Às pressas, TJ derruba decisão pró-fretados

Juíza considerou que medida viola constitucionalidade; presidente cassou liminar, que beneficiava 400 empresas

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Por Naiana Oscar
Atualização:

Repetindo os tumultos e disputas dos últimos dias nas ruas, a restrição dos fretados encerrou a semana com uma batalha de decisões judiciais. Em um intervalo de pouco menos de duas horas, os empresários do setor ganharam e perderam o direito de circular novamente por toda a cidade de São Paulo na segunda-feira. A juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública, concedeu por volta de 19h uma liminar anulando a portaria da Secretaria Municipal dos Transportes (SMT). Às 21h, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Roberto Antônio Vallim Bellocchi, cassou a liminar e manteve a restrição. "O TJ bateu o recorde do Cesar Cielo", ironizou Marcos Perez, advogado do Sindicato das Empresas de Transporte de Fretamento para Turismo (Transfretur), entidade que liderou a ação coletiva assinada por outros seis sindicatos. "É uma coisa inédita na história do judiciário. Certamente consequência do prestígio que o secretário (Alexandre de Moraes) tem no tribunal." Doutor em Direito do Estado, Moraes foi membro do Conselho Nacional de Justiça, secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo e promotor de Justiça. O desembargador argumentou que a suspensão da restrição poderia causar "prejuízos à comunidade". Em sua decisão, ele reitera que é do município a competência de legislar sobre transporte coletivo por ser assunto de interesse local. Desde segunda-feira, os fretados estão proibidos de circular em uma área de aproximadamente 70 km² dentro do centro expandido - ao longo da semana foram feitas mudanças no traçado original da área. O horário da restrição vai das 5 às 21 horas. A juíza considerou que a restrição viola o princípio de constitucionalidade, já que a medida foi adotada por meio de portaria e não por lei específica. "Ela (a juíza) entendeu que só uma lei poderia regular esse assunto. É um raciocínio elementar do direito, básico para qualquer estagiário", disse Perez. A juíza também afirmou em sua decisão que a restrição foi elaborada sem planejamento e por isso provocou transtornos . "Ademais, sem prévio planejamento dos locais adequados para a circulação dos ônibus e pontos de embarque e desembarque, a restrição ocasionou inúmeros transtornos não só aos usuários dos fretados, mas também à população, que foi afetada pela ineficiência do Poder Público", diz a liminar. Em entrevista antes da cassação, o diretor do Transfretur, Jorge Miguel dos Santos, já admitia que a liminar seria suspensa em breve. Mas ele considerou uma vitória mesmo assim e afirmou que vai recorrer até a última instância. "Isso mostra que o poder público não pode agir por hipóteses. Tem de analisar tudo antes de tomar uma decisão." Santos reforça que é a favor de que o setor seja regulamentado, mas defende que as regras sejam discutidas entre o poder público, as empresas e os passageiros. Cerca de 400 empresas no Estado seriam beneficiadas pela decisão. Juntas, elas atendem 250 mil pessoas. Após comemorar a primeira decisão da Justiça, os diretores da Associação dos Executivos da Baixada Santista (AEBS) se revoltaram com a que manteve a restrição. "Quem consegue um desembargador tarde da noite para cassar uma liminar?", questiona o presidente da entidade, Luiz Antônio Lara. Embora insatisfeito com a decisão da Justiça, ele afirma que vai manter o recurso impetrado ontem também na tentativa de anular a portaria. "Tendo em vista que o secretário é da área jurídica, a gente esperava dificuldades. Sentimos uma frustração, mas vamos continuar na batalha, porque acreditamos que nem todos do TJ pensam da mesma forma", diz. Na quarta-feira, o Ministério Público Estadual (MPE) já havia iniciado um inquérito civil para investigar os problemas provocados pela restrição aos fretados. A promotora de Habitação e Urbanismo Cláudia Beré acredita que a medida foi implementada de forma apressada, sobrecarregando o sistema de transporte público e prejudicando a população. A Prefeitura tem até a semana que vem para dar explicações e apresentar os estudos técnicos feitos pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). A liminar que beneficiava as empresas foi obtida após cinco dias de restrição, marcados por protestos de usuários e de empresários. Na terça-feira, a Prefeitura foi pressionada a liberar uma das principais avenidas afetadas pela proibição, a Luís Carlos Berrini, e a mudar de lugar alguns pontos de paradas. Em entrevista, o secretário negou que as mudanças fossem decorrência da falta de planejamento. "Essa é uma semana de ajustes", afirmou na ocasião.

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