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A burla continua

Por Dora Kramer
Atualização:

Não é desdém pelo dinheiro público, mas na mixórdia de descalabros que o Senado acaba de reapresentar ao País com essa história da reforma administrativa que foi sem nunca ter sido, francamente o menos escandaloso é o valor do contrato pago à Fundação Getúlio Vargas.Escabroso não é gastar R$ 250 mil. Escandaloso é pagar ? seja quanto for ? duas vezes pelo mesmo serviço no período de um ano porque o trabalho entregue anteriormente foi boicotado por subordinados dos contratantes que, mesmo assim, estavam prontos para executá-lo mesmo desfigurado.Em resumo é o que se depreende das explicações dos senadores Tasso Jereissati e Pedro Simon, integrantes de um grupo de senadores que, ao analisar o projeto de reforma ? note-se, já aprovado pela Mesa do Senado ? se depararam com uma monstruosidade pronta para ser votada em plenário.Os responsáveis diretos, o diretor-geral, Haroldo Tajra, e o primeiro-secretário, senador Heráclito Fortes, não deram uma palavra a respeito. O presidente do Senado, José Sarney, fez o papel de sempre: a vítima surpreendida."Não tem sido fácil, tenho apanhado muito." Por mérito, convenhamos. Segundo os senadores Tasso e Simon, o Conselho de Administração do Senado distorceu todo projeto da FGV. Conforme as promessas feitas na crise do ano passado que provocou a demissão do diretor-geral Agaciel Maia e quase derrubou José Sarney da presidência do Senado, a reforma deveria organizar a estrutura administrativa, reduzir diretorias, diminuir funcionários terceirizados, "enxugar" as atividades meio.O resultado final foi o oposto: propunha o aumento de cargos em comissão na proporção de 158% em relação ao sugerido pela FGV, criava uma grande estrutura de obras e conferia à Polícia Legislativa poderes, segundo Pedro Simon, equivalentes aos da Polícia Federal.Sarney se fez de desentendido, ambíguo, não se estendeu em comentários como quem insinua que não sabia de nada. Mas o projeto examinado e vetado pelo grupo de senadores havia sido aprovado pela Mesa Diretora. Presidida por José Sarney.É o maior, mas não o único responsável. Há os demais integrantes da Mesa, há todos os outros senadores que por ocasião da crise aguda juraram à nação que acompanhariam de perto o desenrolar da reforma.De duas, uma: ou não acompanharam e deixaram o processo correr frouxo na mão do Conselho de Administração que, ao que se vê, continua a funcionar sob filosofia de que o Senado é uma Casa garantidora de privilégios, ou acompanharam e sabiam de tudo e tudo era para ser exatamente como foi feito.De qualquer modo, esse era um fiasco anunciado. E de cuja responsabilidade apenas alguns poucos escapam. Quando a crise "Agaciel" estourou alcançou José Sarney no início do mandato, vindo de gestões anteriores tendo sido o padrinho do mentor da estrutura viciada.Essa evidência somada às irregularidades que atingiam o próprio Sarney eram mais que suficientes para indicar que com ele na presidência nada mudaria. Tem uma cabeça de outra época. Ele contemporiza com o antigo. Portanto, questão de lógica e tempo para o lodo voltar à superfície.Quem embarcou na operação abafa comandada pelo presidente Luiz Inácio da Silva foi porque quis. A ninguém no Senado é dado o direito de dizer a cigana me enganou. Esse tipo de episódio é filho das costas quentes, primo-irmão do compadrio. E, como já dizia um notório perito no assunto, sustentado pelo vício insanável da amizade.Toda obra. O PMDB escalou para expor o programa de governo a ser executado em parceria com o PT se a aliança governista vencer a eleição presidencial dois expoentes do partido no governo Fernando Henrique.Eliseu Padilha, ministro dos Transportes, e Moreira Franco, assessor especial com gabinete no Palácio do Planalto.No programa o PMDB defende a profissionalização do Estado, em contradição com a prática do partido de adesão a qualquer governo que lhe garanta espaço político na máquina administrativa.

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