PUBLICIDADE

Arquitetura da resistência

Prédios que somam design e humanismo na visão de Cristiano Mascaro

Por Daniel Piza
Atualização:

Poucas pessoas teriam tantas condições para perceber os movimentos da arquitetura contemporânea de São Paulo como Cristiano Mascaro. Formado em Arquitetura e um dos melhores fotógrafos do Brasil, ele está acostumado a observar em detalhes esta cidade "muito eclética, que se destrói e se reconstrói" - e captar o que se destaca, muitas vezes sem alarde. Nos últimos anos, tem tido a satisfação de encontrar casas e prédios que resistem ao tempo, que somam design e humanismo a uma paisagem ainda marcada pelo convencional e pelo mau gosto, por um "neoclassicismo" datado e deslocado. Veja galeria de fotos Mascaro fotografou especialmente para o Estado algumas dessas obras que têm seduzido seu olhar. "Não são monumentos, que por definição são vistos o tempo todo, mas trabalhos que se caracterizam pela contemporaneidade", diz o pai de Teresa Mascaro, ela também arquiteta. Entre as obras que ele escolheu para retratar, estão públicas e privadas, residenciais e comerciais. Há uma igreja, a Catedral de Campo Limpo, de Maria do Carmo Vilariño e Luís Mauro Freire, e um conjunto habitacional em Heliópolis, de Héctor Vigliecca. Outros dois exemplos são a Estação Dom Bosco da CPTM, de João Walter Toscano, e o Terminal da Lapa, do escritório Núcleo de Arquitetura. Mascaro sempre busca o ângulo e a luz que lhe permitam mostrar as linhas do projeto e seu diálogo com o ambiente urbano. Foi justamente isso que ele registrou no caso do terminal. Um dos arquitetos que o assinam, Luciano Margotto (com Fábio Gonçalves e Sérgio Salles), diz que a preocupação era fazer uma obra que "não tirasse o protagonismo do espaço público" (a Praça Miguel Dellerba), mas tivesse uma arquitetura rica, que valoriza a luz natural, variações em torno da simetria e as árvores do pátio interno. Para Margotto, é cedo falar em uma "tendência" de valorizar uma arquitetura mais criativa em São Paulo, mas ele diz que há de fato muitos arquitetos de talento que surgiram recentemente. "Se houvesse mais espaço para eles, estaríamos bem melhor hoje." Já o uruguaio radicado no Brasil Héctor Vigliecca, que se queixa do desrespeito ao projeto original de sua obra, na qual mudaram posição, cor e acabamento, afirma, mesmo assim, que não tem dúvida de que a tendência existe. Graças ao acesso a publicações e internet, há também um público em busca dessa arquitetura. Vigliecca só faz a ressalva: "Em arquitetura como design, já melhoramos. Mas em arquitetura como cidade avançamos pouco. Não há debate sobre isso no Brasil. Veja o Plano Habitacional lançado nesta semana: ele fala em construir casas, não em pensar cidades." As fotos de Mascaro trazem ainda exemplos como uma escola estadual na zona norte, E.E. Pedro de Morais Victor, dos arquitetos Angelo Bucci e Alvaro Puntoni, e um predinho comercial do escritório Triptyque, na Vila Madalena, cujo exterior as plantas e os musgos vão modificar com o passar do tempo. Na escola, se destacam a iluminação e ventilação com "brise-soleils" e a posição central da quadra sob grandes painéis do grafiteiro Speto. "A obra pública não pode ser apenas uma questão de preço. O equipamento tem uma função de cidadania", diz Bucci, que conta que até mesmo jovens profissionais como calculistas de estrutura, antes raros, têm surgido agora. "Dos anos 90 para cá a arquitetura brasileira voltou a falar com o mundo."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.