A ''única lândia de graça'' faz 40 anos

A Adalbertolândia, parque construído nos anos 60 em terreno privado, resiste sem cobrar nada dos visitantes, sob o olhar atento de seu criador

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Por Renato Machado
Atualização:

Adalberto Bueno atraiu olhares curiosos quando saiu de casa com suas ferramentas, atravessou a rua e começou a martelar uns pedaços de madeira em um outro terreno da família. Era final dos anos 1960. Em pouco tempo, surgiu uma gangorra e, com isso, ele já atingiu seu objetivo de evitar que as crianças do bairro Sumaré, na zona oeste da capital, brincassem na rua. Mas não parou por aí. O espaço ganhou um castelo, uma casa na árvore, um carrossel e outros brinquedos. Estava criada a Adalbertolândia, um parquinho artesanal que está completando 40 anos e, mesmo na era da tecnologia, continua atraindo as crianças. O publicitário aposentado e hoje professor de inglês Adalberto, de 82 anos, abre o parquinho todos os fins de semana e feriados. Embora uma placa na entrada informe se tratar da "Única Lândia de Graça", ele conta que os pais sempre o abordam e perguntam se precisam pagar alguma coisa. "Ninguém acredita que existe um parquinho em terreno particular e aberto para todo mundo. Tem gente que chega pra mim e pergunta ?qual é a pegadinha??", diz com bom humor. Além de abrir para as crianças, ele próprio fica praticamente o tempo todo no parquinho limpando, podando as plantas e fazendo melhorias na estrutura. Quando não está lá, fica na garagem de sua casa, onde montou uma oficina para criar brinquedos e arrumar os demais. "Minha mulher briga comigo, porque eu fico mais tempo no parquinho do que em casa", brinca. Verita, no entanto, foi também uma das que mais trabalharam no local. Localizado em um ponto valorizado do Sumaré - na Rua Professor Paulino Longo -, o terreno de 300 metros quadrados onde está a Adalbertolândia atraiu o interesse de várias pessoas. Adalberto já recebeu várias propostas para vender a área. Mesmo sem lucrar com o terreno e só seguir pagando impostos, ele negou todas. "Eu não vou falar os valores, mas houve propostas que quase me derrubaram para trás", brinca. Em 40 anos, o parquinho passou por diversas mudanças. Antes o local ficava sempre aberto, mas muitos mendigos começaram a dormir nos brinquedos e, por isso, Adalberto decidiu erguer muros ao redor e colocar um portão. Muitos brinquedos também foram trocados por outros mais elaborados. Atualmente, há uma casa montada na árvore, carrossel, balanços, escorregadores, jogo de amarelinha. Uma das atividades preferidas das crianças é a "trilha na floresta". Como o terreno é desnivelado e tem 61 espécies de árvores e plantas, Adalberto colocou placas criando caminhos por entre as folhas. "Era a melhor parte subir nas árvores e andar na floresta", diz Juliana Butenas, de 10 anos. No sábado passado, ela pediu para os pais a levarem novamente à Adalbertolândia, onde costumava brincar quando mais nova. O local também traz recordações para o pai, o engenheiro Marcelo Butenas, de 42, que também ia com os amigos ao parquinho. "Eu morava em Perdizes e naquela época os bairros eram sossegados, então as crianças podiam sair sozinhas", diz. Como era de se esperar, as gerações da família de Adalberto também se acostumaram a brincar no parquinho. Primeiro, o criador do local levava seus filhos, Marcos e Viviane, desde que eles tinham 4 anos. "Agora é meu netinho, Alexandre, que tem essa idade e eu perco horas com ele lá", diz. Adalberto, no início, anotava o nome de todas as crianças que frequentavam o parquinho, mas desistiu porque não conseguiu acompanhar o ritmo de visitantes. Ele estima que 5 mil crianças já estiveram ali. Em junho, a vizinhança promete realizar uma festa no local para comemorar o aniversário, chamando as diversas gerações do bairro que já se divertiram no local. "Mas, de todos, fui eu quem mais aproveitou o parquinho", diz.

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