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Diversidade e Inclusão

Acessibilidade é um direito que nem a Justiça consegue garantir

Igor Lima tem paralisia cerebral e usa uma cadeira de rodas motorizada. Aluno do curso de Direito da UERJ, vai para a faculdade de trem. Mesmo em estações com elevador, é carregado pelas escadas, o que contraria a Lei Brasileira de Inclusão. O jovem processou a SuperVia e ganhou R$ 16 mil para bancar transporte particular enquanto as estações são reformadas, mas uma desembargadora do TJRJ mandou o estudante devolver o dinheiro ao governo estadual.

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Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura
Por Luiz Alexandre Souza Ventura
Atualização:

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Especialistas do setor jurídico e profissionais que atuam na defesa da acessibilidade e da inclusão já afirmaram ao #blogVencerLimites que a legislação brasileira para garantia dos direitos das pessoas com deficiência é uma das mais modernas no mundo.

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Os avanços do nosso País com a Lei de Cotas (nº 8.213/1991), o decreto nº 5.296/2004 e a Lei Brasileira de Inclusão (nº 13.146/2015) são destacados em encontros internacionais, até mesmo nas reuniões do Comitê da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que terá a partir do próximo ano a participação da brasileira Mara Gabrilli.

A vida real, no entanto, é muito menos gratificante para o cidadão brasileiro com deficiência que precisa usar os serviços públicos, principalmente o transporte, ou recorre à Justiça para poder ir e vir com autonomia, independência e segurança.

No Rio de Janeiro, mais especificamente na região metropolitana da capital fluminense, o #blogVencerLimites encontrou um dos muitos exemplos dessa diferença entre a percepção do mundo sobre a nossa realidade e o dia a dia das pessoas com deficiência no Brasil.


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 Foto: Estadão


Na cidade de Queimados mora o estudante Igor Lima da Cruz Gomes, de 23 anos, aluno do quinto semestre do curso de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). O jovem tem paralisia cerebral e usa uma cadeira de rodas motorizada, obtida com ajuda da AACD de Nova Iguaçu.

Para frequentar a faculdade, ele precisa pegar o trem na estação Queimados e descer na estação Maracanã, além de fazer o caminho inverso no retorno para casa. E os problemas que Igor enfrenta nesse trajeto quase impossibilitaram sua permanência na faculdade.

O sistema administrado pela SuperVia tem muitos problemas de acessibilidade. "Até mesmo nas estações onde há elevador, eles ficam trancados ou não podem ser usados porque há falta de energia elétrica", conta Igor Lima.

"Estou frequentando a faculdade graças a uma liminar do TJRJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), que obrigou a SuperVia a me levar de Queimados até a estação mais próxima que tenha acessibilidade (no caso, é a estação Deodoro)", diz o estudante.

"Essa estação tem elevador mas a barreira comportamental dos funcionários da empresa é gigantesca", desabafa o jovem. "Eles ligam o elevador, mas não ajudam a entrar ou sair do trem, inclusive na estação Maracanã, que também tem elevador, mas só é ligado quando aparece alguém para usar. A chave fica com um funcionário que leva bastante tempo para ser encontrado", conta o rapaz, que já se atrasou muitas vezes para as aulas na universidade.

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"E ainda tem as constantes quedas de energia elétrica na estação Maracanã, que foi destaque nas olimpíadas e nas paralimpíadas de 2016, mas não tem gerador. Acabo carregado por quatro funcionários, que também demoram para aparecer", relata Igor. "Em Queimados, quando preciso do trem, só resta ser carregado também. Eles retiram as baterias da cadeira motorizada e fazem o processo", conta o estudante.

Por causa dos problemas nas estações Deodoro e Maracanã, o estudante decidiu contratar um transporte particular para fazer o trajeto e desembolsa R$ 80 por dia.


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A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (nº 13.146/2015) determina que (Art. 46) "o direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida será assegurado em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, por meio de identificação e de eliminação de todos os obstáculos e barreiras ao seu acesso" e (§1o) "para fins de acessibilidade aos serviços de transporte coletivo terrestre, aquaviário e aéreo, em todas as jurisdições, consideram-se como integrantes desses serviços os veículos, os terminais, as estações, os pontos de parada, o sistema viário e a prestação do serviço".

Em vigor desde 2 de dezembro de 2004, o decreto nº 5.296, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade, estipulou prazos para adaptação em vários setores que se encerraram em 2014.

Em 2016, Igor Lima ajuizou ação contra o Estado do Rio de Janeiro e contra a SuperVia. Logo na primeira instância, o estudante ganhou R$ 16.800 para bancar seu transporte enquanto as estações de trem recebiam os recursos de acessibilidade exigidos pela legislação.

O governo estadual apresentou recurso que, acredite, foi aceito pela desembargadora Helda Lima Meireles. A magistrada suspendeu o pagamento e determinou a devolução da quantia, inclusive o que já havia sido usado.

Amigos da faculdade organizaram uma campanha para ajudar o estudante. Se quiser colaborar, clique aqui.


 Foto: Estadão


RESPOSTAS - O #blogVencerLimites entrou em contato com o TJRJ e pediu para entrevistar a desembargadora Helda Lima Meireles, mas a solicitação foi negada. Em nota enviada por email, a assessoria de imprensa do tribunal afirma que "juiz não pode emitir opinião sobre processo em tramitação. A recomendação está prevista na Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LC nº 35/1979)", diz a nota.

SUPERVIA - Também em email, a SuperVia afirma que cumpre a decisão judicial e oferece transporte de carro ao estudante Igor Lima até a estação acessível mais próxima de sua residência.

"Desde que a atual gestão assumiu a SuperVia, iniciou um processo gradativo de modernização, que contemplará todas as estações do sistema. Até o momento, 31 já passaram por obras de médio e grande porte e outras 20 receberam melhorias de pequeno porte, além de duas estações que foram construídas.

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As obras incluem instalação de itens de acessibilidade, como rampas, elevadores e escadas rolantes. Durante estas intervenções, os agentes de controle da concessionária atuam em todas as estações e são treinados para auxiliar no embarque e desembarque dos passageiros com dificuldade de locomoção.

A empresa lamenta qualquer transtorno e ressalta que o plano de investimentos em curso, na ordem de R$ 2,4 bilhões, é fruto de uma parceria com o Governo do Estado e, além de modernização das estações, está promovendo a renovação da frota e melhorias operacionais.

Este processo histórico visa recuperar a infraestrutura ferroviária do Rio, de origem centenária, e que não recebeu investimentos nas quatro décadas anteriores à atual administração", conclui a SuperVia.


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