Berlim quer rio limpo até 2011

Com reservatórios submersos orçados em ? 1 milhão, projeto pretende despoluir o Spree

PUBLICIDADE

Por Rodrigo Brancatelli e BERLIM
Atualização:

Passeando pelas margens do Spree, com os prédios de vidro parecendo navios modernosos e as folhas secas das árvores pintando as águas com tons de inverno, é difícil imaginar que o principal rio de Berlim esteja de fato poluído. Se ao menos houvesse lixo jogado por ali, ou mesmo se o Spree tivesse um cheiro parecido com o do Tietê... mas nada, nenhum vestígio de sujeira. Nem sinal de garrafas de plástico boiando ou daquela espuma branca típica dos rios paulistanos. A poluição do Spree definitivamente não aparece nas fotos nem nos passeios pelas suas margens. Mas ela está presente, mesmo que abaixo da superfície - amostras colhidas no fim do ano passado indicam presença de 900 mil bactérias por 100 mililitros de água, 150 miligramas por litro de resíduos e 7 miligramas por litro de oxigênio dissolvido. Traduzindo esses números, não é possível nadar sem pegar uma doença infecciosa e também não há condições para a presença de cardumes de peixes. De paisagem idílica, esse Spree poluído e quase morto se transformou atualmente em uma das principais questões para a cidade que tenta a todo o custo parecer moderna, cosmopolita e ecologicamente correta. "Faz quatro anos que sonho em poder nadar no Spree sem me preocupar com uma disenteria", diz o engenheiro Ralf Steeg, principal articulador do programa que vai limpar o rio até 2011. "Ninguém se atreve a entrar nessa água desde 1930. Mas quando esse dia chegar novamente, poderemos mostrar como uma cidade industrializada pode ser também ecológica." A faxina do Spree começou em dezembro do ano passado e funciona como um grande símbolo do processo de revitalização que Berlim executa desde a década de 90 - quando berlinenses do leste e do oeste tiveram de sentar em uma mesma mesa e pensar soluções para reconstruir e unificar a sua cidade. Também serve como bandeira para um país que investiu quase R$ 500 bilhões no ano passado em tecnologias verdes, de turbinas eólicas e prédios com energia solar até carros elétricos e incineradores de lixo. Com financiamento inicial de ? 2 milhões do Ministério de Pesquisa e Tecnologia alemão, o projeto Spree 2011 pretende purificar o rio com uma ideia até que simples - grandes reservatórios submersos serão instalados para recolher toda a água suja que é jogada pelas tubulações de esgoto e purificá-la de imediato. "O grande problema da nossa cidade é que a água de descarga e a água da chuva são saneadas juntas. Quando chove muito, as tubulações não aguentam toda a demanda e o esgoto das casas é despejado in natura no rio", explica a geóloga Alexandra Beckstein, que faz parte do time de 20 especialistas do projeto Spree 2011. "Pelo menos três vezes por mês, o Spree recebe vários litros de esgoto sem tratamento. O que fizemos foi criar reservatórios que serão colocados dentro do Spree, nas saídas das tubulações. Elas terão capacidade de armazenar um milhão de litros dessa água suja e depois bombeá-los de volta para as estações de tratamento. Em uma segunda fase, esse esgoto será tratado dentro dos próprios reservatórios, rapidamente, limpando o rio em tempo real." COMEÇO Em janeiro foi inaugurado o primeiro desses reservatórios. Até o meio do ano serão três, e em 2011 as 14 tubulações que desembocam no Spree terão essa tecnologia. Sobre esses reservatórios serão construídas espécies de ilhas com infraestrutura turística, com jardins, bares e até atracadouro para pequenas embarcações que serão movidas por painéis solares. Essa simplicidade do projeto é justamente a sua principal inovação e trunfo. O custo do Spree 2011 também é digno de um parágrafo à parte. Cada reservatório custará ? 1 milhão, o equivalente a R$ 2,92 milhões. Matemática à parte, o programa de despoluição do Rio Tietê teve início em 1992 e já custou US$ 1,5 bilhão, ou quase R$ 3,45 bilhões. "Não é só uma questão de nadar no rio, mas também de melhorar a qualidade de vida de uma cidade", diz Ralf Steeg. "É isso que Berlim quer representar para as próximas gerações, um lugar que não só tenta lidar com seu passado mas também com seu futuro de forma sustentável." *O repórter viajou a convite do Ministério das Relações Exteriores alemão

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.