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Anac vetou pouso sem reverso em dia de chuva

Piloto da TAM desconhecia regra de 2006 e diz que o que vale é o manual

Por Luciana Nunes Leal , João Domingos e BRASÍLIA
Atualização:

Deputados da CPI do Apagão Aéreo na Câmara exibiram ontem uma recomendação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que mostrava, em abril de 2006, a preocupação com a pista principal do Aeroporto de Congonhas nos dias de chuva. A orientação, de 5 de abril de 2006, indicava as medidas a serem tomadas pelos pilotos no caso de pista molhada. Entre elas, estava a necessidade de manter os dois reversos (equipamento acoplado à turbina do avião, que ajuda a reduzir a velocidade na hora do pouso) operantes. O Airbus A320 da TAM que bateu contra o prédio da TAM Express, matando 199 pessoas, tinha falha em um dos reversos, que estava travado. A TAM já havia afirmado que, com relação ao sistema do reverso, segue regras do fabricante do avião, a Airbus. A recomendação da Anac dizia que o piloto deveria "ter anti-skid, auto-brake (se instalado), todos os reversores de empuxo". A mesma recomendação dizia que, no caso de "empoçamento" ou "pista alagada", seria necessária a suspensão das operações. Anti-skid e auto-brake são dois sistemas hidráulicos de freio das aeronaves. O primeiro evita que o avião derrape e o segundo faz o avião parar de forma paulatina e automática. "Não temos nenhuma informação de que essas recomendações foram revogadas. No dia do acidente, a pista estava molhada. Portanto, não poderia haver pouso de aeronaves com reverso travado", disse o relator da CPI, Marco Maia (PT-RS), que leu a orientação durante o depoimento do piloto da TAM José Eduardo Batalha Brosco. No dia 16 de julho, Brosco pilotou o vôo Belo Horizonte-Congonhas, com o mesmo Airbus A320 que se acidentou no dia seguinte. Brosco relatou ter passado "um susto" ao pousar na pista principal de Congonhas, por causa da dificuldade para frear. O comandante disse à CPI que não tinha conhecimento da recomendação da Anac. E, em defesa da TAM, disse que a agência reguladora não poderia fazer recomendações que contrariassem as normas da fabricante do avião. "A Anac não pode exigir o que o fabricante atesta como operação normal", disse o piloto. A Airbus diz que o avião pode funcionar normalmente sem um dos reversos. Brosco disse aos deputados que, no dia 16 de julho, a pista principal de Congonhas "parecia um vidro" de tão "escorregadia". Afirmou também que a pista ficou mais escorregadia depois de reaberta, em junho deste ano, ao final de uma obra que durou dois meses. O piloto disse que ficou "abalado" com a dificuldade de pousar na véspera do acidente e até enviou por e-mail um informe sobre o problema com a pista ao setor de segurança da TAM, no fim da tarde do dia 16. Os deputados da CPI identificaram, na lista de checagens mecânicas feitas no Airbus A320 no dia do acidente, dois boletins em que os mecânicos recomendam observação em equipamentos do avião. Os deputados pedirão mais informações à TAM para saber que tipo de falha foi detectada e a gravidade dos problemas. CAIXA-PRETA A CPI do Apagão Aéreo decidiu ouvir na manhã de hoje, em sessão secreta, o áudio da caixa-preta de voz que registrou os últimos diálogos dos pilotos do Airbus A320 da TAM. Os deputados prometeram divulgar o conteúdo das gravações, mas muitos pediram que fossem mantidos sob sigilo os registros de desespero e pavor, em respeito às famílias dos 199 mortos. Às 14 horas de ontem, o assessor parlamentar da Aeronáutica, brigadeiro Átila Maia, entregou o conteúdo das caixas-pretas do Airbus, sem esconder a contrariedade por repassar informações confidenciais aos deputados. "Vocês vão receber um filme de terror. O que vão fazer com isso?", indagou. Ele ressalvou que não ouvira os diálogos dos pilotos e se referia à maioria das gravações em casos de acidentes trágicos. Disse que muitas vezes os passageiros percebem a gravidade do problema e as caixas-pretas registram gritos de pavor.

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