Aerolíneas vende passagens a mais e prejudica centenas de brasileiros

Ministro culpa a empresa Marsans, que deixará de controlar a companhia, por praticar overbooking e pelos atrasos

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Por Ariel Palacios e BUENOS AIRES
Atualização:

Milhares de turistas argentinos - que iniciavam no fim de semana suas férias de inverno -, brasileiros, chilenos, mexicanos e europeus foram vítimas do caos que tomou conta dos dois aeroportos de Buenos Aires, o de Ezeiza (internacional) e o Aeroparque (vôos internos). Dezenas de aeronaves decolaram com atrasos de, em média, duas horas. Mas diversos vôos, entre eles alguns que levavam turistas brasileiros de volta para o Rio, partiram com atraso superior a 24 horas. Os maiores problemas foram apresentados pelos vôos das companhias Aerolíneas Argentinas e sua associada, a Austral, responsáveis por 83% dos vôos internos e por grande parte dos vôos internacionais - a Aerolíneas tem 52% da fatia do mercado de vôos internacionais da Argentina. O caos teria sido provocado por overbooking, já que a empresa espanhola Marsans, que até a semana passada era a única administradora da Aerolíneas, teria vendido um excesso de passagens, muito além de suas possibilidades de transporte. Ontem, 24 vôos da Aerolíneas e de outras companhias registravam atrasos para decolar de Ezeiza (incluindo cancelamentos), do quais 5 rumo ao Brasil. Por causa da confusão, 29 vôos estavam atrasados para aterrissar em Ezeiza, dos quais 10 vinham do Brasil. No Aeroparque, 14 vôos atrasaram para o pouso, enquanto outros 7 demoravam para decolar. Ao longo do dia de ontem, segundo diversas estimativas, entre 400 e 1 mil brasileiros esperaram por vôos atrasados. OVERBOOKING Na sexta-feira, um porta-voz da Aerolíneas alegou que os vôos estavam atrasados por problemas "radiotécnicos". A empresa sustentou que uma estação de rádio FM clandestina havia provocado os inconvenientes por "interferências de radiofreqüência", impedindo o tráfego aéreo. No sábado, o argumento continuava sendo o mesmo. Ontem, porém, a companhia aérea nem sequer forneceu explicações para as demoras. Os sindicatos de funcionários aeronáuticos, desde a sexta-feira, contradiziam o argumento da empresa e sustentavam que a Marsans havia vendido passagens em excesso (overbooking). A denúncia foi reforçada pelo ministro do Planejamento e Obras, Julio De Vido, que acusou a Marsans de emitir passagens - em valor equivalente a por US$ 140 milhões - sem ter uma frota com capacidade para atender os passageiros. "A empresa queria fazer dinheiro, mas não contava com condições de dar o serviço", disse De Vido. Segundo os sindicatos, a Marsans emitiu passagens como se todos os 67 aviões da empresa estivessem em pleno funcionamento. O problema, explicam, é que apenas 24 estão atualmente aptos para voar. O restante está passando por manutenção. Julio Alak, designado novo gerente-geral da Aerolíneas, anunciou que os vôos, especialmente os que partem dos aeroportos argentinos, serão normalizados "ao longo da semana". PROBLEMAS NA AVIAÇÃO Em Buenos Aires, a irritação tomava conta dos passageiros que esperavam uma definição sobre seus vôos. No entanto, a companhia, além de não explicar os atrasos, não fornecia refeições nem hotéis para os turistas que aguardavam. Ontem de manhã, em Ezeiza, os brasileiros se aglomeravam nos corredores do aeroporto. Um grupo de turistas que esperava desde o sábado de manhã para voltar ao Rio estava com a paciência no fim. Uma passageira, que havia despachado seus remédios na mala, passou mal, teve um início de convulsão e precisou ser atendida por médicos. Segundo relato de pessoas presentes, alguns turistas tentaram agredir funcionários da Aerolíneas, que se abrigaram atrás dos guichês. Ao longo de várias horas, os funcionários da empresa desapareceram. Esse não foi um problema isolado neste ano na aviação argentina. Viajar para o país se transformou em uma epopéia, mais ainda se o destino for o sul do país, para lugares como Ushuaia, Bariloche ou El Calafate. No início deste ano, o país foi assolado por uma seqüência de greves de pilotos e aeromoças e por forte neblina nos aeroportos de Buenos Aires, que acumulou milhares de turistas brasileiros nas salas de espera. Entre março e abril, os aeroportos foram atingidos pela fumaça das queimadas na área rural perto da capital. Em maio, foi a vez das cinzas do Vulcão Chaitén, que se espalharam pelo sul do país, interrompendo o trânsito aéreo. TRANSIÇÃO A Aerolíneas Argentinas, empresa estatal criada em 1950, foi privatizada em 1991 pelo governo do então presidente Carlos Menem. A companhia passou primeiro para as mãos da espanhola Iberia, uma estatal. Mas, em 2001, questões financeiras da Iberia levaram a empresa a repassar a Aerolíneas para o grupo privado espanhol Marsans. No entanto, sob essa administração, os problemas se agravaram. Nos últimos sete anos, a companhia viveu de greve em greve. Além disso, seu equipamento, envelhecido, não foi renovado. A Aerolíneas, no controle da Marsans, acumulou dívidas de US$ 890 milhões. Na semana passada, a companhia aérea iniciou seu processo de reestatização, que estará completo em 55 dias. Nesse período, a Marsans transferirá gradualmente a Aerolíneas para o Estado argentino. Esse período também servirá para que a Argentina e a Marsans definam o valor que o governo da presidente Cristina Kirchner pagará pelas ações da companhia.

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