CD grátis, celular e internet: as armas das ''popozudas''

Grupos de funk têm menor custo para donos de casas noturnas e fazem diversos shows em uma noite

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Por Bruno Paes Manso
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São 2h30 da manhã quando as bailarinas do grupo de funk carioca Gaiola das Popozudas começam a rebolar no palco do Cabral, clube gigante da zona leste de São Paulo onde cerca de 3 mil jovens se acotovelam para chegar perto das moças. Valesca Popozuda, a vocalista loira, com seu 1,2 m de quadril, inicia o segundo dos quatro shows programados para a noite gritando obscenidades. Pum-pum-pum. A voz já gasta da loira popozuda quase desaparece com a base ensurdecedora do funk, e ela grita ainda mais. O pancadão começa e o rastilho de pólvora se acende. Enquanto as dançarinas rebolam, agacham, levantam, quase sempre de costas para o público, jovens de 15 a 25 anos, homens e mulheres, espremem-se na frente do palco, disputando para ver quem consegue colocar o celular mais perto dos quadris das bailarinas. A vocalista e a dançarina capricham no rebolado e nos palavrões, para que imagens e sons sejam captados e, nos próximos dias, transformem-se em vídeos acessados por outros milhares de jovens na internet. Apenas um dos vídeos caseiros com músicas do grupo tem mais de 10 milhões de acessos. Na entrada da casa, antes de o show começar, discos promocionais são distribuídos de graça para a divulgação das músicas. A Galáctico Produções, que representa em São Paulo 40 grupos de funk do Rio, já distribuiu de graça mais de 1 milhão de CDs promocionais desde que o funk carioca começou a fazer sucesso. Dessa maneira, ganhando dinheiro com shows, dando CDs para driblar a pirataria e abusando do potencial da internet, o funk carioca tomou a cidade de assalto. É em São Paulo que as bandas do Rio aproveitam para ganhar dinheiro. "O Rio é o berço do funk. Mas, por causa disso, os artistas cariocas que tocam em comunidades de lá cobram cachês que não passam dos R$ 2 mil. São Paulo é o lugar onde eles enchem o bolso", explica o empresário Marcelo Rocha, responsável pela Galáctico Produções. O cachê de uma banda de sucesso na cidade gira em torno de R$ 15 mil. O MC Menor do Chapa, por exemplo, nos últimos dois anos arrecadou mais de R$ 1 milhão nas turnês por São Paulo. "Ele morava em uma favela no Rio. Foi aqui que conseguiu juntar dinheiro para comprar uma casa de R$ 500 mil para a família", diz Rocha, que o representa em São Paulo. MARATONISTAS Os donos de casas noturnas, da mesma maneira, não têm do que reclamar. Comparado a outros gêneros musicais, como samba e axé, os grupos de funk saem muito mais em conta. Grupos como Exaltasamba ou o cantor Belo, segundo proprietários das casas noturnas, cobram cachês que variam de R$ 40 mil a R$ 100 mil. Quando os grupos são de fora, como é o caso das bandas de axé ou dos sambistas cariocas, ainda há o custo da passagem, hospedagem e refeição para equipes de 15 a 20 pessoas, além do transporte dos equipamentos. Já os tops do funk recebem no máximo R$ 15 mil por noite, com menos equipamento e pessoal, trazendo o mesmo público que os sambistas. "Sem falar que o público do funk parece mais eufórico e bebe mais. O que acaba dando mais dinheiro para o bar da casa. Por isso o funk vem mantendo seu sucesso desde 2005", explica Durval de Oliveira, proprietário da casa noturna Cabral. Se os cachês são relativamente mais baixos que os dos demais grupos, os funkeiros conseguem rodar em diversas casas noturnas em uma mesma noite, enfrentando verdadeiras maratonas. Situação impossível para os grandes grupos de samba e de axé. No ano passado, MC Créu chegou a fazer 32 shows entre quinta e domingo em São Paulo. O mesmo número de shows que a Mulher Melancia tentava dar conta na Semana da Consciência Negra. O que pode render, em apenas uma semana, até R$ 400 mil. Na madrugada de sábado, as Popozudas, além de tocar no Tatuapé, foram a Mauá e Osasco, na Grande São Paulo, e Santana, zona norte. Os shows aconteceram da meia-noite às 6 horas. As bailarinas mostraram raça no palco, cientes de que é necessário aproveitar o momento. No funk, a rotatividade dos artistas é grande. Tati Quebra-Barraco e a dupla Serginho e Lacraia são alguns dos que já desapareceram. Bem pertinho da platéia enlouquecida, não se deixaram intimidar nem mesmo pelos marmanjões que as beliscavam. Elas continuavam em cima do palco, rebolando, de costas para a platéia.

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