CCJ deve analisar fim da liberdade provisória para hediondo

A Lei de Crimes Hediondos endurece os critérios de progressão de pena mas tem uma brecha: dá ao acusado a possibilidade de pedir liberdade provisória

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Por Agencia Estado
Atualização:

O presidente da subcomissão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que analisa projetos de lei sobre legislação penal e processual penal, deputado Neucimar Fraga (PR-ES,) anunciou nesta segunda-feira que pretende incluir entre as propostas prioritárias na área de segurança pública o fim da possibilidade de liberdade provisória para os acusados de crimes hediondos. A decisão decorre da nova Lei de Crimes Hediondos, que foi aprovada em março no Congresso Nacional e endurece os critérios de progressão de pena. Contudo, ela tem uma brecha que favorece o criminoso: foi retirada a proibição da concessão de liberdade provisória para acusados por esses crimes. O texto, aprovado na Câmara, no Senado e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dá ao acusado a possibilidade de pedir o benefício da liberdade provisória. Fraga se disse surpreendido com a mudança na Lei de Crimes Hediondos. "Temos de voltar com o fim da liberdade provisória", disse Fraga. "Temos de rever esse projeto para acabar com a liberdade provisória para quem pratica crime hediondo", defendeu o líder do DEM (ex-PFL), deputado Onyx Lorenzoni (RS). "Não leram direito" "Quem quiser mudar a lei é porque não leu o projeto quando ele foi aprovado no Congresso", reagiu o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), que relatou o projeto de lei que endureceu os critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos. Relator da subcomissão que trata dos projetos de segurança pública, o deputado Flávio Dino (PC do B-MA) explicou que a mudança na Lei de Crimes Hediondos "apenas transformou em lei o que já vinha sendo feito na prática". "A liberdade provisória para os acusados de crime hediondo já é uma prática normal dos tribunais e juízes. Nós apenas colocamos na lei o que os juízes já vinham fazendo", disse Flávio Dino. Cardozo disse que a possibilidade de concessão de liberdade provisória para os acusados de crime hediondo veio no projeto encaminhado pelo governo ao Congresso. "Isso foi feito porque há decisões judiciais em que foi considerado inconstitucional não se ter o benefício da liberdade provisória para acusado de crime hediondo", observou. "O que se fez foi apenas dar poder para que o juiz decida caso a caso sobre a liberdade provisória. Isso é feito para qualquer tipo de crime", completou o petista. "Na prática, a mudança só aumentou o poder do juiz", ponderou Sérgio Carneiro (PT-BA). "Qualquer condenado por crime hediondo não pode ter o benefício da liberdade provisória. É o caso de mudarmos a lei", defendeu o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA). Pela lei sancionada pelo presidente Lula, o acusado de crime hediondo tem o direito de esperar o julgamento em liberdade, caso preencha alguns requisitos, como não representar risco à sociedade. Mas, a concessão da liberdade provisória não é automática. Assim como nos crimes comuns, caberá ao juiz analisar caso a caso a concessão do benefício. STF não deve barrar pedidos O Supremo Tribunal Federal (STF) não deverá colocar obstáculos à nova lei. Eventuais ações contestando a norma serão julgadas pelo STF. Mas, numa primeira análise, integrantes do Supremo não encontraram problemas na lei. Eles afirmaram nesta segunda-feira que na prática criminosos acusados de envolvimento com crimes hediondos já podiam pedir a liberdade provisória. Segundo eles, a nova lei de crimes hediondos apenas explicitou uma garantia que já vem sendo reconhecida pelo Judiciário. Os ministros disseram que até condenados por crime hediondo têm conseguido esse benefício. "Se pode (liberdade provisória) após a condenação, pode antes também", comparou um dos ministros. OAB aprova As mudanças na lei de crime hediondos também agradaram o secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Alberto Zacharias Toron. "Se enaltece, se revigora e se fortalece o papel do juiz", afirmou Toron. Na opinião do advogado, a nova lei endureceu os critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos, mas exclui a proibição da concessão de liberdade provisória para acusados desses crimes. Segundo ele, a lei propicia que a prisão deixe de ser automática. Toron disse que, com a nova lei, o juiz terá de examinar e fundamentar, caso a caso, se o acusado tem ou não direito de ficar em liberdade. "A lei dá mais força à decisão do juiz. Não é o legislador quem vai dizer se todo mundo tem ou não que ficar preso, mas sim o juiz, ao examinar cada caso concreto", afirmou. Nada de retrocesso O ministro da Justiça, Tarso Genro, exibiu uma economia fora do comum ao comentar a mudança da Lei de Crime Hediondos. Questionado sobre a inclusão da liberdade provisória na lei, ele apenas negou que tivesse ocorrido algum tipo de retrocesso. O secretário Nacional de Justiça, Antônio Carlos Biscaia, tem a mesma avaliação. "As novas regras apenas reconhecem um entendimento que já está consolidado no Judiciário. Liberdade provisória para este tipo de crime não é nenhuma inovação", afirmou, logo depois de tomar posse do cargo de secretário. Para Biscaia, pessoas que se sentem atingidas pela violência imaginam ser possível um criminoso permanecer em regime fechado por tempo indeterminado. "Isso não é possível. Isso está em desacordo com princípios constitucionais", afirmou. O mesmo ocorre com a garantia de progressão da pena. Para ele, porém, o resultado obtido com a aprovação da lei é bastante adequado. "Antes da lei, o que prevalecia era a regra geral, da concessão do benefício a partir de um sexto da pena cumprida. Agora, tais benefícios somente são aplicados depois do cumprimento de dois quintos da pena", observou. O secretário disse, porém, ser contrário a uma outra regra, hoje estabelecida no País, de que prisão seja sempre considerado uma exceção. Ele defende que, uma vez condenado, o réu deveria recorrer da sentença preso e não em liberdade, como ocorre atualmente. "Mas esta é outra discussão. Em qualquer regime de execução penal, é preciso garantir a progressão da pena." Eugênia Lopes, Mariângela Gallucci e Lígia Formenti

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