.

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Eu particularmente acho isso ótimo, pois se estabelece um relacionamento mais transparente entre varejista e consumidor. Tanto é assim que o site Reclame Aqui identificou que a queixa mais comum desse ano foi a mesma de anos anteriores: a maquiagem de promoções. Ou seja, as lojas aumentam os preços alguns dias antes, para dar um desconto mentiroso na Black Friday.

É a "Black Fraude: tudo pela metade do dobro!"

Insistir nisso é um tiro no pé! As pessoas não são trouxas e têm cada vez mais acesso à informação.

Vale dizer que, apesar de os sites anunciarem descontos de até 80%, eles são raríssimos! Também segundo o Reclame Aqui, os descontos estavam parecidos com a de anos anteriores, entre 15% e 20%. Dificilmente se encontrava algo com mais de 30%.

A consultoria KPMG destaca também outra coisa que tem que aparecer no radar dos gestores: a segurança. No caso das lojas físicas, o respeito aos protocolos sanitários da Covid-19 é essencial para que os consumidores se sintam seguros para voltar aos estabelecimentos. Já no caso do e-commerce, destaca-se a segurança dos dados dos clientes e das transações financeiras. E, em todos os casos, a logística fica cada vez mais importante, para garantir entregas certas e no prazo. Atrasos podem corroer seriamente a imagem da marca!

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Você está se mexendo?

Faço agora algumas provocações.

Em primeiro lugar, o seu negócio já cuida de todos esses pontos ou está pelo menos genuinamente trabalhando para chegar lá? Aliás, apesar de o assunto aqui se concentrar no varejo, muitos desses aprendizados valem para qualquer negócio, pois eles estão associados a mudanças no comportamento do cliente, que afetam todos os segmentos.

Por exemplo, o omnichannel, que integra de maneira total e transparente os varejos físico e online, e todos os canais de atendimento, se tornou essencial. Qualquer que seja o seu negócio, está cada vez mais difícil saber onde a jornada do cliente começará, e muito menos onde terminará, especialmente em vendas mais complexas. O consumidor pode começar o relacionamento com a marca na loja, obter mais informações no Google, conversar com os vendedores por WhatsApp, fechar a venda pelo site e ir buscar o produto de novo na loja, ou qualquer combinação disso.

Dá para ver que não estar preparado para atender todos esses canais pode dificultar muito as vendas de seus produtos ou serviços de agora em diante. Isso se você não for chutado para fora do mercado!

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Outra coisa importante é que todo a tecnologia é fundamental, não apenas para ter um e-commerce, mas para que todos os vendedores ou o próprio site continue o atendimento exatamente no ponto que o vendedor anterior deixou. Toda a informação sobre o cliente e sobre a venda deve ficar registada e disponível rapidamente.

A tecnologia também pode trazer insights valiosíssimos cruzando os dados do consumidor com seu histórico com a empresa, mas também com suas incontáveis pegadas digitais espalhadas pela Internet. A capacidade da máquina de coletar e analisar uma quantidade absurda de informações pode identificar padrões e fornecer ideias que nem o melhor vendedor do mundo conseguiria fazer.

A Black Friday 2020 não foi, portanto, apenas uma data de vendas: ofereceu ensinamentos valiosos para os gestores. Se o cliente mudou (e ele mudou muito!), não dá para continuar tocando seu negócio do mesmo jeito.

Opinião por Paulo Silvestre

É jornalista, consultor e palestrante de customer experience, mídia, cultura e transformação digital. É professor da Universidade Mackenzie e da PUC–SP, e articulista do Estadão. Foi executivo na AOL, Editora Abril, Estadão, Saraiva e Samsung. Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital pela PUC-SP, é LinkedIn Top Voice desde 2016.

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