"A pessoa cometeu um erro, eu afasto", diz Lula

Segundo o presidente, não interessava a ele a divulgação de um dossiê contra os tucanos

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Por Agencia Estado
Atualização:

Demonstrando-se irritado e pouco à vontade, o candidato a reeleição à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, disse, na manhã desta quinta-feira, que em casos como o episódio de envolvimento de petistas e funcionários da presidência na tentativa de compra de um dossiê contra os tucanos, o papel do presidente da República é afastar pessoas. "Eu não posso julgar, eu não posso prender", disse Lula, em entrevista ao programa Bom Dia Brasil, da TV Globo. Durante o programa, o candidato disse ainda que quem tentou ajudar, não ajudou. Sobre os afastamentos, Lula considerou serem necessários para a reta final de sua campanha. "A pessoa cometeu um erro, qualquer que seja ele, pequeno ou grande, eu afasto ele (sic). A partir daí é o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça que vão tomar conta da situação. Não é o presidente da República. Até porque não é papel do presidente da República fazer julgamento", afirmou. "Quando eu afasto um companheiro como Ricardo Berzoini (da coordenação da campanha eleitoral), não é porque acho que ele tem culpa ou está envolvido. É porque eu não posso, faltando dez dias de campanha ter um coordenador que vai passar 10 dias respondendo pelo dossiê. Eu tenho que colocar alguém que coordena a campanha, que faça minha campanha. Por isso chamei o companheiro Marco Aurélio", disse, referindo-se ao seu assessor para assuntos internacionais, que assumiu a coordenação. Ricardo Berzoini foi afastado na quarta-feira da coordenação da campanha à reeleição. Berzoini admitiu que tinha conhecimento de uma reunião entre um integrante da campanha de reeleição do presidente Lula - Oswaldo Bargas, responsável pelo setor de Trabalho e Emprego do programa de governo de Lula e ex-secretário do Ministério do Trabalho - e a revista Época. Para Lula é grave o envolvimento de pessoas de seu governo nessa questão. "É grave, lógico que é grave. O fato da pessoa fazer a investigação da vida dos outros, e sobretudo pagar. Você tem que partir do seguinte pressuposto: quando alguém oferecer uma maldade e pede por essa maldade dinheiro, essa pessoa não merece confiança. Esse é o princípio básico de quem tem que agir com honestidade, sobretudo de alguém, que participa de uma campanha como a minha", disse. Segundo Lula, as pessoas envolvidas nesse episódio, ao receberem a proposta de compra do dossiê, deveriam ter denunciado como ele fez, no dossiê das Ilhas Cayman para não prejudicar o segundo turno da campanha de Mário Covas ao governo de São Paulo. "Eu fiz questão de entregar para o Márcio Thomaz Bastos que chamou o candidato José Serra, que chamou o Mário Covas e entregou (o documento). Agora, se companheiros tiveram a ilusão de que estavam encontrando algo tão poderoso que poderia mudar o planeta terra, essas pessoas pagarão, porque eu quero saber quem é que deu dinheiro, se teve dinheiro, o que tem esse dossiê. Eu quero saber o que ele tem, por que ele valia tanto, por que tantas pessoas se envolveram numa coisa que para mim não tem nenhum sentido. Esse dossiê, divulgado ou não, não me ajuda em um milímetro na campanha eleitoral." Polícia Federal Lula reagiu com irritação à pergunta sobre a atuação da Polícia Federal no episódio do dossiê. A PF de Cuiabá denunciou o dossiê, mas a PF de São Paulo se recusou a mostrar o dinheiro encontrado com petistas para a compra dos documentos. Ao ser questionado sobre a diferença de tratamento, Lula disse que a pergunta deve ser feita ao delegado e não a ele. "Como é que eu vou saber por que o delegado procedeu assim ou não? Não posso saber. Eu penso que o delegado tem que responder à sociedade brasileira não apenas a questão do dinheiro, da origem, para que (era destinado) esse dinheiro, o conteúdo desse dossiê, porque é preciso que a sociedade saiba tudo", disse. "A mim o que interessa é a mais absoluta verdade", acrescentou. "Se tem uma coisa que as