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Diversidade e Inclusão

BPC e a pobreza devoradora de dinheiro

A ampliação do acesso ao Benefício de Prestação Continuada colocou a população com deficiência no centro da briga entre o Congresso e o governo Bolsonaro. Nessa velha batalha de discursos e acusações, sobram cálculos e falta humanidade. O desafio é explicar para uma pessoa com deficiência que tem renda mensal de R$ 522, ou menos, por que ela se tornou responsável por um rombo no orçamento do País.

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Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura
Por Luiz Alexandre Souza Ventura
Atualização:


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Descrição da imagem #pracegover: Davi Alcolumbre, presidente do Senado; Jair Bolsonaro, presidente da República, e Rodrigo Maia, presidente da Câmara, estão em pé, um ao lado do outro, caminhando. Crédito: Agência Brasil.  Foto: Estadão


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A população brasileira com deficiência que vive em situação de miserabilidade está no centro de uma batalha entre o governo de Jair Bolsonaro e o Congresso Nacional. O motivo é a queda do veto presidencial à ampliação do acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que paga um salário mínimo, R$ 1.045, a pessoas com deficiência e idosos.

O projeto vetado por Bolsonaro, mas aprovado por 45 senadores e 302 deputados (acesse aqui a lista completa com o voto de cada parlamentar), eleva de 25% do salário mínimo, R$ 261, para 50% do mínimo, R$ 522 em valores atuais, a renda máxima per capita (por morador da mesma residência) exigida para inclusão no programa.

É o dinheiro que o cidadão tem por mês para comer, se vestir, pagar as contas, comprar remédios e bancar todas as despesas habituais. No caso das pessoas com deficiência, inclua nesse custo fraldas, sondas, o tratamento de feridas e escaras, o transporte ao posto médico e a manutenção de equipamentos como cadeiras de rodas, bengalas e muletas. A lista de necessidades é bem maior.

A proposta vetada é de 1996 e tem um buraco que tem sido usado como argumento para justificar o bloqueio. Conforme determinam a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), todo Projeto de Lei que gera custo à União precisa prever a fonte de custeio, ou seja, tem de comprovar de onde vai sair o dinheiro. E o PL recusado pelo presidente não tem essa informação.

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Nas últimas semanas, as articulações no Congresso indicavam que o veto ao projeto seria mantido. Com essa possibilidade à frente, o governo apresentou no dia 4 de março um estudo no qual o Ministério da Economia previa gasto anual de R$ 11,6 bilhões a mais, caso a proposta se transformasse em lei.

Nesta terça-feira, 10 de março, dia anterior à queda do veto, quando as movimentações no Congresso já estavam invertidas e indicavam a derrubada da decisão presidencial, outro estudo apresentado pelo governo destacou gasto de R$ 55,5 bilhões com o BPC em 2019 e, considerando a elevação da renda máxima exigida para 50% do salário mínimo, aumento imediato de R$ 20,1 bilhões por ano.

Em seis dias, o governo aumentou o custo previsto com a ampliação do BPC em R$ 8,5 bilhões por ano, destacando que esse valor é resultado de uma atualização na base de dados. A estimativa oficial é de R$ 217 bilhões em uma década.

Fontes no Congresso Nacional ouvidas pelo #blogVencerLimites chamaram essa mudança de "uma chantagem para impedir a derrubada do veto". Essa mesma afirmação foi feita por vários senadores e deputados na sessão conjunta desta quarta-feira, 11, que derrubou o veto.


Baixe e leia o estudo do governo federal sobre o BPC publicado em 4 de março

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Baixe e leia o estudo do governo federal sobre o BPC publicado em 10 de março


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O que vai acontecer? - O governo avalia a possibilidade de acionar o Tribunal de Contas da União (TCU) para construir um saída à derrubada do veto. E pode ter apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conforme reportagem do Estado.

A equipe econômica pretende buscar uma saída jurídica para a decisão do Congresso. A ideia do governo é usar o acórdão do tribunal para não implementar a medida, exatamente porque não foi apontado de onde virá o dinheiro para bancar o programa, e buscar uma solução negociada com o Parlamento até o final do ano.

Em vigor - O BPC é regulamentado pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e tem atualmente 4,6 milhões de beneficiários, segundo dados do Portal da Transparência.

A lei ainda não foi publicada e o presidente tem 48 horas, a partir da queda do veto, para a promulgação. Após esse prazo, isso pode ser feito pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM/AP) e, também depois do mesmo período, pelo vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSD/MG). A regra está no artigo 66 (§ 7º) da Constituição Federal.

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15 minutos de fama - A redoma de invisibilidade que esconde o universo das pessoas com deficiência da sociedade é muito dura e difícil de quebrar. Embora o Brasil tenha, segundo dados oficiais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 45,6 milhões de cidadãos com deficiência, algo em torno de 15 milhões com deficiência severas e incapacitantes, políticas públicas para essa população são escassas.

O BPC é uma garantia de renda a quem não pode trabalhar e esse benefício precisa ser constantemente revisto, principalmente diante da situação de profunda desigualdade brasileira.

Na batalha entre Congresso e Governo, que lançou um pequeno e fraco ponto de luz na direção das pessoas com deficiência, por um breve período, há muitos números e cálculos sofisticados, mas falta humanidade. E também falta ao governo observar o retorno imediato dos valores.

Incluir mais pessoas com deficiência e idosos no BPC para garantir um salário mínimo a quem não tem como bancar nada da própria vida, ampliando o leque de cobertura do programa, joga dinheiro na economia, recurso que o cidadão vai usar para comer, se vestir, pagar as contas, comprar remédios, fraldas, sondas, o tratamento de feridas e escaras, o transporte ao posto médico e a manutenção de equipamentos como cadeiras de rodas, bengalas e muletas.

Números e pessoas não são sinônimos.

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