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Opinião|O que mais vem da China?

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Atualização:

Nunca se falou tanto da China quanto desde o começo do ano!

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Por conta da pandemia de Covid-19, o gigante asiático ganhou um destaque global ainda maior que o que naturalmente já tem. É alvo de todo tipo de teorias da conspiração, por ter sido o país onde o novo coronavírus surgiu, e pela guerra particular contra ele do presidente americano, Donald Trump, que busca a reeleição.

A despeito de tudo isso, a China foi um dos primeiros países do mundo a relaxar as medidas de distanciamento social, que lá foram muito mais severas que aqui. Mas, por isso mesmo, duraram menos de um mês.

Hoje o país é um dos que lideram a corrida por uma vacina contra o vírus. Eles também desenvolveram hábitos e tecnologias que podem ser muito úteis no mundo pós-pandemia, inclusive para nós.

O que os chineses estão fazendo que nós podemos copiar?

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Veja esse artigo em vídeo:


A China é o maior parceiro comercial do Brasil no mundo. O país asiático tomou esta posição dos Estados Unidos em 2009, e não perdeu mais. Segundo o Ministério da Economia, em 2018, o comércio entre China e Brasil foi de US$ 98,6 bilhões, com superávit para o Brasil de US$ 29,2 bilhões.

Já foi o tempo em que a China era um mero reprodutor de versões baratas e de baixa qualidade de produtos ocidentais, os chamados "Xing Ling". Sim, a China ainda exporta todo tipo de quinquilharias para o mundo todo. Mas o país é hoje dono de uma das indústrias tecnológicas mais pujantes do planeta, em todos os segmentos.!

No mundo pós-pandemia -pelo menos para eles- algumas novidades podem indicar caminhos a ser seguidos por outros países.

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Um estudo realizado pela consultoria Inovasia entre 2 de abril e 15 de junho identificou várias dessas inovações.

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Um deles é o pagamento digital pelos celulares. Em uma época em que o contato se tornou um fator potencial de contágio, até o cartão de crédito nas mãos de um lojista ou de um entregador é visto com receio por alguns. Portanto os meios digitais de pagamento crescem fortemente e os pagamentos por aproximação do celular estão consolidados lá. Aqui no Brasil, isso ainda está começando.

Os superapps chineses, como WeChat e AliPay, concentram o processo, algo que também está engatinhando aqui, com operações locais. Dessa forma, dinheiro em papel é cada vez mais raro na China, o que é muito bem-vindo, pois as notas sempre foram instrumentos de propagação de doenças, e não só de Covid-19.

Nessa mesma linha, empresas que ofereçam produtos que não exijam contato com o público ganham espaço. Até o mundo do trabalho deve ir por esse caminho, com menos reuniões em salas fechadas. Aliás, trabalho remoto, sempre rejeitado por muitos, se tornou uma possibilidade vantajosa! O mesmo se observa com o ensino à distância. Mesmo com as escolas reabrindo, parte do público preferiu continuar com as aulas online.

A tecnologia é essencial nesse ponto, com a adoção de equipamentos que ajudam em atividades como telemedicina, além de realidade virtual e realidade aumentada.

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O varejo de agora em diante

O varejo também se beneficiou da tecnologia. Não apenas pelo crescimento explosivo do e-commerce, mas pela consolidação do chamado shopstreaming. Trata-se de lives em que vendedores ou celebridades apresentam produtos ao vivo, para que os consumidores tirem dúvidas e façam compras na hora.

Segundo o instituto iMedia Research, o "comércio ao vivo" movimentou US$ 63 bilhões na China, em 2019. Com a pandemia, este número deve saltar para US$ 135 bilhões em 2020.

A Inovasia aponta uma coisa interessante nisso: o apresentador não deve ser uma celebridade qualquer, paga para só "puxar o saco" da marca! O que realmente funciona é um influenciador que seja um especialista no produto, que pode falar com propriedade sobre ele. A agência de comunicação Dentsu Aegis Network indicou que mais de 90% dos gestores aumentarão seu investimento em influenciadores digitais, e 80% melhorarão sua infraestrutura de e-commerce.

