PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Diversidade e Inclusão

Filme de Leandro Hassum é uma oportunidade perdida

'Amor Sem Medida' poderia acabar com o 'cripface', apostar em artistas com e sem deficiência, defender a diversidade e a representatividade, e ser muito engraçado, porque a piada agora é escancarar preconceitos e expor o capacitismo.

Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura
Por Luiz Alexandre Souza Ventura
Atualização:

 


As discussões sobre o filme 'Amor Sem Medida', que bateu recordes na plataforma Netflix, expõem uma prática que deveria ser abandonada pela indústria do entretenimento, o cripface, quando artistas sem deficiência são modificados digitalmente para interpretarem personagens com deficiência.

PUBLICIDADE

A comédia que tem Leandro Hassum no papel de um cardiologista com baixa estatura estreou em novembro e, logo nas primeiras semanas, foi o filme de língua não-inglesa mais visto na plataforma. Ultrapassou 10 milhões de horas vistas, ficou em nono lugar no streaming e entrou para o Top 10 no Brasil, Costa Rica, República Dominicana, Guadalupe, Honduras, Martinica, Nicarágua, Uruguai, Venezuela, Luxemburgo, Portugal, Suíça, Ilhas Maurício e Ilha da Reunião.

Conta a história de amor entre a advogada Ivana, interpretada por Juliana Paes, e o conceituado médico, personagem de Hassum (em nenhum momento o cardiologista é apresentado como alguém com nanismo). É a versão brasileira do longa argentino Corazón de León, de 2014.

Assim como feito com o protagonista na argentina, Hassum foi 'encolhido' digitalmente para ser o médico Ricardo.

Não deveria haver mais espaço para produções como essa e não se trata aqui de mais uma defesa dos 'limites do humor', porque o filme poderia sim ser muito engraçado se apostasse no trabalho de artistas com deficiência e tivesse no mesmo elenco atores famosos, como o próprio Leandro Hassum, em papéis bem elaborados.

Publicidade

No caso de 'Amor Sem Medida', era uma excelente oportunidade para debater preconceitos e discriminações, colocando Hassum, com seu indiscutível talento, na posição de alguém que representa esse capacitismo e, quem sabe, aprende a desconstruir essa observação ultrapassada.

O engraçado agora é escancarar os comportamentos preconceituosos para ampliar o conhecimento sobre o capacitismo, dar visibilidade às pessoas com deficiência, desmontar estereótipos, quebrar estigmas a respeito da diversidade e reforçar a importância da representatividade em todos os setores.

Obviamente, as reações ao longa foram rápidas. Juliana Caldas, atriz que tem nanismo, conhecida pela novela 'O Outro Lado do Paraíso' (Rede Globo), foi a primeira a se manifestar.

"É um absurdo, a gente tenta lutar por respeito, pelo nosso espaço. Por exemplo, um espaço que poderia ter tido um ator realmente com nanismo no filme, não teve", disse Juliana em vídeo compartilhado nas redes sociais. "Quando a gente fala sobre o nanismo, a maior parte das vezes é nessa forma de piada capacitista totalmente preconceituosa".

Giovanni Venturini, ator que também tem nanismo, afirmou que o longa desrespeita as pessoas com nanismo, gera desinformação e reforça problemas de um cinema ainda pouco diverso.

Publicidade

"Eu tive vontade de chorar assistindo a esse filme, mas não porque ele é emocionante e tocante. Pelo contrário, chorar de desgosto mesmo", disse Venturini.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

O ator americano Peter Dinklage, que tem nanismo e ficou mundialmente famoso por sua excelente atuação no papel de Tyrion Lannister em Game Of Thrones (chamado de anão durante toda a história), falou à Folha de S. Paulo sobre o problema.

"Eu vejo filmes do passado e, infelizmente, se algo faz dinheiro, vai ser repetido. Estamos falando de uma indústria, afinal", declarou. "As pessoas bonitas não monopolizaram o amor em si. O amor é universal. Eu sei que gostamos de ir ao cinema para ver gente bonita, mas há muitas outras histórias por aí e elas precisam ser contadas. Mas é uma questão muito complicada, porque nós atores precisamos ter muito cuidado para não ofender as pessoas, e ao mesmo tempo nosso trabalho é basicamente interpretar pessoas que não têm nada a ver com a gente. Então isso gera um impasse complicado", completou Dinklage.

Diante da polêmica, Leandro Hassum divulgou uma nota. "Meu propósito sempre será divertir e entreter, pois acredito no humor agregador para toda a família. O filme conta uma história de amor, de pertencimento e de inclusão, valorizando as capacidades de seus personagens e repudiando qualquer preconceito, de qualquer espécie. Vivemos num mundo ainda distante do ideal, mas que vem caminhando no sentido de não dar espaço a nenhum tipo de preconceito, segregação ou exclusão. Esta foi a intenção, por meio da leveza e do humor, abordar a importância de vivermos num mundo com mais amor e respeito, onde ser aceito e amado independe de características físicas", diz a nota.

A Netflix também se posicionou. "Reiteramos nosso compromisso em fazer com que mais pessoas se identifiquem com nossas histórias e se sintam representadas", declarou a plataforma.

Publicidade


Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.