Bateria, o coração de uma escola

Com viradas, paradinhas e recuos, os ritmistas fazem da trilha sonora dos desfiles um espetáculo de percussão

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Por Mônica Cardoso
Atualização:

Ele levanta um braço. Levanta os dois. Ergue o indicador. Gira as mãos. Os movimentos podem parecer códigos indecifráveis aos leigos, mas é essa comunicação gestual que permite ao mestre de bateria comandar os mais de 200 ritmistas da percussão de uma escola de samba, tal como um maestro rege uma orquestra. Alguns gestos são universais e adotados pelas escolas. A maioria, no entanto, faz parte de uma linguagem criada pelo mestre e combinada com os ritmistas durante os meses de ensaio. Com os movimentos das mãos, o mestre pode pedir para alguns instrumentos pararem de tocar, sinalizar o próximo movimento e até acelerar ou diminuir o passo da bateria de acordo com o relógio. "Os gestos variam de uma escola para outra. Às vezes, o mesmo gesto pode ter significados diferentes para as escolas", diz o mestre de bateria da Acadêmicos do Tucuruvi, André Luiz da Silva, de 28 anos, um dos mais jovens das escolas do carnaval paulistano e que comanda 230 ritmistas. Em geral, eles usam um apito para chamar a atenção para o próximo movimento. Alguns preferem usar uma vareta para ficar mais visíveis aos ritmistas. Mesmo assim, o mestre transmite as instruções aos diretores, que ficam perfilados entre os ritmistas, e assim a informação do próximo movimento pode ser recebida por todos. As paradinhas - também chamadas de breques ou bossas - são ensaiadas à exaustão nos ensaios. Surgida de um escorregão de um ritmista na bateria da escola carioca Mocidade Independente de Padre Miguel há exatos 50 anos, as paradinhas foram definitivamente incorporadas nas apresentações. Elas são criadas especialmente para o desfile para quebrar o ritmo e incrementar o samba. Algumas paradinhas inovam e trazem afoxé, funk e outros ritmos para a avenida. "A paradinha é um arranjo musical que valoriza o samba. É como se um instrumento perguntasse e outro respondesse. Neste ano, faremos duas paradinhas na avenida", conta Marcos Resende, o Sombra, de 39 anos, mestre da Mocidade Alegre, que dirige 240 ritmistas. COMO O CORAÇÃO Cada instrumento tem sua função dentro da bateria. O surdo de primeira é responsável pela marcação do ritmo e tem uma afinação mais alta do que os outros surdos. O surdo de segunda responde ao de primeira, com uma afinação mais grave. "É como se fossem o coração do corpo humano. Eles têm uma batida seca que garante a sustentação da bateria", compara mestre André Luiz. O surdo de terceira, por sua vez, tem uma batida mais "solta" e intermediária entre os dois. A caixa ou tarol dá apoio ao surdo de terceira e suingue ao samba. O repique, ou repinique, dá o ritmo e é tocado para introduzir as paradinhas. Já os instrumentos de naipe leve, cujo som é mais agudo, são chocalho, agogô, tamborim e cuíca. São eles que dão personalidade ao samba.

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