Aprovado no ITA vai à Justiça após exame toxicológico detectar canabidiol

Estudante alegou ter usado substância para controlar crise de ansiedade causada pelo próprio vestibular. Ministério da Saúde excluiu canabidiol da lista de substâncias entorpecentes em 2015, quando seu uso passou a ser legal no Brasil

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Por José Maria Tomazela
Atualização:

SOROCABA – Um candidato aprovado no vestibular do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos, foi considerado inapto após o exame toxicológico identificar o canabidiol, substância derivada da maconha, em seu organismo. O vestibular é um dos mais disputados do País – no ano passado, 11.412 candidatos disputaram 120 vagas – e Eduardo Zindani, de 20 anos, candidato a uma vaga no curso de engenharia espacial, foi aprovado nas duas etapas principais do concurso, mas não passou no exame toxicológico. Ele conseguiu uma liminar na Justiça para assistir às aulas até o julgamento da ação.

Zindani alegou ter usado canabidiol para controlar uma crise de ansiedade causada pelo próprio vestibular. O estudante disse que o uso foi recomendado pela sua mãe. Em 2015, o Ministério da Saúde excluiu o canabidiol da lista de substâncias entorpecentes e seu uso passou a ser legal no Brasil. A produção de medicamentos à base da substância é regulamentada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

No Brasil, remédios à base de canabidiol podem ser adquiridos por meio de importação mediante receita médica e aprovação da Anvisa. Foto: Anthony Bolante/Reuters

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Instituição federal subordinada ao Comando da Aeronáutica (Comaer), o ITA forma engenheiros civis e também aspirantes à carreira militar. O exame toxicológico passou a fazer parte da terceira etapa das provas, que trata da inspeção de saúde. Zindani foi considerado inapto no exame. A ação que moveu na Justiça Federal foi julgada improcedente, mas ele recorreu e conseguiu a liminar.

Conforme o advogado do estudante, Fernando Henrique de Almeida Souza, na decisão provisória, a Justiça entendeu que o exame toxicológico não detectou a substância THC, que é responsável pelo efeito psicotrópico da maconha. Destacou ainda que o canabidiol é adotado para fins terapêuticos, não causando dependência química, nem efeitos psicoativos, não sendo sequer catalogado como "doping" nos meios esportivos. Com a decisão, o ITA foi obrigado a aplicar um novo teste, excluindo o canabidiol, e ele foi aprovado.

Rigor

Dos candidatos aprovados nas duas fases iniciais do vestibular do ITA este ano, ao menos 12 tiveram de recorrer à Justiça depois de serem considerados inaptos na avaliação de saúde ou no exame toxicológico. Um dos casos é de um estudante de 1,80m de altura que foi considerado inapto para atividades físicas por pesar 120 quilos. Outro foi barrado por ser portador de asma.

 A maioria dos casos foi revertida na Justiça, devido ao rigor excessivo de interpretação. Entre eles, o de um candidato que teve sua autodeclaração de ser pardo rejeitada pela comissão organizadora. O ITA passou a adotar cotas raciais em 2018, após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) decidindo que a lei de cotas vale também para concursos das Forças Armadas.

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Cocaína

Uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3.a Região (TRF-3), com sede em São Paulo, publicada em julho deste ano, considerou "razoável e constitucional" o exame toxicológico previsto em edital de concurso das Forças Armadas, já que seus integrantes devem apresentar plena capacidade física e psíquica para permanecerem na ativa, em suas respectivas funções.

A decisão foi dada no caso do estudante aprovado no vestibular do ITA e que foi barrado no exame toxicológico por terem sido detectadas substâncias derivadas de cocaína em seu organismo. A Advocacia Geral da União (AGU), representando a Aeronáutica, argumentou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou no sentido de que o edital é a lei do concurso, cujas regras vinculam tanto a Administração quanto os candidatos.

O relator do caso, desembargador Souza Ribeiro, lembrou que o STF, em caso de repercussão geral, fixou a tese de que não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para realizar os critérios de seleção, salvo no caso de manifesta ilegalidade. O tribunal federal paulista manteve a desclassificação do candidato.