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Diversidade e Inclusão

Defensoria Pública da União apoia ação contra decreto que segrega estudantes com deficiência

DPU solicitou ao STF sua inclusão no processo aberto pelo PSB Nacional que pede a inconstitucionalidade da política de educação especial proposta pelo governo Bolsonaro em 2020.

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Por Luiz Alexandre Souza Ventura
Atualização:

Ministro da Educação, Milton Ribeiro, e o presidente da República, Jair Bolsonaro, já afirmaram que estudantes com deficiência atrapalham os colegas sem deficiência. Crédito: Reprodução. Foto: Estadão


A Defensoria Pública da União (DPU) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) sua inclusão como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 6.590/DF, proposta pelo PSB Nacional contra o Decreto Presidencial n° 10.502/2020, apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro em setembro do ano passado, que institui a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida.

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Criticado pela maioria dos especialistas em educação inclusiva, chamado de 'decreto da exclusão' porque torna oficiais as salas e escolas que isolam estudantes com deficiência, impede a convivência com alunos sem deficiência e a frequência na escola regular, o Decreto n° 10.502 foi suspenso pelo ministro Dias Toffoli, do STF, em dezembro do ano passado.

"Viabiliza-se, com o decreto, a segregação no sistema de educação. Crianças e adolescentes com deficiência, em decorrência de sua condição, sujeitam-se a realizar atividades escolares apartados de seus pares sem deficiência. Abre-se, em considerável escala, temível flanco para a segregação educacional de crianças e adolescentes com deficiência. Consagra-se ultrapassado paradigma que, tradicionalmente, manifesta-se, dentre outras formas, pela criação de empecilhos práticos e inconfessáveis para a inclusão de crianças e adolescentes com deficiência, tais como as exigências burocráticas insuperáveis e mesmo as recusas injustificadas para matrículas em classes regulares", destacou a DPU no documento endereçado ao ministro Dias Toffoli, que é o relator da ação.

O amicus curiae, ou amigo da corte, é uma figura do direito brasileiro que garante a participação de órgãos públicos e entidades da sociedade civil em processos judiciais. A participação se dá com base em manifestações sobre assuntos polêmicos ou que necessitem de conhecimento técnico para análise.

A ADI proposta pelo PSB Nacional contra o decreto de Bolsonaro tem 27 amicus curiae, entre os quais estão a Humans Right Watch, a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD), o Instituto Jô Clemente, a Associação Turma do Jiló, o Instituto Rodrigo Mender (IRM), a Federação Nacional das Apaes (Fenapaes) e a Associação Nacional do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (AMPID).

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Em agosto, o ministro Toffoli convocou uma audiência pública sobre o tema para ouvir instituições, especialistas, representantes do governo federal e da sociedade civil. O julgamento definitivo da ação ainda não foi marcado.



No mês passado, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, participou de uma sessão da Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) do Senado para explicar recentes declarações capacitistas sobre estudantes com deficiência e também sobre o acesso ao ensino superior.

Recentemente, para defender o Decreto Federal nº 10.502, Ribeiro disse que o "inclusivismo" prejudica os alunos e que estudantes com deficiência atrapalham o aprendizado dos colegas sem deficiência.

O ministro pediu desculpas pelas declarações, ressaltou sua formação na Universidade Mackenzie, chamou a atenção para a característica inclusiva da instituição, listou investimentos do MEC e voltou a defender a PNEE 2020, destacando que essa proposta não foi compreendida. Em resumo, não apresentou nenhuma informação nova ou diferente do que já havia dito.

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Na sessão, chamou a atenção a fala do senador Esperidião Amin (PP-SC), que fez uma analogia entre autistas e pessoas em um restaurante que não conversam, usando o autismo como referência de comportamento social individualista, uma análise equivocada e que mostra desconhecimento a respeito do transtorno, como o próprio senador declarou. "Não sou cientista, vou fazer um charlatanismo", disse Amin antes do comentário.

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A senadora Mara Gabrilli (PSDB/SP) não participou da sessão com Milton Ribeiro porque estava na reunião da Comissão da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, mas a parlamentar havia se posicionado anteriormente sobre as declarações do ministro. "Já que o senhor não reconhece o valor da diversidade na sociedade, torna-se impossível reconhecê-lo como Ministro da Educação", publicou a senadora das redes sociais.

Gabrilli também enviou requerimento pedindo esclarecimentos de Milton Ribeiro à Comissão de Direitos Humanos do Senado, que ainda não foi pautado, e convidou o Ministro da Educação para falar no plenário.


Clique aqui para ler e baixar a íntegra da ADI proposta pelo PSB Nacional

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Em janeiro deste ano, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, em fala a apoiadores no Palácio do Planalto, que a educação inclusiva "nivela por baixo" e que a presença de alunos com e sem deficiência na mesma classe prejudica toda a turma.

A declaração foi uma resposta a uma mulher, que se apresentou como professora e reclamou da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o Decreto Federal nº 10.502, de 30 de setembro de 2020, que criava a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida.

"O que acontece na sala de aula: você tem um garoto muito bom, você pode colocar na sala com melhores. Você tem um garoto muito atrasado, você faz a mesma coisa. O pessoal acha que juntando tudo, vai dar certo. Não vai dar certo. A tendência é todo mundo ir na esteira daquele com menor inteligência. Nivela por baixo. É esse o espírito que existe no Brasil", disse Bolsonaro.



No Brasil, entre 92% e 94% dos estudantes com deficiência estão matriculados em escolas regulares, a maioria da rede pública.

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"É muito simplista pensar que, por causa da deficiência, o aluno não aprende", diz Carolina Videira, fundadora da Turma do Jiló, associação que implementa programas de educação inclusiva em escolas públicas. "O problema não é de aprendizagem, mas de ensinagem. Precisamos valorizar, dar melhor formação e ferramentas ao professor para ele garantir que nenhum aluno fique para trás", defende a especialista.

Um estudo conduzido ao longo de três anos pelo Centro de Ensino, Pesquisa e Inovação (CEPI) do Instituto Jô Clemente (IJC) comprovou que alunos com deficiência intelectual têm desenvolvimento superior, ganhando mais independência e autonomia, quando estudam em escolas regulares, na comparação com aqueles que frequentam exclusivamente as escolas especiais.

A pesquisa acompanhou 109 alunos com deficiência intelectual. Desse grupo, 62 foram para a escola regular e 47 para escolas especiais. Por meio de avaliações e entrevistas com professores, foram observados o desenvolvimento cognitivo, a comunicação, a sociabilidade e outros critérios.

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