A história das escolas públicas de SP em risco

Levantamento feito pela USP encontrou acervo em mau estado em todas as 79 instituições visitadas

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Por Maria Rehder
Atualização:

Os livros de matrículas registram datas de 1898, os pianos foram importados pelo governo no início do século e as fotografias retratam o refinamento das primeiras escolas públicas fundadas no Estado de São Paulo. Essas são algumas das preciosidades encontradas em mau estado de conservação nos 79 antigos colégios visitados pelo Centro de Memória da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (CME/FE-USP). A inexistência de políticas públicas de preservação do acervo escolar leva diretores a ficarem de mãos atadas frente ao patrimônio por não receberem orientação para cuidar das peças ou nem sequer terem espaço para guardá-las. Como é o caso dos arquivos do início do século passado da Escola Estadual Pereira Barreto - antiga Escolas Reunidas da Lapa, que acaba de completar 100 anos - hoje guardados em um porão úmido. Desde o início do ano, com o aval da Secretaria Estadual de Educação e financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o CME iniciou um mapeamento do acervo das primeiras escolas públicas de São Paulo. Serão visitadas 215 unidades em todo o Estado até o fim de 2009 - o prazo ainda é prorrogável por mais dois anos. O objetivo do projeto é fazer um diagnóstico da situação e, ao lado da Secretaria Estadual de Educação, criar meios de preservação dessa memória. Só o Caetano de Campos, primeiro colégio do Estado de São Paulo - que hoje abriga a Secretaria de Educação -, não está na lista de visitas porque já tem ações voltadas para a preservação de seu acervo. Dentre as conseqüências da inexistência da política pública que ficaram evidentes nas visitas dos pesquisadores da USP está a perda de parte do acervo dessas instituições. As primeiras carteiras escolares da Escola Normal de Piracicaba - fundada em 1911 e atual Escola Estadual Sud Menuci - decoram um bar do município. Isso porque muitas escolas ao longo dos anos tiveram de se desfazer dos móveis antigos para receber os novos, enviados pelo governo. "O dono do bar comprou o mobiliário de um ferro-velho. O mesmo aconteceu com os móveis escolares encontrados em um sebo em São Carlos", comenta a pesquisadora do CME Iomar Zaia. A Secretaria Estadual de Educação reconheceu no início do ano a ausência de políticas públicas para a preservação que abrangessem todas as escolas e iniciou um processo de busca de parcerias. Segundo Maria Salles, coordenadora do Centro de Referência Mário Covas - órgão ligado à pasta que atua na preservação do patrimônio escolar -, o primeiro passo é fazer o diagnóstico, por meio de parcerias como a feita com a USP, para depois apoiar a direção dos colégios. No próximo ano, a secretaria pretende colocar em prática o projeto de digitalização do acervo de papel, além do registro das peças encontradas nas escolas. "Estamos abertos a parcerias. A preservação tem de ser descentralizada. Conforme formos recebendo os diagnósticos das escolas visitadas, pretendemos incentivar a criação de centros de memórias e a capacitação dos professores e diretores para que mantenham esse acervo aberto." O professor do curso de Conservação e Restauro de Bens Culturais Móveis e Integrados da PUC-SP Júlio Moraes aponta a criação de centros de memórias como o ideal para trabalhar educação patrimonial. Diários antigos guardados em porões e móveis nos entulhos de obras nas escolas foram cenas presenciadas pelo professor ao longo dos 22 anos de trabalho com restauro. "Já pude ver valiosos tesouros de memória nos porões ou descartados", conta.

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