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Ação contra líder abre crise na polícia

Transferência de presidente da Associação de Delegados para Decap leva diretor da Inteligência a pedir demissão

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Por Marcelo Godoy
Atualização:

Uma ação do governo contra o líder da greve dos policiais civis em São Paulo abriu uma crise na cúpula da Polícia Civil do Estado. O delegado Domingos de Paulo Neto, diretor do Departamento de Inteligência (Dipol), pediu demissão por não concordar com a ordem do secretário da Segurança Pública, Ronaldo Bretas Marzagão, de mandar embora do Dipol o presidente da Associação dos Delegados de Polícia, Sérgio Marcos Roque, que foi enviado ao Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap). A temperatura na Polícia Civil já estava alta desde que a Secretaria da Segurança tomou conhecimento da atitude de um delegado do 98º Distrito Policial, na zona sul de São Paulo, que se recusou a registrar um roubo e impediu que o escrivão o fizesse. A situação piorou quando Domingos procurou o delegado-geral Maurício Lemos Freire na manhã de ontem e comunicou sua decisão. Freire tentou demovê-lo, mas não conseguiu. Domingos reafirmou sua lealdade ao delegado-geral e à instituição e disse que não poderia compactuar com a ordem de transferir Roque. Domingos foi vítima de represália semelhante durante o governo de Luiz Antônio Fleury Filho (1991-1995). Foi o governador eleito Mário Covas que acabou com o ostracismo do delegado, entregando-lhe a chefia da Seccional de Santo Amaro. A partir de então, Domingos comandou o primeiro projeto de combate a homicídios na cidade. Em 2001, levou seus planos ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Ao criar o plano de combate a homicídios, Domingos se tornou um dos principais responsáveis pela redução de 70% desse crime na capital, a maior realização na segurança das administrações de Covas, de Geraldo Alckmin e de José Serra. Em 2007, assumiu o Dipol, prioridade da atual gestão. "O Domingos é um homem honrado e comprometido com a instituição. Sua saída é prova do estrago que a radicalização de alguns no governo e de outros entre nós pode causar à polícia", afirmou um delegado da cúpula da Polícia Civil. Ao deixar a sede da delegacia-geral, Domingos foi ao Dipol conversar com seus subordinados e informar a eles a decisão que havia tomado. Disse aos colegas que sempre teve uma conduta classista, em defesa dos interesses da instituição. Com a saída de Domingos, o governo nomeou para o Dipol o atual diretor da Corregedoria da Polícia Civil, Gaetano Vergine. O delegado Alberto Angerami, que dirigia o Departamento de Administração e Planejamento (DAP), assumiu a corregedoria. Para seu lugar no DAP foi a delegada Ana Paula Ramalho Soares, que se tornou a primeira mulher a fazer parte do Conselho da Polícia Civil. O conselho se reuniu ontem no Palácio dos Bandeirantes para discutir a crise, depois que Domingos decidiu se solidarizar com Roque. O governo alega que Roque não podia permanecer no Dipol, pois entre as suas funções está a de fazer o monitoramento da greve. Na sexta-feira passada, Roque disse ao Estado que os grevistas não iam "dar trégua ao governador José Serra" e usariam a "inteligência" para organizar protestos em solenidades em que Serra comparecesse no Estado. Com isso, a permanência do delegado no Dipol teria ficado insustentável. "E o governo só descobriu agora que o presidente de associação trabalhava no Dipol, um dia antes do protesto na Secretaria da Segurança Pública?", perguntou o delegado André Dahmer, diretor da associação. Com a transferência, Roque terá de pedir licença para continuar à frente da associação, pois não conseguirá acumular a titularidade de um distrito policial com a associação. Com isso, perderá a gratificação de localidade - menos R$ 1.500 em seu salário. O governo alega que havia reservado para Roque o distrito do Brooklin, o 96º DP. Caso o objetivo da transferência fosse puni-lo, Roque seria mandado para uma delegacia distante e não para a do bairro em que mora Marzagão. Os policiais civis em greve há oito dias querem 15% de reajuste em 2008, 12% em 2009 e 12% em 2010. O governo oferece reajuste do piso salarial de 38% e reajuste de 4,5% no salário-base, além de outras medidas de reestruturação das carreiras policiais. Os policiais deixaram de registrar boletins de ocorrência de crimes de menor gravidade. A Justiça mandou que 80% dos policiais continuem a trabalhar. O governo cortou o ponto dos grevistas e mandou a PM registrar os casos quando houver recusa dos delegado, o que já ocorreu em 548 casos.

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