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''A gestão pública é feita de acordo com a nova realidade''

O ministro diz não julgar a opinião de ''atores sociais'' e defende que o acesso à terra esteja ligado à produtividade

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Por Redação
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ENTREVISTAAfonso Florence, ministro do Desenvolvimento AgrárioCom estilo mais discreto que o de seus antecessores, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence, tem evitado polemizar diretamente com o MST. De acordo com o ordenamento das tarefas políticas no atual governo, essa função cabe ao ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência da República. Mas, em entrevista ao Estado, Florence não deixou de rebater as críticas do movimento e disse que a reforma agrária no Brasil está sendo feita "dentro das regras da lei e do pressuposto da responsabilidade fiscal, com o orçamento disponível". / R.A.Como o sr. vê as críticas do MST de que o atual governo paralisou a reforma agrária?Eu não julgo opiniões de atores políticos e sociais, eu lido com fatos - e os fatos apontam avanços enormes em seis meses. A presidente Dilma já liberou todo o orçamento de obtenção de terras e também de assistência técnica para o ano de 2011. Mais de 600 mil famílias serão beneficiadas pela assistência. Estamos lançando, agora, o Plano Safra de 2011, que vai ajudar a consolidar a organização econômica da agricultura familiar, com enormes avanços nas áreas de crédito, da garantia da safra, do seguro agrícola. O crédito está sendo oferecido em condições muito mais atrativas do que em outros anos. A presidente quer pôr à disposição R$ 16 bilhões para o plano, com possibilidade de ampliar essa quantia, se tudo for contratado. A meta é elevar a produção de alimentos, com inclusão produtiva, redução dos índices de inflação e segurança alimentar. E quanto à falta de indicações de nomes para os cargos nas superintendências regionais?O fato de ter sido iniciado um novo mandato não significa que todos os gestores tenham de ser substituídos imediatamente.Fala-se que a presidente devolveu processos de aquisição de terras para a reforma agrária que já estavam em sua fase final.Nós contingenciamos parte do orçamento do ministério, mas, como já disse, não contingenciamos recursos destinados à obtenção de terras. A presidente liberou todos os recursos financeiros. Não se pode esquecer nesta questão de que o governo vem tomando medidas para controlar a inflação e que o nosso orçamento também vai sendo monitorado dentro de um contexto macroeconômico e de consolidação fiscal. Quando vamos obter terras, prestar assistência técnica ou tomar qualquer outra providências, temos de agir dentro das regras legais, do pressuposto da responsabilidade fiscal, do bom gasto, da transparência. São parâmetros fundamentais. O fato de ter um kit pronto não significa que haja condições e orçamento para obter a terra. Na administração pública, não é preciso atribuir à falta de execução de alguma atividade o juízo de preterimento. Menos ainda neste caso de obtenção de terra, em que não houve contingenciamento.Seus antecessores assumiram anunciando a ampliação da reforma agrária, com grandes metas de novos assentamentos. O senhor não fez isso e tem insistido na chamada inclusão produtiva. O que mudou de lá para cá?Mudou muita coisa. É um outro Brasil. Saímos de uma situação de depressão econômica para outra, de crescimento com distribuição de renda. Dos 28 milhões de pessoas que saíram da extrema pobreza no País e ingressaram na chamada classe média C, um grupo de 4,8 milhões está na área rural, de acordo com os números oficiais. Desses 4,8 milhões, 60% tiveram incremento da renda trabalho - são agricultores familiares e assentados, que melhoraram a renda. Como? Utilizando programas de melhoria da produção, de comercialização, de apoio à agricultura familiar. Há uma nova dinâmica de mercado, uma nova dinâmica na produção de alimentos. Das 900 mil famílias assentadas no Brasil, 600 mil foram assentadas no governo Lula. Essa é a nova realidade objetiva e nós temos de fazer a gestão pública de acordo com ela.A reforma agrária continua sendo uma prioridade de governo?Sim. Para nós a reforma é prioritária, é de interesse nacional. Ela serve a quem precisa morar e trabalhar na terra, mas também serve à Nação, ao País. Minha visão é a de gestor público, de ministro de Estado. Quem tem acesso à terra precisa produzir, precisa ter produtividade, integrar-se ao mercado e comercializar seus produtos. Temos nitidez da importância de um produtor rural que produza alimentos, que tenha paz, renda, capacidade de consumir bens e serviços para garantir qualidade de vida à sua família. E que seu produto, os alimentos, garantam que a inflação e a qualidade de vida de quem vive na cidade sejam positivamente impactados.Para os movimentos de reforma agrária, o governo dá muita atenção ao agronegócio. Isso prejudicaria a reforma agrária, porque, de acordo com essa visão, o agronegócio se opõe à agricultura familiar e à redistribuição de terras. Como vê isso?Para o governo, o que importa é uma política pública de interesse nacional. A agricultura familiar garante 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e 33% da produção agrícola. Ocupa 24% da área produtiva rural, é responsável por 74% da mão de obra ocupada e garante cerca de 70% dos alimentos que os brasileiros consomem. Pela nossa leitura do Brasil contemporâneo, com a consolidação do mercado interno e o crescimento da demanda por alimentos, é preciso garantir que os assentados, as populações tradicionais que vivem do extrativismo, os agricultores familiares e outros setores dessa população rural consigam se inserir numa dinâmica de mercado mais intensa. Essa dicotomia entre agronegócio e agricultura familiar pode servir para diferentes atores políticos, sociais e econômicos. Mas o governo não trabalha com isso.

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