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Análise: A Igreja sob tensão

Os progressistas procuravam retomar uma imagem quase disruptiva de Igreja dos pobres, recuperada da segunda metade do século 20. Os conservadores, barrar assustadora maré reformista, que parece ter se estabelecido com o papa Francisco

Por Francisco Borba Ribeiro Neto 
Atualização:

Para muitos, o Sínodo para a Amazônia foi menos uma reflexão pastoral católica e mais um grande embate ideológico. A direita procurava afirmar a supremacia do modelo capitalista atual. A esquerda, a necessidade de um desenvolvimento alternativo, ecológico e inclusivo. 

Os progressistas procuravam retomar uma imagem quase disruptiva de Igreja dos pobres, recuperada da segunda metade do século 20. Os conservadores, barrar assustadora maré reformista, que parece ter se estabelecido com o papa Francisco. 

O documento final do sínodo reafirma o compromisso social e ecológico da Igreja na Amazônia Foto: Vincenzo PINTO / AFP

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Quando se discutia a relação entre soberania nacional e ação da Igreja, o debate real era entre os interesses da mineração e do agronegócio tradicionais e as práticas alternativas apoiadas pelo terceiro setor. Quando se discutia a ordenação de homens casados na região, o tema de fundo era o casamento de padres ordenados no resto do mundo... E assim por diante. 

O Instrumentum Laboris, texto base para as discussões, acabou estimulando a tensão. Seu conteúdo estava carregado de propostas e abordagens polêmicas, justas ou injustas – não cabe aqui analisar –, quase como que testando até onde a Igreja Católica poderia ir no pontificado atual.

Nesse contexto, o perigo é que os desdobramentos deste sínodo fiquem presos a uns poucos pontos polêmicos e não às respostas integrais, como aconteceu naquele sobre a família, cuja repercussão parece se reduzir a um debate estéril sobre dar ou não a comunhão aos casados em segunda união – um detalhe importante, mas pequeno em relação ao desafio de apoiar a família.

O documento final do sínodo reafirma o compromisso social e ecológico da Igreja na Amazônia, abrindo espaço para novas ações pastorais. Contudo, as reflexões mostraram que não basta dizer “o que fazer”, mas é necessário saber “como fazer”. Por exemplo, não basta querer ordenar indígenas casados, o problema é como capacitá-los e apoiá-los em suas comunidades distantes. Não basta querer uma evangelização inculturada, o problema é como fazê-la quando nossa sociedade sufoca as culturas indígenas.*COORDENADOR DO NÚCLEO FÉ E CULTURA DA PUC-SP

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