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Caminhoneiros se dizem à deriva

Para driblar rodízio, eles dormem na estrada, tentam rotas alternativas ou recusam trabalho

Por Vitor Hugo Brandalise
Atualização:

Entre os caminhoneiros que circulam no Terminal de Cargas Fernão Dias, em São Paulo, três opções para se adaptar ao rodízio: dormem na estrada, utilizam rotas de fuga por bairros periféricos da capital, ou - último sacrifício - recusam o trabalho do dia, para evitar multas. "Ficamos à deriva. Se recebo um trabalho de manhã no dia do rodízio, não tem jeito de aceitar. Quando a entrega vem no meio da tarde, mesma coisa: se aceitar, com certeza fico na estrada na hora do rodízio", disse o autônomo Wilson Roberto de Oliveira, de 55 anos, 13 de estradas, ontem sentado o dia todo numa lanchonete do Terminal. Medidas contra o trânsito em SP e as alternativas de outras cidades Com caminhão de placa final 5 - proibido de circular nas Marginais e no anel viário das 7 às 10 horas e das 17 às 20 horas às quartas-feiras -, ontem foi dia de Oliveira ficar, como disse, "à deriva": recusou um frete pela manhã, recusou outro no meio da tarde. "De manhã, não poderia ir de nenhum jeito, porque a carga estava no Ipiranga e lá só podemos entrar de madrugada (por causa da restrição de caminhões)". Mas à tarde perdi um dinheirão", disse. Frustrado, Oliveira teve de recusar um carregamento de móveis para Aracaju (SE) - o valor do frete (segundo o caminhoneiro, "a salvação do mês"), seria de R$ 1.600. "Neguei porque estaria na Marginal bem na hora do rodízio. Hoje, vou voltar para casa sem nada", disse. "Vou fazer o quê? Hoje foi meu dia, amanhã será o de outro." A Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam) estima em 30% a queda no movimento de autônomos no Terminal após as restrições - de cerca de 600 por dia, para pouco mais de 400. "O mercado para os autônomos ficou realmente mais restrito", disse o presidente da Abcam, José da Fonseca Lopes. "Mas resta se adaptar. O setor empresarial do interior do Estado já organizou seus fretes para fugir do horário do rodízio ", disse. A multa para quem desrespeitar o rodízio é de R$ 85,13, mais perda de quatro pontos na carteira de habilitação. Na esteira da adaptação está Nilton Lopes Hilário, de 32 anos - agora, às quintas-feiras, seu dia de rodízio, acaba tendo de dormir na estrada. Como deixa Curitiba, toda quarta-feira, pontualmente às 23h30 em direção a Jundiaí, ele chegaria à Marginal do Pinheiros por volta das 9 horas, horário proibido para seu caminhão trafegar. "O jeito é parar no meio da viagem, em qualquer posto que aparecer e dormir por pelo menos três horas", disse. "Assim, pego a Marginal só depois das 10." Para não perder tempo parado na volta de Jundiaí a Curitiba, ele aprendeu, com colegas do Terminal, uma rota de fuga para escapar do rodízio: agora, em vez de voltar pela Anhangüera, ele vai pela Avenida Raimundo Pereira de Magalhães, até chegar a Guarulhos, na filial da transportadora em que trabalha. "Não é bom para caminhão passar por ali. Quando chega perto de Mairiporã, atrapalha o tráfego mesmo. Mas é a saída para não ficar mais tempo na beira da estrada."

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