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Brasil fracassou na reforma da segurança, diz Anistia

Documento faz diversas críticas ao sistema carcerário do País e a abusos cometidos por policiais, como tortura, maus-tratos e homicídios

Por Agencia Estado
Atualização:

Autoridades federais e estaduais fracassaram na tentativa de reformar o sistema de segurança pública do País, diz o relatório anual da Anistia Internacional, divulgado em Londres nesta terça-feira. "Houve poucas iniciativas políticas na área dos direitos humanos, com várias propostas do governo federal ainda aguardando implementação e poucas, senão nenhuma, autoridades locais introduzindo as prometidas reformas na segurança pública", afirma o documento. O pesquisador Tim Cahill, que participou da elaboração do capítulo sobre o Brasil, diz que tanto o governo federal como os estaduais são responsáveis pela falta de avanços. Para Cahill, o governo federal teme se aproximar demais do discurso de defesa dos direitos humanos num período eleitoral e os estaduais dão respostas inadequadas às crises quando elas surgem. O documento traz diversas críticas ao sistema carcerário do País e a abusos cometidos por policiais, como tortura, maus-tratos e homicídios. "A impunidade continuou, e a ausência de informações publicadas sobre os casos julgados segundo a Lei de Tortura, de 1997, fez com que a verdadeira dimensão do problema continuasse a ser desconhecida", diz o relatório, que reconhece alguns avanços como "a campanha contra a tortura prometida pelo governo federal, lançada em dezembro." O documento cobre o período de janeiro a dezembro de 2005 e, portanto, exclui a recente onda de violência atribuída ao Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo. O relatório denuncia a superlotação carcerária, destacando a situação no centro de detenção preventiva da Polinter, no Rio de Janeiro que, em agosto, abrigava "1,5 mil detentos num espaço concebido para 250, com uma média de 90 homens numa cela de 3 x 4 metros". Apesar das críticas, o pesquisador da Anistia não acha que o Brasil seja uma exceção à tendência apontada no relatório de relativa melhora na questão dos direitos humanos. "Tirando o que aconteceu em São Paulo agora e no Rio de Janeiro no ano passado, existe um espaço maior para os direitos humanos", disse Cahill. Ainda assim, ele menciona o contraste entre a evolução dos casos do ex-ditador Augusto Pinochet, no Chile, e Alberto Fujimori, no Peru, com a absolvição do coronel Ubiratã Guimarães no processo sobre o massacre do Carandiru - a decisão saiu depois da conclusão do relatório. Para Cahill, a decisão é "chocante". Em um caso, ao falar da tortura de menores na Febem, a Anistia faz críticas diretas ao ex-governador Geraldo Alckmin. "Numa aparente tentativa de sabotar o trabalho dos grupos de defesa dos direitos humanos, o (então) governador Geraldo Alckmin acusou dois proeminentes ativistas dos direitos humanos - Conceição Paganele e Ariel Castro Alvez - de incitarem os motins." Segundo Cahill, os acontecimentos em São Paulo apenas mostram que o Brasil precisa de reformas não só no sistema carcerário, como em todo o sistema de Justiça Criminal, e reformas sociais. "De mil a 1,5 mil pessoas são presas por mês. Ninguém pode construir presídios com essa capacidade", disse Cahill. Otimismo Na introdução do relatório, a secretária-geral da Anistia Internacional, Irene Khan, diz que, de uma forma geral, os acontecimentos de 2005 dão esperança de uma melhora no respeito aos direitos humanos "depois de cinco anos de reação contra direitos humanos em nome do combate ao terrorismo". A secretária da Anistia cita ainda a queda no número de conflitos no mundo, graças a iniciativas na prevenção e administração de conflitos, e reformas na ONU como razões para otimismo. Apesar de sistemas judiciais "corruptos, tendenciosos e ineficientes", diz o texto, "a maré está começando a virar contra a impunidade em algumas partes do mundo". Outras iniciativas elogiadas são a adesão do México ao Tribunal Penal Internacional, tornando-se o 100º Estado a ratificar o Estatuto de Roma no TPI, apesar da oposição dos EUA, e a decisão de levar o caso do conflito de Darfur, no Sudão, ao Conselho de Segurança da ONU. Segundo a Anistia, a opinião pública encampou o discurso dos direitos humanos e passou a pressionar os governos, levando alguns deles a recuar em leis que desrespeitavam liberdades individuais. "O que é diferente sobre 2005 em relação a anos anteriores é que a disposição pública está mudando, graças ao trabalho dos que advogam pelos direitos humanos e de outros, o que está colocando os governos dos Estados Unidos e europeus na defensiva. As pessoas não estão mais dispostas a comprar o argumento falacioso de que reduzir a nossa liberdade vai aumentar a nossa segurança." Guantánamo A Anistia também cita o aumento da pressão para que os americanos fechem a prisão de Guantánamo, "o símbolo mais ostensivo do abuso do poder dos EUA". Ainda assim, a entidade lembra que os abusos continuam por parte dos Estados Unidos e de outros países. Países "como Egito, Jordânia e Iêmen", diz o relatório, continuam a prender, sem acusação ou julgamento justo, "com o apoio tácito dos EUA". Irene Khan também cobrou mais liderança da União Européia. "Eu fico decepcionada que a União Européia permaneça uma voz basicamente muda em direitos humanos", disse Irene. A UE, argumenta ela, tem de estar mais disposta a confrontar "os fracassos estarrecedores da Rússia em direitos humanos na Chechênia" e a resistir a pressões comerciais e manter o embargo de armas à China. include $_SERVER["DOCUMENT_ROOT"]."/ext/selos/bbc.inc"; ?>

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