´Autorizei a visita a Marcola. Era um direito que ele tinha´

Na terça-feira em que São Paulo ainda vivia sob o trauma do pânico que parou a cidade, o governador Claudio Lembo dava a batalha por encerrada

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Por Agencia Estado
Atualização:

O governador Claudio Lembo passou o dia no Palácio dos Bandeirantes. Apesar da ressaca que ainda deixava a cidade vazia, ele dava a batalha por encerrada e recebia mensagens de congratulações enviadas via fax por políticos. Falou por telefone com o governador de Minas, Aécio Neves, e com o ex-presidente Itamar Franco. À tarde, recebeu o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ). Nas conversas, o tom era de fim de jogo. No final da tarde, Lembo falou ao Estado sobre a guerra que abalou São Paulo. Houve acordo com o PCC? Repito: não houve. A pergunta é legítima, mas é extremamente ofensiva. O que aconteceu foi o seguinte: uma advogada procurou as nossas autoridades e disse que, de acordo com a lei, o detento em regime disciplinar diferenciado, ou seja, incomunicável, tem o direito de ser ouvido pelo seu advogado. Acho que isso foi no sábado, mas tenho dificuldade com dias... Perguntaram o que eu achava e eu disse que a legalidade tem que ser respeitada em todo esse conflito. Eu autorizei a visita dela. Ela foi levada em um avião da Polícia Militar até o presídio de Presidente Bernardes, falou com seu cliente, que é esse senhor Marcola, e retornou. Falou, porém, com uma condição: de que fosse na presença de funcionários da penitenciária. Isso é apenas o princípio da legalidade garantido até as últimas conseqüências. Não houve acordo nenhum. Depois dessa conversa, o número de rebeliões diminuiu. Tínhamos convicção absoluta de que íamos dominar os presídios de sábado para domingo, porque em alguns havia apenas a situação de rebeldia e não de rebelião. Tínhamos 12 presídios com grandes dificuldades, isso aconteceu. Agora, apontar essa coincidência é ingenuidade. Admito que isso faça parte da humanidade também, mas é ingenuidade. Que acordo é esse quando eles tiveram tantas vítimas, em que nós conseguimos recolher tantos bandidos? Grande acordo, esse! São Paulo parou por conta de uma onda de pânico que se alastrou em pouco mais de quatro horas. Faltou uma autoridade capaz de vir a público acalmar a população? As autoridades estiveram presente o dia todo em suas funções de trabalho. Elas não podiam, antes de um quadro de situação plena, expor posições para a sociedade. Seria absolutamente irresponsável. Quando elas tiveram total convicção e segurança, o comandante da Polícia Militar deu entrevistas, o secretário de Segurança Pública falou e o governador também se ofereceu para expor com clareza o que estava acontecendo. O pânico é próprio de momentos difíceis, quando a insegurança pessoal se torna coletiva. Mas nós estávamos numa luta contra a bandidagem e quando tivemos o controle expusemos tudo. Ninguém mentiu para a sociedade. O governo não pode falar coisas das quais ele não teve a convicção e segurança. Aí ele é um governo irresponsável. Isso quer dizer que até às 16 horas a situação estava mesmo fora de controle? Estávamos em conflito contra o crime. Quando nós conseguimos impor a lei, pudemos falar com a sociedade olhando nos olhos da câmera, com firmeza, porque tínhamos a consciência de que estávamos sendo reais. Fomos até os limites da comunicação, mas da comunicação responsável. Não utilizamos o episódio para fazer exposição de personalidades. Nós só aparecemos quando foi necessário e tínhamos segurança do que íamos dizer. Há um conflito no Brasil entre a demagogia e a realidade responsável. Nós tentamos ser absolutamente responsáveis. Mas boa parte do pânico foi fomentado por boatos e pela sensação de que a polícia estava atemorizada. Era comum ouvir que os bandidos mandam nas pessoas de bem. É um fenômeno muito interessante, o de ontem. Nós brasileiros não estamos acostumados com uma situação como essa. E foi justo em um dia em que não houve nada, era ainda a percepção do que houve na sexta e no sábado, isso deixou a todos nós brasileiros muito sensíveis. Agora, aquele pânico foi provocado por formas de comunicação excessivas, sem limites. Acontecimentos passados eram expostos no presente em alguns veículos. Não esqueça de dizer: alguns. O senhor fala da TV, que repetia imagens do dia anterior? Exatamente. É um assunto que eu gostaria de analisar na universidade no dia 1º de janeiro, quando já estiver fora do governo. Muito complexo. A sua família foi atingida pelo pânico que tomou São Paulo? Não sei, não perguntei. A minha grande família ontem era São Paulo. Nesses dias todos só pensei em São Paulo e na sua comunidade, e obviamente a minha família participa dela. Como foi seu dia, ontem? Eu estava muito convicto de que venceríamos, não tive nenhum momento de fragilidade. Quem trabalhou comigo sabe disso. Estou errado? (pergunta à duas assessoras). Tenho convicção na polícia de São Paulo. E ela foi para o combate. O senhor poderia explicar em detalhes porque não quis ajuda federal? Muito fácil: eu tive 20 homens da minha polícia mortos nos dois primeiros dias. E ainda assim eles lutavam, estavam com moral notável. E eu ia permitir que alguém ingressasse numa luta que era da minha Polícia? Não! Ninguém ia fazer com que a minha PM e a Polícia Civil ficassem numa condição de subalternidade. Ela foi forte e eu a apoiei. Foi só por isso. Eu não tinha porquê colocar pessoas que não têm conhecimento sobre São Paulo ingressando e atuando na cidade. São Paulo sabe de sua força. Não teve nenhum ato voluntarioso do gênero: "eu não quero porque não quero". Eu quero ajuda, sim, claro. Se precisar eu sou o primeiro a pedir. Pedi à Polícia Federal que nos ajudasse. Aliás, não é nem que eu pedi, ela já nos ajuda continuadamente. Há um vínculo estreito entre as duas polícias e ele ficou muito solidário nesses dias. Eu sou muito grato à Polícia Federal. Mas não precisava de tropas ostensivas, ostentação seria uma coisa ridícula nesse momento. O ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, deu uma entrevista muito sóbria depois de se reunir comigo e reconheceu que São Paulo tinha capacidade para vencer. Foi bom, até porque ele também é paulista. O comandante da PM de São Paulo, coronel Eliseu Ecler Teixeira Borges, afirmou que a força armada oferecida pelo governo federal não existe. É uma visão dele, e ele é um homem militar que tem uma grande experiência. Eu nunca vi a tal armada nacional. Esse episódio vai atrapalhar a campanha de Geraldo Alckmin para a Presidência? Isso vocês precisam perguntar aos generais do PSDB. Eu não consigo avaliar porque estou no trabalho.

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