Outra tendência ligada ao varejo é a entrega em menos de uma hora. Isso já existe na China há uns cinco anos, mas ficou muito mais importante agora. A consultoria britânica Real Capital Analytics indica que imóveis em bairros de Pequim, Xangai e Shenzhen que são atendidas por supermercados que entregam em até 30 minutos tiveram valorização média de 10% só por essa facilidade.

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Outra tendência chinesa ligada ao varejo que se vê timidamente por aqui é a preferência pelo comércio local. Com um consumo mais consciente, as pessoas procuram comprar de pequenos varejistas do próprio bairro, como uma maneira de ajudá-los. Além disso, a Inovasia identificou um crescimento por marcas nacionais, em detrimento de produtos importados.

A alimentação dos chineses também ficou mais saudável. Alimentos frescos estão sendo mais buscados, em detrimento dos congelados. As pessoas também estão cozinhando mais em casa, outra coisa que se observa no Brasil.

Os chineses também estão se exercitando mais, porém não em academias, por serem locais fechados. Cresceu a compra de produtos para atividades físicas na residência.

Do ponto de vista de mobilidade, assim como no Brasil, a venda de carros desabou por lá durante a pandemia: 89% de queda! Mas, com a retomada das atividades, muitas pessoas voltaram a comprar carros. O motivo é não querer usar o transporte público, um foco de contágio.

Além das onipresentes bicicletas, quando o carro se faz necessário, os chineses estão preferindo os veículos LSV, ou Low Speed Vehicles. São carrinhos parecidos aos de campos de golfe, totalmente elétricos, conectados e que se movem a, no máximo, 40 km/h. A sua autonomia varia entre 40 km e 90 km e seu tempo de carregamento é de apenas três horas.

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Assim como aconteceu no Brasil, a China experimentou uma explosão de "fake news" durante a pandemia, disseminadas principalmente por redes sociais. E, assim como aconteceu no Brasil, os veículos de comunicação tradicionais emergiram como fontes confiáveis para combater a desinformação. Os mais jovens tiveram um papel interessante nisso, ajudando parentes e amigos mais velhos a separar as notícias falsas de material produzidos por veículos sérios.

Precisamos melhorar muito nisso aqui no país.

 

Não tem volta!

É interessante observar que essas mudanças vieram para ficar, mesmo entre os "late adopters". Segundo a consultoria chinesa ChoZan, esse público é, em geral, formado por homens acima de 50 anos, com pouca intimidade com smartphones e que têm medo de sofrer golpes online. O mesmo raciocínio se aplica a empresas que, por questões culturais, não sentiam a necessidade de oferecerem seus produtos digitalmente.

A pandemia forçou todos a mudar de postura. E o fim da crise sanitária no país não fez o comportamento dos "late adopters" retornar ao estágio pré-Covid. O motivo principal para a mudança de postura é que seus temores não se concretizaram: a coisa "deu certo"! No caso das empresas, houve aumento de receita em 87% dos casos. O consumo, aliás, voltou com força após o isolamento, porém mais consciente, incluindo evitar dívidas de longo prazo.

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Como se pode ver, a China pós-pandemia traz caminhos interessantes, que podem nos ajudar também. Cabe a nós aproveitar essas ideias da melhor maneira possível.

Vale lembrar que se trata de um país em que as liberdades individuais são restritas e que a arapongagem é algo comum e até aceita. Por exemplo, todo cidadão é obrigado a informar, em um aplicativo, viagens intermunicipais e sintomas de saúde às autoridades. O sistema, que roda nos superapps WeChat e no AliPay, confere classificações verde, amarelo e vermelho a cada cidadão, determinando seu grau de liberdade de circulação.

Fica a questão se queremos fazer algo assim por aqui. O histórico do governo brasileiro de proteção aos próprios cidadãos não anda muito favorável. Devemos estar atentos para que o governo brasileiro não passe dos limites.

Temos muito que aprender com os chineses! Vamos então adotar as coisas positivas que vêm de lá. E aprender o que não fazer com o que não é legal.

 

Opinião por Paulo Silvestre

É jornalista, consultor e palestrante de customer experience, mídia, cultura e transformação digital. É professor da Universidade Mackenzie e da PUC–SP, e articulista do Estadão. Foi executivo na AOL, Editora Abril, Estadão, Saraiva e Samsung. Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital pela PUC-SP, é LinkedIn Top Voice desde 2016.

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