10 de outubro de 2019 | 13h27
Atualizado 11 de outubro de 2019 | 07h39
SÃO PAULO - O presidente Jair Bolsonaro informou ao Senado Federal que decidiu vetar, integralmente, o projeto de lei que obrigava hospitais das redes pública e privada a notificar casos suspeitos de violência contra a mulher à polícia em até 24 horas. O governo justificou o veto "por contrariedade ao interesse público".
No projeto, a deputada federal Renata Abreu (PTN-SP) afirmou que não há canal de comunicação entre hospitais e delegacias que mapeie as áreas com maior concentração de violência a mulher. Segundo a parlamentar, a mulher agredida, por medo, deixa de registrar boletim de ocorrência, mas procura um hospital por causa das lesões.
"E, muitas vezes, não há conhecimento das Secretarias de Justiça do ocorrido e tal estatística passa despercebida."
Atualmente, a legislação determina a notificação obrigatória de casos de violência contra a mulher atendida em serviços de saúde públicos e privados. Na justificativa enviada ao Senado, Bolsonaro afirmou que consultou os Ministérios da Saúde e da Mulher, Família e Direitos Humanos. Ambos se manifestaram a favor do veto integral.
"A proposta contraria o interesse público ao determinar a identificação da vítima, mesmo sem o seu consentimento e ainda que não haja risco de morte, mediante notificação compulsória para fora do sistema de saúde", afirmaram as pastas.
No dia 10 de outubro, é comemorado o Dia Nacional de Combate à Violência contra a Mulher.
"Isso vulnerabiliza ainda mais a mulher, tendo em vista que, nesses casos, o sigilo é fundamental para garantir o atendimento à saúde sem preocupações com futuras retaliações do agressor", disseram os ministérios.
A medida do presidente divide especialistas.
Para a advogada criminalista e ex-procuradora Luiza Nagib Eluf, o veto foi "um erro incompreensível e injustificável". Segundo ela, a lei contribuiria para o combate à violência contra a mulher, uma vez que poderia melhorar a qualidade das estatísticas e, consequentemente, as políticas públicas.
Conforme Luiza, a comunicação de casos suspeitos não significa mais riscos à vítima.
"Apenas estaria mostrando números. Ninguém vai publicar nome, RG ou endereço da vítima nem processar o suposto agressor", afirma.
Já a promotora Silvia Chakian, do Grupo de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Gevid), do Ministério Público de São Paulo (MPE-SP), afirma que "neste momento, o veto foi positivo". Para ela, antes de tornar obrigatória a notificação, é necessário debater melhor os possíveis efeitos colaterais.
"Há preocupação grande de que as mulheres acabem não procurando mais o sistema de saúde, com medo de que isso vá parar na delegacia", afirma.
Para ela, a lei não dava garantia de sigilo à vítima.
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11 de outubro de 2019 | 06h30
Atualizado 11 de outubro de 2019 | 12h02
SÃO PAULO - O presidente Jair Bolsonaro comunicou ao Senado Federal que decidiu vetar, integralmente, o projeto de lei que obrigava os hospitais das redes de saúde pública e privada a notificar casos suspeitos de violência contra a mulher à polícia em até 24 horas.
Bolsonaro veta obrigação de hospitais de notificar suspeitas de violência contra a mulher
No projeto, a deputada federal Renata Abreu (PTN-SP) afirmou que "não existe por parte dos órgãos governamentais qualquer canal de comunicação entre hospitais e delegacias que mapeie de forma significativa as áreas com maior concentração de violência à mulher".
Já o governo argumentou que a medida "vulnerabiliza ainda mais a mulher, tendo em vista que, nesses casos, o sigilo é fundamental para garantir o atendimento à saúde sem preocupações com futuras retaliações do agressor".
O Estado consultou duas especialistas, que divergem sobre o tema. Leia os posicionamentos e participe da enquete.
SIM
Para a advogada criminalista e ex-procuradora Luiza Nagib Eluf, o veto do presidente Jair Bolsonaro foi "um erro incompreensível e injustificável", que deveria ser derrubado pelo Congresso Nacional. Na visão dela, a lei contribuiria para o combate à violência contra a mulher, uma vez que poderia melhorar a qualidade das estatísticas, consequentemente, as políticas públicas voltadas ao tema.
"Historicamente, os casos de violência de gênero são subnotificados, esses registros seriam importantes para se avaliar a profundidade da tragédia no Brasil", diz. "Como vamos conseguir formular estratégias de governo ou tomar medidas sem dados ter acesso a dados adequados?"
Para Luiza, a comunicação obrigatória de casos suspeitos não significaria mais riscos à vítima.
"Apenas estaria mostrando números. Ninguém vai publicar o nome, RG ou endereço da vítima e nem processar o suposto agressor", afirma. "Todo tipo de doença hoje já é notificada pelos hospitais: dengue, zika, sarampo, aids... Por que não pode notificar espancamento?"
NÃO
A promotora Silvia Chakian, do Grupo de Enfrentamento a Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Gevid), do Ministério Público de São Paulo (MPE-SP), afirma que "neste momento" o veto do presidente Jair Bolsonaro "foi positivo". Para ela, antes de tornar obrigatória a notificação de casos suspeitos, é necessário debater melhor quais seriam os possíveis efeitos colaterais.
"Há preocupação grande de que as mulheres acabem não procurando mais o sistema de saúde, com medo de que isso vá parar na delegacia", afirma.
Nesses casos, segundo a especialista, não só a mulher deixaria de receber atendimento como também aumentaria as taxas de subnotificação de violência de gênero, que historicamente já são altas.
"Todos devem debater melhor o assunto e buscar estratégias que não provoquem desestímulo, aumento de subnotificação e revitimização", diz.
Na interpretação da promotora, a lei não dava, ainda, garantia de sigilo à vítima.
"Se fosse uma comunicação só para fins estatísticos, tudo bem. Mas a redação da lei, da forma como estava, não era deixava isso claro."
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