pessoas, mesmo que discordem politicamente de mim, sabem, é que o meu comportamento na política é impecável, não por uma eleição, por todas que eu participei, em situações, inclusive, muito desfavoráveis, em que eu tive comportamento ético, porque eu respeito as pessoas", afirmou. Lula disse que, se soubesse, diria a origem do dinheiro (R$ 1,7 milhão) para a compra do dossiê que poderia comprometer candidatos tucanos. "Com todo carinho, eu lhe diria", disse Lula. Ao ser questionado sobre a situação do PT, que há um ano estava endividado e hoje dispõe de recursos suficientes para a campanha, Lula disse que não gosta de insinuações. "O que posso lhe dizer é que minha campanha está cumprindo exatamente com aquilo que nós assinamos de gasto de campanha". "Eu não gosto de insinuações nem para os meus adversários e muito menos para mim", ressaltou. Lula acrescentou que espera que a Polícia faça um julgamento o mais rápido possível sobre o episódio. "Não esperem de mim que eu execre alguém antes de ele ser julgado da forma como todo o ser humano tem de ser julgado nesse país". E repetiu:" o que eu posso garantir é que se alguém queria fazer um dossiê para ajudar o PT na verdade não ajuda. Mexer com bandido não dá certo em lugar nenhum do mundo". Mercadante O candidato a reeleição à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva disse que duvida e coloca "a mão no fogo" se o candidato ao governo de São Paulo pelo PT, Aloizio Mercadante, teria concordado com a compra de um dossiê para comprometer a candidatura do tucano José Serra. "Duvido que ele concordasse", reafirmou. "Agora, meu caro, um cidadão está lá trabalhando, alguém fala: olha tem uma notícia que pode abalar o mundo. Então a pessoa deve ter pensado: eu vou descobrir ouro puro e vou ser famoso. Quebrou a cara! Quebrou a cara, porque quando o bandido tenta te procurar para alguma coisa, você tem que desconfiar do bandido", afirmou. Lixo debaixo do tapete O candidato a reeleição à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva disse que apesar das denúncias de corrupção, o seu governo "não joga o lixo debaixo do tapete". "Houve a concretização daquele denúncia, nós afastamos e investigamos a pessoa. Por isso nós reequipamos a Polícia Federal, preparamos melhor a inteligência da Polícia Federal, contratamos mais gente. Por isso o Ministério Público tem independência como jamais teve na história do Brasil para que possa investigar tudo o que acontecer", disse Lula. "E é bom que seja assim, porque isso que aconteceu com esses meninos, hoje, pode acontecer com qualquer outra pessoa amanhã que seja acusada. Alguns obviamente serão inocentados, porque no Brasil nós precisamos ter em conta que não é pelo fato de sair a cara do cidadão no jornal, que ele já é culpado. Às vezes gostariam que fosse assim, mas graças a Deus nós temos uma nação republicana e a gente tem procedimentos que envolvem várias instâncias do Poder Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal e aí você condena as pessoas", afirmou. Jogo eleitoral Lula negou que tenha dito em Nova York, nesta semana, que havia interesse da oposição em "melar" o jogo eleitoral, com o episódio do dossiê para comprometer candidatos tucanos. "Eu não disse isso. Eu apenas afirmei o seguinte: a quem interessa melar o processo eleitoral", afirmou Lula, em entrevista ao programa Bom Dia Brasil, da TV Globo. "Porque a mim não interessava. Como é que um candidato que tem 50% de votos já algum tempo, um voto que está praticamente fixado, 46 espontâneo; como é que um candidato que está prestes, com muita possibilidade de ganhar as eleições, que o meu adversário não está fazendo com que ocorra nenhum risco, qual é o interesse meu e da minha coordenação de fazer isso?", questionou. Para o presidente o que aconteceu, no episódio do dossiê, "foi uma coisa imoral neste país para a campanha política". Crescimento O candidato a reeleição à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, disse que o Brasil, "desde a Proclamação da República", não viveu sequer um momento com a combinação de fatores positivos na economia como está vivendo