Por que alguns moradores em situação de rua resistem a ir para abrigos? Leia análise

Normas rígidas e condição das estruturas são alguns dos fatores que explicam a rejeição pelo acolhimento, explica o pesquisador Diogo Jordão. Políticas necessitam de aperfeiçoamento, destaca o especialista

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Por Diogo Jordão
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Geralmente, a resistência em aceitar os serviços de acolhimento institucional está ligada às rígidas normas e estruturas desses espaços, que tiram a autonomia do indivíduo. Aspectos básicos da vida passam a ser controlados pela instituição, como o horário de ir à rua, comer, dormir e tomar banho. Para quem passou anos na rua, é muito difícil entrar nessa lógica. Eles sempre falam da “liberdade” que a rua dá, em oposição ao abrigo. Ao entrar no equipamento há uma mudança brusca nessa condição, e muitos não conseguem permanecer. O acolhimento é visto como controle e punição.

Prefeitura de SãoPaulo iniciou na quarta feira, 28, o 'Plano de Contingência para Situações de Baixas Temperaturas 2021', cujo objetivo é proteger a população de rua do frio Foto: Alex Silva/Estadão

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Em muitos casos, o atraso de alguns minutos para retornar ao abrigo é punido com a suspensão ou expulsão do abrigado. Muitos indivíduos trabalham após o horário limite de entrada ou saída do abrigo. Assim, devem escolher entre o trabalho e o acolhimento. Também há reclamações de ausência de espaços para guardar os equipamentos de trabalho, como os carrinhos e materiais de reciclagem.

A questão da dependência química também é relevante. Muitos deles possuem vícios, e como não podem usar entorpecentes nas dependências dos equipamentos, preferem permanecer na rua. Há uma carência de serviços de tratamento para a dependência química.

Outro aspecto é a proibição da entrada de animais, que em muitos casos são as únicas companhias dessas pessoas. Já quando elas possuem companheiros, são impedidos de ficarem juntos, pois as instituições geralmente são separadas por gênero. Casais e famílias com filhos preferem ficar na rua para não se separarem. Esse também é um problema para pessoas da comunidade LGBT+, que nem sempre se encaixam nessa divisão e sofrem uma dupla discriminação. A falta de privacidade, a insalubridade e a ausência de segurança também são queixas recorrentes. Enfim, apesar de constituírem medidas importantes, essas políticas necessitam de aperfeiçoamentos em sua execução, haja vista a existência de fatores que conflitam com as reais necessidades desse grupo populacional.

*É Mestre em Geografia pela Universidade Federal Fluminense/Campos dos Goytacazes e pesquisador sobre acolhimento de moradores em situação de rua

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