agora. A reação do candidato foi em resposta à pergunta sobre o aumento da carga tributária e o excesso de gastos públicos. "As nossas exportações continuam crescendo, estamos batendo um recorde de exportações, vão ser 34 bilhões de dólares de exportações este ano, as importações estão aumentando, o salário está crescendo, a indústria está crescendo, obviamente que pode crescer um pouco mais, poderia ser um pouco menos, mas está crescendo. Você não via isso há 30 anos, está vendo agora". "Você sabe que para a gente poder construir uma casa tem que fazer um alicerce. Se não fizer o alicerce, cai, como caíram todos os planos mágicos neste país. Nós não fazemos mágica. Resolvemos fazer política com seriedade". Lula disse que quando o governo aumentou o Cofins foi a pedido das empresas brasileiras para equalizar os preços com os produtos importados. Lembrou também o ajuste da tabela do imposto de renda da pessoa física e das políticas de desoneração, na cesta básica e na construção civil. "Foram mais de R$ 20 bilhões em desoneração e vamos continuar no processo. Agora, toda vez que a receita se aperfeiçoar e as pessoas pagarem corretamente e as empresas ganharem dinheiro nós vamos ganhar mais. É importante lembrar que houve ganho das empresas, dos bancos, dos salários e portanto a gente arrecada mais". Agricultura O candidato a reeleição disse que a crise na agricultura, durante o seu governo, se deve às intempéries "que nós não controlamos". Lula ressaltou, porém, que o financiamento da agricultura este ano "foi o maior da história", de R$ 60 bilhões. Ao ser lembrado da insatisfação dos produtores com o câmbio, Lula reagiu: "obviamente que no Brasil é uma coisa engraçada, quem compra quer um câmbio barato, quem vende quer um câmbio caro, ou seja, o câmbio é flutuante e vai flutuar de acordo com a oscilação do próprio mercado", afirmou. "O que nós precisamos ter em conta é que a agricultura brasileira é cíclica, e no mundo inteiro. Muitas vezes o preço cai, porque nós estamos com uma superprodução no mundo. Nós não estamos com problemas no café, estamos? Nós não estamos com problema no suco de laranja, estamos? Nós não estamos com problemas em vários produtos que produzimos neste país. Agora, nós temos problemas em alguns, porque houve excesso de produção, porque houve seca, porque houve praga, e quando houve, o governo brasileiro socorreu", afirmou. "A pergunta que eu faço é o seguinte: por que não se criou o seguro agrícola há 40 anos atrás. Nós criamos agora, para não ficarmos vítimas das intempéries", disse, demonstrando certa irritação. Bolívia Lula disse que o comportamento político de alguns ministros da Bolívia não condiz com a mesa de negociação entre os dois países sobre a questão do gás e derivados de petróleo. "O meu ministro de Minas e Energia, o meu ministro das Relações Exteriores e o presidente da Petrobrás têm feito algumas reuniões com a direção do governo boliviano, e a história que a gente vê na mesa é uma e na imprensa é outra", afirmou. "Eu confio que a Bolívia tem a exata noção da importância do Brasil para a Bolívia, como o Brasil tem a exata noção do que significa o gás boliviano para o Brasil", ressaltou Lula. Ele disse que, pessoalmente, gostaria que o Brasil não dependesse do gás boliviano. "Eu disse ao presidente Evo Morales: Evo, você não pode ficar com uma espada na cabeça do Brasil, porque você deu o gás, porque nós também podemos colocar uma espada na tua cabeça, porque nós compramos o teu gás. E se não vender para nós vai ser muito difícil vender para alguém" afirmou. "O que o presidente Evo tem me dito é que nós vamos chegar a um acordo e que nós vamos negociar. E eu acredito nisso", disse Lula, justificando que o presidente boliviano tem pouco tempo ainda no poder. Descontentamento O presidente, ao ser informado que tinha perdido seus 30 segundos finais de entrevista por ter se estendido na resposta, disse que só não usou os segundos finais porque pensou que ia discutir programa de governo "e terminei não discutindo programa de governo", protestou.

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